A busca pela qualidade na indústria de alimentos vem apresentando um crescimento constante nas últimas décadas, o que é fruto principalmente das mudanças nas preferências dos consumidores (1) e agora, de acordo com a pesquisa Brasil Foods Trends-BFT2020, elaborada pela FIESP e pelo ITAL - Instituto de Tecnologia de Alimentos publicada em 2010, cinco fatores principais passaram também a determinar o consumo de alimentos no mundo. São eles: população, urbanização, demografia, renda e educação/informação.
Esses cinco determinantes fundamentam as cinco categorias de tendências em alimentação identificadas pelo BTF2020, que são: sensorialidade e prazer, saudabilidade e bem estar, conveniência e praticidade, confiabilidade e qualidade e sustentabilidade e ética. Essas categorias foram definidas com base nos principais estudos internacionais sobre tendências de alimentação e se aplicam à realidade brasileira (2).
Em relação ao café, este comportamento não é diferente. O constante crescimento no segmento de cafés de melhor qualidade demonstra que os consumidores estão cada vez mais exigentes quanto à qualidade do café que estão consumindo. A valorização da qualidade do café é uma antiga preocupação, que levou os setores ligados à atividade cafeeira no Brasil a elaborarem NORMAS de classificação em 1917. Nessas normas, observa-se uma ênfase a certos atributos que estão associados à aceitação ou rejeição do café para o consumo. No mesmo ano, foi criada a prova de xícara no Brasil, sendo adotada pela bolsa oficial de Café e Mercadorias de Santos, que havia sido instalada em 1914.
Atualmente, a tipificação e a caracterização sensorial dos cafés comercializados em bolsa de mercadorias, denominados de cafés commodities, são regidas pela INSTRUÇÃO NORMATIVA n° 8, de 11 de janeiro de 2003 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA, segundo regulamento denominado: “Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade para Classificação do Café Beneficiado Grão Cru” (1). Em 24/05/2010, o MAPA editou uma nova INSTRUÇÃO NORMATIVA, a IN 16, que estabeleceu o “Regulamento Técnico para café torrado em grão e café torrado e moído”, determinando os limites de 1% de impurezas, como cascas, paus, marinheiros) e de 5% de umidade, prevendo também a analise sensorial do café para avaliar atributos como fragrância, aroma, sabor e acidez, sendo aprovados apenas os cafés que obtiverem notas igual ou superior a 4 pontos, em uma escala de 0 a 10 pontos. Este regulamento se encontra em vigor desde 23/02/2011. No entanto, atendendo a um pleito da ABIC – Associação Brasileira da Industria de Café, a exigência da análise sensorial foi adiada por mais dois anos, sendo as razões apresentadas para isto as dificuldades para a formação, treinamento e calibração dos provadores em todo o país, que demandam tempo e muito exercício para se obter bons resultados, de modo a não incorrer em análises com forte subjetividade (2).
O ministro à época, Sr. Wagner Rossi, sensível ao problema e demonstrando grande responsabilidade e atenção para com o setor industrial do café (que fique bem claro, somente para com o setor industrial), sabedor das implicações que a nova norma imporia ao mercado, decidiu atender à demanda da ABIC, sendo que neste período de dois anos, o governo se incumbiria de promover a formação de profissionais classificadores especializados na avaliação de café torrado em grão e torrado e moído. À época, o Ministério afirmou que já havia treinado 16 profissionais, prometendo nos dois próximos anos capacitar mais 340 técnicos e 500 industriais (4). (O que ficou só na promessa).
Na opinião do presidente da ABIC, à época Sr. Almir José da Silva Filho, esta nova regulamentação veio para reforçar as iniciativas da entidade para combater a fraude e a adulteração de cafés (o que demonstra que a indústria tem pleno conhecimento desta prática), melhorando a qualidade do café e auxiliando as indústrias de todo o país que atuam corretamente e merecem que seus produtos sejam reconhecidos pelo varejo, pelos consumidores e tenham o justo valor e ainda, que “os industriais precisariam redobrar seus cuidados na compra de matérias-primas, exigindo de seus fornecedores a mesma qualidade que lhes será exigida no ponto de venda.
Ainda de acordo com o presidente da ABIC no período, a associação continuaria mantendo contato, reuniões e discussões sobre o tema com o DCAF-Departamento do Café e com o DIPOV-Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Vegetal (portanto, tanto o DCAF como o DIPOV tem conhecimento desta situação), sendo que o objetivo da ABIC seria de colaborar para solucionar e flexibilizar itens importantes, tais como: produção de amostras de referência, formação e habilitação de provadores, inclusive aqueles que já atuam no mercado, bem como, um plano de parceria MAPA-ABIC, para tornar os resultados do Selo de Pureza e do PQC-Programa de Qualidade do Café, ambos da ABIC, ainda mais significativos e importantes para as empresas e para o mercado, em benefício dos consumidores (tudo sempre em benefício dos consumidores). * A atenção que o ministro Wagner Rossi e seus colaboradoresManoel Bertone, secretário de Produção e Agroenergia, Maçao Tadano, diretor do DIPOV, Roberio Silva, diretor do DECAF e Fabio Fernandes, coordenador geral de qualidade vegetal do DIPOV, trataram o assunto com a ABIC, mereceu todo nosso reconhecimento”, comentou o presidente Almir Filho (4). (será que estes senhores ao acatarem tal pleito, devam merecer também o reconhecimento dos produtores e consumidores?).
