segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Resposta ao artigo 'Naufrágio Orgânico'



Por Paulo Henrique Leme
postado em 18/01/2013

Para conferir o artigo Naufrágio Orgânico e respectivos comentários de leitores, clique aqui.

Nestes últimos anos uma questão vem me fazendo refletir bastante: a formação e a relação dos mercados de produtos certificados, seja qual for a certificação.

Digo isso pois existe uma relação clara na comercialização de cafés certificados entre as diversas certificações, origens e qualidades. Por isso, precisamos olhar para o comportamento dos consumidores e para o marketing para compreender porque alguns volumes de cafés exportados crescem e outros nem tanto.

A relação mais óbvia é a “certificação de práticas sustentáveis + qualidade gourmet”. Não está claro em nenhuma pesquisa de mercado e em nenhuma pesquisa científica qual a correta percepção e comportamento do consumidor no que se refere a estas características. Compro porque é sustentável e tem qualidade gourmet ou compro só porque é sustentável?

Para nós produtores de café isso faz toda a diferença. Produzir um café orgânico requer uma mudança completa na filosofia de trabalho e nas práticas agronômicas dentro da porteira. Além do custo da mudança e do custo mais alto devido à mão-de-obra e insumos diferenciados (?), existem os problemas relativos à produtividade, fator chave de competitividade no agronegócio brasileiro hoje. Sim, é possível obter produtividades altas com a cafeicultura orgânica (basta conversar com alguns produtores de orgânicos para constatar isto), porém, isto é para poucos.

Outro detalhe muito importante: fazer um café orgânico é uma coisa, fazer um café orgânico gourmet é outra, e aí mora o gargalo, gargalo este que se repete também na produção de cafés de comércio justo. Ou seja, além de resolver questões referentes à produtividade, o segundo estágio está em melhorar a qualidade da bebida em lotes significantes.

Os compradores internacionais por sua vez são categóricos: quero certificação sustentável, mas com qualidade acima de 82 pontos na escala SCAA. Opa! Aí complica... Os volumes de cafés orgânicos produzidos com esta qualidade em uma lavoura são pequenos. Se para um cafeicultor mediano brasileiro, fazer café com qualidade é um desafio, imagina somar a isto às condições e mudanças estruturais da cafeicultura orgânica.

Isto gera outra distorção de mercado. Antes podíamos classificar os produtores orgânicos como uma categoria única e homogênea no agronegócio como um tudo. Hoje isto não é mais a realidade. Temos grandes agroempresas produzindo produtos orgânicos e que conseguem altos índices de produtividade e qualidade. E do outro lado da moeda, pequenos produtores, cuja única vantagem competitiva é a mão-de-obra familiar.

Do lado dos compradores algumas outras questões referentes à interligação de mercados e percepção dos consumidores afloram. O Peru é uma fonte de quantidade e qualidade razoável neste mercado, a preços muito melhores que os brasileiros. Fontes informais nos dizem que o Peru exporta hoje algo em torno de 500 e 700 mil sacas de café, enquanto que o México exporta algo em torno de 500 mil sacas. Aí vem a dobradinha cruel para nós brasileiros. Quem tem mais apelo aos olhos do consumidor? Os cafés peruanos, mexicanos e africanos orgânicos ou os brasileiros?

Estes fatores, atuando de forma conjunta nos mercados de produtos certificados, geram para os cafés orgânicos brasileiros o “nicho do nicho de mercado”, se não tiver alta qualidade, prefiro comprar dos concorrentes.

Temos portanto gargalos na lavoura, na comercialização, e principalmente, na mente dos consumidores.

No mais meus amigos Celso Vegro e Eduardo Heron, iniciadores do debate, obrigado pelo excelente artigo e pela reflexão!

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