terça-feira, 30 de abril de 2013

Abuso sexual infantil em Ain El-Hilweh - LÍBANO




Foto: Dailystar

A Naba'a é uma ONG especializada em ajudar os refugiados dos campos de palestinos no Líbano, em especial famílias e crianças, vítimas de abuso sexual, nesta última semana, a Naba'a emitiu um relatório de um estudo realizado sobre a violência cometida contra crianças dentro dos campos de refugiados, no intuito de aprofundar a gravidade dos incidentes de abuso vividos pelas crianças palestinas. Um dos casos abordados de forma mais explícita, foi o corajoso caso de Hajar S., uma mãe que decidiu falar abertamente sobre o caso de seu filho, quando diversas outras mães se calam, por abuso sexual ainda ser considerado um tabu dentro do campo, habitado por 90 mil refugiados palestinos e cerca de 10 mil refugiados sírios, onde a maioria se silencia por vergonha ou costumes sectários.

Hajar relatou que após o divórcio com seu marido, ela precisou trabalhar, e ficava muitas horas longe de casa, e seu filho de apenas 8 anos, era obrigado a ficar sozinho. Um dia ele foi abusado sexualmente por um garoto mais velho, que em troca lhe deixou LL 3,000 em moedas. Quando soube do abuso cometido contra seu filho, ela levou seu filho imediatamente a um médico, e quando voltou para casa, soube que seu filho não havia sido o único, outros casos ocorreram antes dele, e outros dois casos aconteceram depois. Mas Hajar diz que as mães sentem medo de falar sobre os abusos, sem contar que as vítimas também não recebem apoio psicológico dos pais e de ninguém. Instala-se o silencio, e todos devem esquecer. Então ela recorreu a Naba'a, e levantou a questão sobre essas crianças vítimas de abuso sexual dentro do acampamento, aos especialistas da ONG, contribuindo assim, junto com outros pais em igual situação, para o relatório do estudo realizado pela Naba'a. 

Hajar incentiva outros pais a reportarem os casos aos funcionários do campo, porque a discrição deles não ajudará seus filhos, outras crianças, e ainda incentivará os abusadores a continuarem agindo. Figuras religiosas trabalham incansavelmente dentro do acampamento, para oferecer a educação islâmica adequada aos milhares de devotos que existem lá dentro, porém levantar questões sobre sexo, homossexualismo e estupro, não são aceitos ou permitidos por essas mesmas entidades religiosas. A Naba'a investiga profundamente cada caso, verifica a veracidade de cada denuncia, e oferece auxílio às vítimas, no intuito de poder ajudar a resolver o problema, e proteger as crianças, e evitar que haja novas vítimas. 

Hajar afirmou a importância de conscientizar outras pessoas, e disse que ela apoia as palestras sobre educação sexual nas escolas islâmicas, para sensibilizar os pais e adolescentes, e que a degradação moral ligada ao aumento de canais sem licença de satélites, sem censura, programas que de TV que desviam as crianças e adolescentes da religião, a falta de orientação e educação adequada vem contribuindo para que esse tipo de abuso contra as crianças esteja se intensificando. A maioria das crianças, que foram vitimas de abuso sexual, relatou que os autores eram pessoas próximas, ou conhecidas, que viviam em seu ambiente, ou perto de suas casas, ou escola, e a maioria dos incidentes ocorreram na rua, após a escola, quando as crianças retornavam para suas casas. 

Rowayda Ismail, uma das psicólogas do estudo feito pela Naba'a, disse que os costumes e tradições, falam mais alto, e que o tabu em falar sobre essa questão, leva muitas famílias ao silêncio, e não permite que essas crianças sejam protegidas, ou ajudadas, e nem incentivadas a falarem sobre os problemas que elas enfrentam com seus pais, por medo, por vergonha, e assim, elas acabam privadas de auxilio psicológico e profissional. 17 casos de abuso sexual com meninos entre 10 e 15 anos, foram relatados em 2011, a maioria desencadeada por rompimentos familiares, exposição das crianças a conteúdo pornográfico, além de casos de pedofilia. 

A Naba'a não oferece apenas tratamento psicológico, mas também promove atividades que devolvam as crianças sua saúde mental, além de orientação aos pais, de que deem mais tempo e atenção aos seus filhos e ouçam seus problemas. O Centro Naba'a ganhou credibilidade, popularidade e confiabilidade entre a comunidade, após a notícia de que seus programas e sua equipe eram de confiança, e eles vêm recebendo diversas ligações com pedidos de ajuda. Devido ao crescimento de crianças vítimas de abuso sexual, dentro do acampamento de Ain Al-Hilweh, que ocupa cerca de 1km de terra, e dispõe de 100 mil pessoas, foi criado um Comitê de Proteção as crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual, composto por um psiquiatra, um oficial político de comitês populares, uma figura religiosa, e um representante da UNRWA. 

Entretanto, as figuras religiosas envolvidas no comitê do acampamento, precisam se conscientizar a lidar melhor com a realidade, e abordar o assunto sem tabus, porque esconder, ou omitir, o número de casos, ou dizer que a quantidade revelada é exagerada, ou ainda, culpar a vinda de refugiados sírios para dentro do acampamento, não resolverá o problema, assim como falar sobre o assunto, também não irá manchar a imagem do campo, acreditando-se que ele se tornará um ambiente visado, próspero para pervertidos.
Pensar na proteção e bem estar das crianças do acampamento, bem como buscar métodos eficientes de solucionar o problema real e crescente dentro do acampamento, deve ser uma prioridade para essas figuras religiosas. A triste e dolorosa realidade dessas crianças, vítimas de abuso sexual, deve ter muito mais importância do que a opinião, ou visão, das pessoas de fora, em relação à comunidade que vive dentro do acampamento.  


Claudinha Rahme
Gazeta de Beirute


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