De acordo com o atual presidente da ABIC, Sr. Américo Sato, em entrevista ao Jornal do Café em 2011, o mesmo afirmou ter aceitado assumir novamente a presidência da ABIC pelo fato de acreditar ser este momento atual ideal para mudar definitivamente a mentalidade dos industriais em relação ao café, buscando a diferenciação e escapando da cultura do ‘Quanto mais barato, melhor'- uma cultura maléfica, resquício da fase crítica da economia nacional. “O mercado é dinâmico e as preferências dos consumidores estão mudando para produtos que ofereçam maior comodidade no uso ou mais satisfação, a exemplo dos cafés ESPECIAIS. Continuando, disse: “novamente sinto que a indústria do torrado e moído atravessa uma fase aguda de definição, em função da macrotendência da economia nacional”. Por tudo isso, disse que acreditava ser tarefa do novo Conselho Gestor, inicialmente reerguer o moral dos companheiros da ABIC, mobilizando e incentivando a participação de todos para levantar essa nova bandeira. Desta vez vamos eleger uma palavra de ordem, que será discutida e tratada com o Conselho Gestor, para representar o anseio de todos, inclusive dos demais segmentos da economia cafeeira. A meu ver, este anseio é a VALORIZAÇÃO REAL DO CAFÉ e o desenvolvimento da atividade cafeeira, particularmente da indústria.
A mensagem que queremos passar aos nossos consumidores é que TODOS TÊM O DIREITO DE TOMAR UM CAFÉ BOM E PURO. Também está na ideia das pessoas que me elegeram o interesse da reorganização da ABIC para superar a crise momentânea do setor e adequar-se à nova realidade do mercado, estabelecendo um novo rumo ao futuro (3).
Ao final dos anos 90 (extinção do IBC) na SAA - Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, em âmbito da CODEAGRO-Coordenadoria de Desenvolvimento dos Agronegócios, foram reestruturadas as chamadas CÂMARAS SETORIAIS, dentre as quais a do CAFÉ-1997 (obs: há mais de 14 anos que a câmara vem sendo presidida por uma única pessoa, representante da ABIC). No início do ano de 2000, as preocupações se orientaram no adiantamento de um passo no tema qualidade por meio de certificação que atestasse características como composição da liga, aroma, atributos de bebida, torra e moagem. A presença de representantes da indústria e do varejo possibilitou a construção de um diagnóstico apontando para a necessidade de se agregar mais valor ao produto, rentabilizando a metragem de gôndolas ocupadas e ao mesmo tempo, apoiando a decisão empresarial dos torrefadores em segmentar sua linha.
Tendo em vista tais aspectos para amparar as iniciativas privadas orientadas pela qualidade, em 1999 o Governo Paulista criou legislação específica sobre o assunto com o : “SISTEMA DE QUALIDADE DE PRODUTOS AGRICOLAS, PECUARIOS E AGROINDUSTRIAIS DE SÃO PAULO “ – lei 10.481 de 29/12/1999, atendendo às transformações do mercado. O principal objetivo desta iniciativa pública foi o de certificar produtos de qualidade superior, diferenciado no controle e supervisão do processo produtivo, com foco no atendimento às expectativas dos consumidores, aumento da competitividade do agronegócio paulista, crescimento da renda agrícola e da lucratividade da agroindústria processadora.
A primeira Câmara Setorial a se organizar visando a criação de protocolo estabelecendo os critérios para definição da qualidade foi a de CAFÉ, que já tinha decisões adiantadas (selo de pureza ABIC-1989) sobre normas para certificação. Apoiando-se em trabalho técnico desenvolvido pelo ITAL-Instituto de Tecnologia de Alimentos (resolução SAA7-11/03/2004) foram criadas três categorias de café: de 0 a 4.49 não recomendado para consumo, de 4,5 a 6,5 Tradicionais e de 7,61 a 10 GOURMETS, sendo que, apenas aos grãos superiores e gourmets seria permitido a rotulagem com o Selo Produto de São Paulo.
A iniciativa foi bastante inovadora, pois criou de fato uma especificação técnica para a qualidade sensorial de uma bebida, no caso o café. Tal avanço paulista foi repaginado pela ABIC que, ainda em 2004 criou seu Programa de Qualidade do Café-PQC (Rosa dos ventos: Ouro/Gourmet-Prata/Superior-Bronze/Tradicional). O aumento do consumo da bebida associado ao êxito em agregar valor ao produto, por meio do incremento da QUALIDADE, ganhou contornos cada vez mais amplos. Tal constatação induziu o MAPA a elaborar norma técnica para industrialização do café no Brasil.
O novo regulamento de qualidade do café no Brasil constitui-se no conteúdo da INSTRUÇÃO NORMATIVA 16 (IN16), de 24-05-2010, em vigor desde 18/02/2011, que disciplina, entre as diversas regras para o processamento do café, os limites de até 1% para impurezas e percentual de até 5% de umidade, associando-os com definições de características sensoriais da bebida. Mediante este estatuto legal, a fiscalização sanitária pode exercer um papel disciplinador do mercado, dispondo de mandato que permite o recolhimento de produtos fora dos padrões estabelecidos.
Em concomitância à mobilização em torno da melhoria da qualidade do café oferecido ao consumidor brasileiro, o Estado de São Paulo, atendendo à lei federal 9972 de 2000 (que estabelece que todos os produtos vegetais destinados diretamente à alimentação humana devem ser classificados segundo o padrão oficial do Ministério da Agricultura), devido às normas para licitação, instituiu procedimento eletrônico visando o incremento da transparência para licitações públicas, a BEC-Bolsa Eletronica de Compras, uma iniciativa pública pautada pela premissa de assegurar a correta e melhor aplicação dos recursos, dotando a administração de insumos rápidos e eficazes para gerenciar e controlar despesas.
Já em 2004, constava dos itens da BEC os cafés especiais (ou melhor: superiores e gourmets). Infelizmente, por ação de algumas empresas inidôneas, tal sistema encontra-se desgastado em sua credibilidade. Assim, o esforço em incrementar a qualidade do café adquirido pelas compras do Governo do Estado, ainda carece de alguns aprimoramentos. (5)
O 18° ENCAFÉ-Encontro Nacional da Industria de Café, realizado de 12 a 16 de novembro de 2010 no Centro de Convenções de Natal-RN, foi um importante fórum de discussão sobres a IN16. Além de associados participaram do encontro, outros profissionais do setor e vários técnicos do governo também estiveram presentes, surgindo daí uma grande oportunidade para que os industriais esclarecessem suas dúvidas e apresentassem um elenco de sugestões – principalmente sobre a questão da avaliação sensorial e classificação prévia por lotes.
Neste encontro, o presidente da ABIC à época, Sr. Almir José da Silva Filho, defendeu a IN16 como uma ferramenta de combate aos cafés de baixa qualidade. Segundo disse, a deterioração acontece porque algumas práticas deixaram de ser realizadas na lavoura, afirmando que a iniciativa da ABIC tem o objetivo de melhorar a qualidade do grão e em contrapartida, o valor do produto, seja grão cru, seja o café industrializado. Para ele a IN16 tira o café da revelia e dá parâmetros. “Ela protege o pequeno industrial dos ataques desleais, desumanos e inconsequentes das empresas que adulteram produtos” (8). Apesar da fraude e adulteração estarem controladas pela ação do Selo de Pureza e das denúncias da ABIC aos Ministérios Públicos de todo o país, o fato é que a produção desses cafés adulterados tira mercado das pequenas empresas que trabalham corretamente e tem sido uma das razões pelas quais o café torrado e moído não tem se valorizado no mercado.
Importante também foi o pronunciamento do gerente comercial da COOXUPÉ, maior cooperativa do mundo em café, Mario Panhota, destacando que a existência de cafés mais baixos é inerente ao processo produtivo, SENTENCIANDO que a IN16 não extinguira estes cafés. No entanto, reconheceu que estes cafés devem sair do mercado porque realmente são impróprios para o consumo humano, afirmando ainda que estes cafés já não são mais aceitos pelo mercado formal, mas continuam sendo adquiridos pelas empresas que atuam na informalidade (se ainda se produz estes tipos de cafés é porque o mercado os aceita). Para a ABIC, a utilização de cafés com certa quantidade de grãos defeituosos não é incorreta, a própria norma do PQC estabelece que os cafés da categoria tradicional podem ser produzidos com até 20% de grãos defeituosos como os pretos, verdes e ardidos – PVA. Para a entidade, o problema ocorre com o uso excessivo de grãos defeituosos, apodrecidos, mofados e que tem sabor e aroma muito ruins. Um exemplo desta utilização foi a inclusão da bebida Rio Zona na IN16 (6).(obs: quando há qualquer condição adversa aos grãos, ou seja, ataque de insetos, infecção por microorganismos, colheita inadequada, problemas no processamento e armazenamento, podemos ter ocorrência de espécies de FUNGOS pertencentes aos gêneros Aspergillus e Penicillium e isto pode estar associado à presença de microtoxinas como aflatoxina, ocratoxina e patulina (9).
As discussões durante este encontro foram bastante acaloradas, e a inclusão na IN16 da avaliação sensorial do café gerou muita controvérsia, mas ficou claro que a indústria precisa se reestruturar, se equipando melhor e se atualizando para novos mercados (isto também deve se aplicar à produção). Para alguns, tal avaliação é subjetiva e pode variar de acordo com o gosto e as particularidades de cada classificador, entretanto,Eduardo Carvalhaes, do LAB Carvalhaes de Santos/SP, presente ao evento, esclareceu as dúvidas afirmando que a técnica da análise sensorial é reconhecida atualmente como uma ciência, com todo o embasamento científico para estabelecer referências às análises (Segundo Dr. Gerson Giomo pesquisador cientifico do IAC - Instituto Agronômico de Campinas, especialista em qualidade do café: “A QUALIDADE do café não deve ser confundida com a preferência do consumidor") (6).
Enquanto a IN16 não for colocada em prática na sua totalidade, podemos considerar que a classificação de café no Brasil se baseia apenas na IN8, o que, além de não atender as atuais exigências, continua permitindo fraudes e adulterações. Pior ainda, continua permitindo que o mercado seja manipulado e o consumidor enganado, isso sem contar a irresponsabilidade com relação à saudabilidade, permitindo que microorganismos maléficos continuem sendo disseminados. No entanto, devemos reconhecer que a ABIC vem fazendo um enorme esforço através de seus programas de qualidade, mas conforme afirma seu atual presidente, o PQC-Programa de Qualidade de Café da ABIC ainda é um programa tímido, carecendo de dinamização, divulgação e apoio do varejo. (3)
Importante ressaltar aqui que atualmente já existe uma significativa parcela do mercado voltada para os denominados CAFÉS ESPECIAIS, cafés estes avaliados de acordo com norma americana, protocolo de degustação de café da SCAA-Associação Americana de Cafés Especiais (2008). Nestes cafés não são aceitos defeitos como verde, ardidos, pretos, preto-verdes, fermentados e muito menos impurezas, portanto, nós produtores de especiais esperamos que a IN16 possa entrar logo em vigor em toda sua plenitude para que, com o passar do tempo, a mesma possa vir a ser revista de modo a ser criada uma quarta categoria, a dos ESPECIAIS, mas vamos deixar este assunto de especiais para uma próxima oportunidade.
Se o Brasil pretende colocar seu café em posição de destaque, sendo reconhecido por qualidade, seja no mercado interno como no externo, será necessário aperfeiçoar e colocar em prática normas, padrões e metodologia especifica que classificam o café quanto à qualidade e também adotar sérias medidas, medidas estas, já sugeridas pela AGENDA ESTRATÉGICA DO AGRONEGÓCIO CAFÉ de outubro de 2008, elaborada pelo grupo de trabalho nomeado pelo Ministro da Agricultura na época, Reinhold Stephanes, através da portaria 510 de 03 de julho de 2008.
Encaminhando para o final, quero recorrer-me mais uma vez à entrevista já citada, do atual presidente da ABIC, Américo Sato, onde ele afirma: “Apesar da minha idade, gosto de pensar no futuro e de forma grande porque o tempo passa rápido e o mercado evolui de forma inimaginável. Precisamos estar atentos a esta evolução, particularmente da tecnologia e comunicação. Porém, toda iniciativa precisa de certa escala, e para obter escala é preciso unir esforços, e isso é o que chamo de pensar grande. Acredito que isoladamente não vamos conseguir realizar todas as tarefas com condição de sucesso. Vamos esquecer bairrismos e sectarismos. O formato ou denominação não parece muito importante, mas precisa que de tempos em tempos, asLIDERANÇAS de cada segmento se reúnam, seja para trocar idéias ou muitas das vezes para resolver problemas comuns ou até de um projeto que possa beneficiar toda a cadeia”.(3)
Nesse sentido, sugiro a leitura de toda a Agenda Estratégica do Agronegócio Café, e mais especificamente a página 82, sob o titulo: “Encaminhamento de Solução sobre Governança”: Por tudo que se observados diversos setores da economia cafeeira, há forte indicações que o modelo atual NÃO ESTÁ FUNCIONANDO a contento, tanto por ações estratégicas estarem relegadas a um plano secundário, quanto pelo fato doCDPC - Conselho de Desenvolvimento da Politica Cafeeira do Brasil ter se tornado um local de forte conflito de opiniões, onde o antagonismo tem se exacerbado sistematicamente. Assim, ousamos apresentar um encaminhamento de alteração de modelo, através de proposta de Governança do Setor Cafeeiro partindo de duas vertentes principais: 1- O esgotamento da capacidade regulatória estatal e 2 - Da necessidade de uma coordenação mínima das atividades do setor cafeeiro, com a colaboração entre os setores públicos e privados. (7)
De qualquer forma, esse tema deveria ser amplamente discutido com a profundidade necessária pelos próprios setores, sendo posteriormente levados ao CONGRESSO NACIONAL para a necessária discussão e decisão política. Nas análises desses fóruns, entendemos que deveriam ser priorizadas as ações estratégicas comerciais, que pudessem dar continuidade ao crescimento de nossa participação no mercado internacional e ao crescimento do nosso mercado interno, tendo sempre como principal parâmetro o desenvolvimento econômico e social das regiões produtoras, que devem se dar com a necessária sustentabilidade, garantidora da estabilidade e da paz social, e buscando contemplar a melhoria da qualidade da produção no atendimento de nossos mercados, que teriam sua abordagem mais centrada na exportação de produtos com maior valor agregado, tanto no que se refere a produtos industrializados quanto no que se refere a cafés verdes de alta qualidade, considerados CAFÉS ESPECIAIS, naturais de regiões especificas com certificação e origem com adequada rastreabilidade. (7)
Aproveito também o momento, para relembrar que São Paulo continua sendo o segundo maior produtor de arábica e o terceiro em café no Brasil, com a cafeicultura presente em 393 dos seus municípios, tendo também o maior porto exportador de café e o maior mercado industrial e consumidor de café, e o mais importante, continua se destacando por também ser produtor de excelentes cafés.
No entanto, infelizmente o Estado vem sistematicamente abandonando sua cafeicultura, relegando a um segundo plano seus órgãos de pesquisa e extensão ligados a SAA-Secretaria de Agricultura e Abastecimento, além disso, vem sustentando uma politica pública rural, centrada na organização e atuação de Conselhos Rurais Municipais, Conselhos Rurais Estaduais e Câmaras Setoriais, totalmente ultrapassada, arcaica e ineficiente.
Com relação à representatividade dos produtores, infelizmente ainda não nos demos conta de que nosso sistema representativo, além de estar fundamentado no fisiologismo, age de maneira tímida e burocrática, muitas das vezes se abstendo das reais necessidades dos produtores, o que nos determina à necessidade de novos formatos de representação que levem em consideração o desenvolvimento de uma nova visão associativista e um fortalecimento da agricultura de produção familiar.
Por último, com certeza, podemos afirmar que, do jeito que a coisa está, sem dúvida alguma nossas chances de virmos a nos estabelecermos como produtores e fornecedores de cafés de qualidade, especialmente os atualmente denominados de ESPECIAIS, são muito pequenas, ou melhor, nulas. Se isto for verdade, o Brasileiro deverá continuar consumindo um café de baixa qualidade e o pior, cada vez mais contaminado.
FONTES DE PESQUISA:
1-Informe Agropecuario EPAMIG n0261 de março/abril de 2011 – paginas 114 a 126. Artigo: “Critérios utilizados na avaliação da qualidade do café”. Autor: Dr. Marcelo Malta.
2-Revista JORNAL DO CAFÉ n0182 de 2012 – pagina 46. Artigo: “Introdução ao mercado de Café em dose única”. Autor: Pedro Henrique Abreu Santos, Eduardo Cesar Silva e Dr. Luis Gonzaga de Castro Junior (Bureua de Inteligencia Competitiva do Café e Centro de Inteligencia em Mercados/UFLA).
3-Revista JORNAL DO CAFÉ n0177 de 2011 – pagina 12. Artigo: “Entrevista com Américo Sato, atual presidente da ABIC”.
4-Revista JORNAL DO CAFÉ n0175 de 2011 – pagina 06. Artigo: “Pureza agora é lei”.
5-“Cafés especiais na bolsa eletrônica de compras paulista, uma politica pública participativa”. Autores: Nelson Pedro Staudt, Celso Luis Vegro, Rosana de Oliveira Pithan e Siva e Adão Marin.
6-Revista JORNAL DO CAFÉ n0175 de 2011 – paginas de 18 a 24. Artigo: “ENCAFÉ, palco das discussões sobre a IN16”.
7-Agenda estratégica do Agronegócio café. Outubro de 2008 – pagina 82.
8- Veja reportagem Jornal Folha de São Paulo de 31/10/2012.
9-Artigo apresentado por Dr. Paulo Rebelles Reis, Eng. Agr. Pesquisador EPAMIG/Bolsista CNPq na revista Informe Agropecuario da Epamig n0261 edição março/abril 2001 – pagina 104).
OBS: Letras em itálico entre parênteses são comentários do autor.
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Esses cinco determinantes fundamentam as cinco categorias de tendências em alimentação identificadas pelo BTF2020, que são: sensorialidade e prazer, saudabilidade e bem estar, conveniência e praticidade, confiabilidade e qualidade e sustentabilidade e ética. Essas categorias foram definidas com base nos principais estudos internacionais sobre tendências de alimentação e se aplicam à realidade brasileira (2).
Em relação ao café, este comportamento não é diferente. O constante crescimento no segmento de cafés de melhor qualidade demonstra que os consumidores estão cada vez mais exigentes quanto à qualidade do café que estão consumindo. A valorização da qualidade do café é uma antiga preocupação, que levou os setores ligados à atividade cafeeira no Brasil a elaborarem NORMAS de classificação em 1917. Nessas normas, observa-se uma ênfase a certos atributos que estão associados à aceitação ou rejeição do café para o consumo. No mesmo ano, foi criada a prova de xícara no Brasil, sendo adotada pela bolsa oficial de Café e Mercadorias de Santos, que havia sido instalada em 1914.
Atualmente, a tipificação e a caracterização sensorial dos cafés comercializados em bolsa de mercadorias, denominados de cafés commodities, são regidas pela INSTRUÇÃO NORMATIVA n° 8, de 11 de janeiro de 2003 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA, segundo regulamento denominado: “Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade para Classificação do Café Beneficiado Grão Cru” (1). Em 24/05/2010, o MAPA editou uma nova INSTRUÇÃO NORMATIVA, a IN 16, que estabeleceu o “Regulamento Técnico para café torrado em grão e café torrado e moído”, determinando os limites de 1% de impurezas, como cascas, paus, marinheiros) e de 5% de umidade, prevendo também a analise sensorial do café para avaliar atributos como fragrância, aroma, sabor e acidez, sendo aprovados apenas os cafés que obtiverem notas igual ou superior a 4 pontos, em uma escala de 0 a 10 pontos. Este regulamento se encontra em vigor desde 23/02/2011. No entanto, atendendo a um pleito da ABIC – Associação Brasileira da Industria de Café, a exigência da análise sensorial foi adiada por mais dois anos, sendo as razões apresentadas para isto as dificuldades para a formação, treinamento e calibração dos provadores em todo o país, que demandam tempo e muito exercício para se obter bons resultados, de modo a não incorrer em análises com forte subjetividade (2).
O ministro à época, Sr. Wagner Rossi, sensível ao problema e demonstrando grande responsabilidade e atenção para com o setor industrial do café (que fique bem claro, somente para com o setor industrial), sabedor das implicações que a nova norma imporia ao mercado, decidiu atender à demanda da ABIC, sendo que neste período de dois anos, o governo se incumbiria de promover a formação de profissionais classificadores especializados na avaliação de café torrado em grão e torrado e moído. À época, o Ministério afirmou que já havia treinado 16 profissionais, prometendo nos dois próximos anos capacitar mais 340 técnicos e 500 industriais (4). (O que ficou só na promessa).
Na opinião do presidente da ABIC, à época Sr. Almir José da Silva Filho, esta nova regulamentação veio para reforçar as iniciativas da entidade para combater a fraude e a adulteração de cafés (o que demonstra que a indústria tem pleno conhecimento desta prática), melhorando a qualidade do café e auxiliando as indústrias de todo o país que atuam corretamente e merecem que seus produtos sejam reconhecidos pelo varejo, pelos consumidores e tenham o justo valor e ainda, que “os industriais precisariam redobrar seus cuidados na compra de matérias-primas, exigindo de seus fornecedores a mesma qualidade que lhes será exigida no ponto de venda.
Ainda de acordo com o presidente da ABIC no período, a associação continuaria mantendo contato, reuniões e discussões sobre o tema com o DCAF-Departamento do Café e com o DIPOV-Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Vegetal (portanto, tanto o DCAF como o DIPOV tem conhecimento desta situação), sendo que o objetivo da ABIC seria de colaborar para solucionar e flexibilizar itens importantes, tais como: produção de amostras de referência, formação e habilitação de provadores, inclusive aqueles que já atuam no mercado, bem como, um plano de parceria MAPA-ABIC, para tornar os resultados do Selo de Pureza e do PQC-Programa de Qualidade do Café, ambos da ABIC, ainda mais significativos e importantes para as empresas e para o mercado, em benefício dos consumidores (tudo sempre em benefício dos consumidores). * A atenção que o ministro Wagner Rossi e seus colaboradoresManoel Bertone, secretário de Produção e Agroenergia, Maçao Tadano, diretor do DIPOV, Roberio Silva, diretor do DECAF e Fabio Fernandes, coordenador geral de qualidade vegetal do DIPOV, trataram o assunto com a ABIC, mereceu todo nosso reconhecimento”, comentou o presidente Almir Filho (4). (será que estes senhores ao acatarem tal pleito, devam merecer também o reconhecimento dos produtores e consumidores?).
De acordo com o atual presidente da ABIC, Sr. Américo Sato, em entrevista ao Jornal do Café em 2011, o mesmo afirmou ter aceitado assumir novamente a presidência da ABIC pelo fato de acreditar ser este momento atual ideal para mudar definitivamente a mentalidade dos industriais em relação ao café, buscando a diferenciação e escapando da cultura do ‘Quanto mais barato, melhor'- uma cultura maléfica, resquício da fase crítica da economia nacional. “O mercado é dinâmico e as preferências dos consumidores estão mudando para produtos que ofereçam maior comodidade no uso ou mais satisfação, a exemplo dos cafés ESPECIAIS. Continuando, disse: “novamente sinto que a indústria do torrado e moído atravessa uma fase aguda de definição, em função da macrotendência da economia nacional”. Por tudo isso, disse que acreditava ser tarefa do novo Conselho Gestor, inicialmente reerguer o moral dos companheiros da ABIC, mobilizando e incentivando a participação de todos para levantar essa nova bandeira. Desta vez vamos eleger uma palavra de ordem, que será discutida e tratada com o Conselho Gestor, para representar o anseio de todos, inclusive dos demais segmentos da economia cafeeira. A meu ver, este anseio é a VALORIZAÇÃO REAL DO CAFÉ e o desenvolvimento da atividade cafeeira, particularmente da indústria.
A mensagem que queremos passar aos nossos consumidores é que TODOS TÊM O DIREITO DE TOMAR UM CAFÉ BOM E PURO. Também está na ideia das pessoas que me elegeram o interesse da reorganização da ABIC para superar a crise momentânea do setor e adequar-se à nova realidade do mercado, estabelecendo um novo rumo ao futuro (3).
Ao final dos anos 90 (extinção do IBC) na SAA - Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, em âmbito da CODEAGRO-Coordenadoria de Desenvolvimento dos Agronegócios, foram reestruturadas as chamadas CÂMARAS SETORIAIS, dentre as quais a do CAFÉ-1997 (obs: há mais de 14 anos que a câmara vem sendo presidida por uma única pessoa, representante da ABIC). No início do ano de 2000, as preocupações se orientaram no adiantamento de um passo no tema qualidade por meio de certificação que atestasse características como composição da liga, aroma, atributos de bebida, torra e moagem. A presença de representantes da indústria e do varejo possibilitou a construção de um diagnóstico apontando para a necessidade de se agregar mais valor ao produto, rentabilizando a metragem de gôndolas ocupadas e ao mesmo tempo, apoiando a decisão empresarial dos torrefadores em segmentar sua linha.
Tendo em vista tais aspectos para amparar as iniciativas privadas orientadas pela qualidade, em 1999 o Governo Paulista criou legislação específica sobre o assunto com o : “SISTEMA DE QUALIDADE DE PRODUTOS AGRICOLAS, PECUARIOS E AGROINDUSTRIAIS DE SÃO PAULO “ – lei 10.481 de 29/12/1999, atendendo às transformações do mercado. O principal objetivo desta iniciativa pública foi o de certificar produtos de qualidade superior, diferenciado no controle e supervisão do processo produtivo, com foco no atendimento às expectativas dos consumidores, aumento da competitividade do agronegócio paulista, crescimento da renda agrícola e da lucratividade da agroindústria processadora.
A primeira Câmara Setorial a se organizar visando a criação de protocolo estabelecendo os critérios para definição da qualidade foi a de CAFÉ, que já tinha decisões adiantadas (selo de pureza ABIC-1989) sobre normas para certificação. Apoiando-se em trabalho técnico desenvolvido pelo ITAL-Instituto de Tecnologia de Alimentos (resolução SAA7-11/03/2004) foram criadas três categorias de café: de 0 a 4.49 não recomendado para consumo, de 4,5 a 6,5 Tradicionais e de 7,61 a 10 GOURMETS, sendo que, apenas aos grãos superiores e gourmets seria permitido a rotulagem com o Selo Produto de São Paulo.
A iniciativa foi bastante inovadora, pois criou de fato uma especificação técnica para a qualidade sensorial de uma bebida, no caso o café. Tal avanço paulista foi repaginado pela ABIC que, ainda em 2004 criou seu Programa de Qualidade do Café-PQC (Rosa dos ventos: Ouro/Gourmet-Prata/Superior-Bronze/Tradicional). O aumento do consumo da bebida associado ao êxito em agregar valor ao produto, por meio do incremento da QUALIDADE, ganhou contornos cada vez mais amplos. Tal constatação induziu o MAPA a elaborar norma técnica para industrialização do café no Brasil.
O novo regulamento de qualidade do café no Brasil constitui-se no conteúdo da INSTRUÇÃO NORMATIVA 16 (IN16), de 24-05-2010, em vigor desde 18/02/2011, que disciplina, entre as diversas regras para o processamento do café, os limites de até 1% para impurezas e percentual de até 5% de umidade, associando-os com definições de características sensoriais da bebida. Mediante este estatuto legal, a fiscalização sanitária pode exercer um papel disciplinador do mercado, dispondo de mandato que permite o recolhimento de produtos fora dos padrões estabelecidos.
Em concomitância à mobilização em torno da melhoria da qualidade do café oferecido ao consumidor brasileiro, o Estado de São Paulo, atendendo à lei federal 9972 de 2000 (que estabelece que todos os produtos vegetais destinados diretamente à alimentação humana devem ser classificados segundo o padrão oficial do Ministério da Agricultura), devido às normas para licitação, instituiu procedimento eletrônico visando o incremento da transparência para licitações públicas, a BEC-Bolsa Eletronica de Compras, uma iniciativa pública pautada pela premissa de assegurar a correta e melhor aplicação dos recursos, dotando a administração de insumos rápidos e eficazes para gerenciar e controlar despesas.
Já em 2004, constava dos itens da BEC os cafés especiais (ou melhor: superiores e gourmets). Infelizmente, por ação de algumas empresas inidôneas, tal sistema encontra-se desgastado em sua credibilidade. Assim, o esforço em incrementar a qualidade do café adquirido pelas compras do Governo do Estado, ainda carece de alguns aprimoramentos. (5)
O 18° ENCAFÉ-Encontro Nacional da Industria de Café, realizado de 12 a 16 de novembro de 2010 no Centro de Convenções de Natal-RN, foi um importante fórum de discussão sobres a IN16. Além de associados participaram do encontro, outros profissionais do setor e vários técnicos do governo também estiveram presentes, surgindo daí uma grande oportunidade para que os industriais esclarecessem suas dúvidas e apresentassem um elenco de sugestões – principalmente sobre a questão da avaliação sensorial e classificação prévia por lotes.
Neste encontro, o presidente da ABIC à época, Sr. Almir José da Silva Filho, defendeu a IN16 como uma ferramenta de combate aos cafés de baixa qualidade. Segundo disse, a deterioração acontece porque algumas práticas deixaram de ser realizadas na lavoura, afirmando que a iniciativa da ABIC tem o objetivo de melhorar a qualidade do grão e em contrapartida, o valor do produto, seja grão cru, seja o café industrializado. Para ele a IN16 tira o café da revelia e dá parâmetros. “Ela protege o pequeno industrial dos ataques desleais, desumanos e inconsequentes das empresas que adulteram produtos” (8). Apesar da fraude e adulteração estarem controladas pela ação do Selo de Pureza e das denúncias da ABIC aos Ministérios Públicos de todo o país, o fato é que a produção desses cafés adulterados tira mercado das pequenas empresas que trabalham corretamente e tem sido uma das razões pelas quais o café torrado e moído não tem se valorizado no mercado.
Importante também foi o pronunciamento do gerente comercial da COOXUPÉ, maior cooperativa do mundo em café, Mario Panhota, destacando que a existência de cafés mais baixos é inerente ao processo produtivo, SENTENCIANDO que a IN16 não extinguira estes cafés. No entanto, reconheceu que estes cafés devem sair do mercado porque realmente são impróprios para o consumo humano, afirmando ainda que estes cafés já não são mais aceitos pelo mercado formal, mas continuam sendo adquiridos pelas empresas que atuam na informalidade (se ainda se produz estes tipos de cafés é porque o mercado os aceita). Para a ABIC, a utilização de cafés com certa quantidade de grãos defeituosos não é incorreta, a própria norma do PQC estabelece que os cafés da categoria tradicional podem ser produzidos com até 20% de grãos defeituosos como os pretos, verdes e ardidos – PVA. Para a entidade, o problema ocorre com o uso excessivo de grãos defeituosos, apodrecidos, mofados e que tem sabor e aroma muito ruins. Um exemplo desta utilização foi a inclusão da bebida Rio Zona na IN16 (6).(obs: quando há qualquer condição adversa aos grãos, ou seja, ataque de insetos, infecção por microorganismos, colheita inadequada, problemas no processamento e armazenamento, podemos ter ocorrência de espécies de FUNGOS pertencentes aos gêneros Aspergillus e Penicillium e isto pode estar associado à presença de microtoxinas como aflatoxina, ocratoxina e patulina (9).
As discussões durante este encontro foram bastante acaloradas, e a inclusão na IN16 da avaliação sensorial do café gerou muita controvérsia, mas ficou claro que a indústria precisa se reestruturar, se equipando melhor e se atualizando para novos mercados (isto também deve se aplicar à produção). Para alguns, tal avaliação é subjetiva e pode variar de acordo com o gosto e as particularidades de cada classificador, entretanto,Eduardo Carvalhaes, do LAB Carvalhaes de Santos/SP, presente ao evento, esclareceu as dúvidas afirmando que a técnica da análise sensorial é reconhecida atualmente como uma ciência, com todo o embasamento científico para estabelecer referências às análises (Segundo Dr. Gerson Giomo pesquisador cientifico do IAC - Instituto Agronômico de Campinas, especialista em qualidade do café: “A QUALIDADE do café não deve ser confundida com a preferência do consumidor") (6).
Enquanto a IN16 não for colocada em prática na sua totalidade, podemos considerar que a classificação de café no Brasil se baseia apenas na IN8, o que, além de não atender as atuais exigências, continua permitindo fraudes e adulterações. Pior ainda, continua permitindo que o mercado seja manipulado e o consumidor enganado, isso sem contar a irresponsabilidade com relação à saudabilidade, permitindo que microorganismos maléficos continuem sendo disseminados. No entanto, devemos reconhecer que a ABIC vem fazendo um enorme esforço através de seus programas de qualidade, mas conforme afirma seu atual presidente, o PQC-Programa de Qualidade de Café da ABIC ainda é um programa tímido, carecendo de dinamização, divulgação e apoio do varejo. (3)
Importante ressaltar aqui que atualmente já existe uma significativa parcela do mercado voltada para os denominados CAFÉS ESPECIAIS, cafés estes avaliados de acordo com norma americana, protocolo de degustação de café da SCAA-Associação Americana de Cafés Especiais (2008). Nestes cafés não são aceitos defeitos como verde, ardidos, pretos, preto-verdes, fermentados e muito menos impurezas, portanto, nós produtores de especiais esperamos que a IN16 possa entrar logo em vigor em toda sua plenitude para que, com o passar do tempo, a mesma possa vir a ser revista de modo a ser criada uma quarta categoria, a dos ESPECIAIS, mas vamos deixar este assunto de especiais para uma próxima oportunidade.
Se o Brasil pretende colocar seu café em posição de destaque, sendo reconhecido por qualidade, seja no mercado interno como no externo, será necessário aperfeiçoar e colocar em prática normas, padrões e metodologia especifica que classificam o café quanto à qualidade e também adotar sérias medidas, medidas estas, já sugeridas pela AGENDA ESTRATÉGICA DO AGRONEGÓCIO CAFÉ de outubro de 2008, elaborada pelo grupo de trabalho nomeado pelo Ministro da Agricultura na época, Reinhold Stephanes, através da portaria 510 de 03 de julho de 2008.
Encaminhando para o final, quero recorrer-me mais uma vez à entrevista já citada, do atual presidente da ABIC, Américo Sato, onde ele afirma: “Apesar da minha idade, gosto de pensar no futuro e de forma grande porque o tempo passa rápido e o mercado evolui de forma inimaginável. Precisamos estar atentos a esta evolução, particularmente da tecnologia e comunicação. Porém, toda iniciativa precisa de certa escala, e para obter escala é preciso unir esforços, e isso é o que chamo de pensar grande. Acredito que isoladamente não vamos conseguir realizar todas as tarefas com condição de sucesso. Vamos esquecer bairrismos e sectarismos. O formato ou denominação não parece muito importante, mas precisa que de tempos em tempos, asLIDERANÇAS de cada segmento se reúnam, seja para trocar idéias ou muitas das vezes para resolver problemas comuns ou até de um projeto que possa beneficiar toda a cadeia”.(3)
Nesse sentido, sugiro a leitura de toda a Agenda Estratégica do Agronegócio Café, e mais especificamente a página 82, sob o titulo: “Encaminhamento de Solução sobre Governança”: Por tudo que se observados diversos setores da economia cafeeira, há forte indicações que o modelo atual NÃO ESTÁ FUNCIONANDO a contento, tanto por ações estratégicas estarem relegadas a um plano secundário, quanto pelo fato doCDPC - Conselho de Desenvolvimento da Politica Cafeeira do Brasil ter se tornado um local de forte conflito de opiniões, onde o antagonismo tem se exacerbado sistematicamente. Assim, ousamos apresentar um encaminhamento de alteração de modelo, através de proposta de Governança do Setor Cafeeiro partindo de duas vertentes principais: 1- O esgotamento da capacidade regulatória estatal e 2 - Da necessidade de uma coordenação mínima das atividades do setor cafeeiro, com a colaboração entre os setores públicos e privados. (7)
De qualquer forma, esse tema deveria ser amplamente discutido com a profundidade necessária pelos próprios setores, sendo posteriormente levados ao CONGRESSO NACIONAL para a necessária discussão e decisão política. Nas análises desses fóruns, entendemos que deveriam ser priorizadas as ações estratégicas comerciais, que pudessem dar continuidade ao crescimento de nossa participação no mercado internacional e ao crescimento do nosso mercado interno, tendo sempre como principal parâmetro o desenvolvimento econômico e social das regiões produtoras, que devem se dar com a necessária sustentabilidade, garantidora da estabilidade e da paz social, e buscando contemplar a melhoria da qualidade da produção no atendimento de nossos mercados, que teriam sua abordagem mais centrada na exportação de produtos com maior valor agregado, tanto no que se refere a produtos industrializados quanto no que se refere a cafés verdes de alta qualidade, considerados CAFÉS ESPECIAIS, naturais de regiões especificas com certificação e origem com adequada rastreabilidade. (7)
Aproveito também o momento, para relembrar que São Paulo continua sendo o segundo maior produtor de arábica e o terceiro em café no Brasil, com a cafeicultura presente em 393 dos seus municípios, tendo também o maior porto exportador de café e o maior mercado industrial e consumidor de café, e o mais importante, continua se destacando por também ser produtor de excelentes cafés.
No entanto, infelizmente o Estado vem sistematicamente abandonando sua cafeicultura, relegando a um segundo plano seus órgãos de pesquisa e extensão ligados a SAA-Secretaria de Agricultura e Abastecimento, além disso, vem sustentando uma politica pública rural, centrada na organização e atuação de Conselhos Rurais Municipais, Conselhos Rurais Estaduais e Câmaras Setoriais, totalmente ultrapassada, arcaica e ineficiente.
Com relação à representatividade dos produtores, infelizmente ainda não nos demos conta de que nosso sistema representativo, além de estar fundamentado no fisiologismo, age de maneira tímida e burocrática, muitas das vezes se abstendo das reais necessidades dos produtores, o que nos determina à necessidade de novos formatos de representação que levem em consideração o desenvolvimento de uma nova visão associativista e um fortalecimento da agricultura de produção familiar.
Por último, com certeza, podemos afirmar que, do jeito que a coisa está, sem dúvida alguma nossas chances de virmos a nos estabelecermos como produtores e fornecedores de cafés de qualidade, especialmente os atualmente denominados de ESPECIAIS, são muito pequenas, ou melhor, nulas. Se isto for verdade, o Brasileiro deverá continuar consumindo um café de baixa qualidade e o pior, cada vez mais contaminado.
FONTES DE PESQUISA:
1-Informe Agropecuario EPAMIG n0261 de março/abril de 2011 – paginas 114 a 126. Artigo: “Critérios utilizados na avaliação da qualidade do café”. Autor: Dr. Marcelo Malta.
2-Revista JORNAL DO CAFÉ n0182 de 2012 – pagina 46. Artigo: “Introdução ao mercado de Café em dose única”. Autor: Pedro Henrique Abreu Santos, Eduardo Cesar Silva e Dr. Luis Gonzaga de Castro Junior (Bureua de Inteligencia Competitiva do Café e Centro de Inteligencia em Mercados/UFLA).
3-Revista JORNAL DO CAFÉ n0177 de 2011 – pagina 12. Artigo: “Entrevista com Américo Sato, atual presidente da ABIC”.
4-Revista JORNAL DO CAFÉ n0175 de 2011 – pagina 06. Artigo: “Pureza agora é lei”.
5-“Cafés especiais na bolsa eletrônica de compras paulista, uma politica pública participativa”. Autores: Nelson Pedro Staudt, Celso Luis Vegro, Rosana de Oliveira Pithan e Siva e Adão Marin.
6-Revista JORNAL DO CAFÉ n0175 de 2011 – paginas de 18 a 24. Artigo: “ENCAFÉ, palco das discussões sobre a IN16”.
7-Agenda estratégica do Agronegócio café. Outubro de 2008 – pagina 82.
8- Veja reportagem Jornal Folha de São Paulo de 31/10/2012.
9-Artigo apresentado por Dr. Paulo Rebelles Reis, Eng. Agr. Pesquisador EPAMIG/Bolsista CNPq na revista Informe Agropecuario da Epamig n0261 edição março/abril 2001 – pagina 104).
OBS: Letras em itálico entre parênteses são comentários do autor.
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