terça-feira, 30 de abril de 2013

Países latino-americanos criam mecanismo de defesa contra multinacionais


Países latino-americanos criam mecanismo de defesa contra multinacionais

1ª Conferência Ministerial dos Países Latino-americanos Afetados por Interesses das Transnacionais, realizada semana passada no Equador, criou um novo mecanismo de coordenação regional para a defesa conjunta dos interesses dos países da América Latina nos processos de arbitragem internacional interpostos por empresas estrangeiras

Criar um novo mecanismo de coordenação regional para a defesa conjunta dos interesses dos países da América Latina nos processos de arbitragem internacional interpostos por empresas estrangeiras. Esta foi a principal decisão da “1ª Conferência Ministerial dos Países Latino-americanos Afetados por Interesses das Transnacionais”, ocorrida na última segunda-feira (22) em Guayaquil.

A preocupação procede. A América Latina concentra a maior quantidade de processos ilegais e arbitrários contra uma região, sendo que Argentina, Venezuela, Equador, México e Bolívia acumulam 27% do total de casos no mundo.

No encontro, representantes de 14 países – entre eles Argentina e Uruguai - delinearam um plano de ação em defesa da soberania dos estados nacionais frente aos contínuos abusos praticados pelos tribunais de arbitragem internacionais que, aproveitando-se dos tristemente célebres Tratados Bilaterais de Investimento (TBI), têm imposto o interesses dos “investidores”.

Num dos tantos exemplos de afronta à legislação citados está o caso da multinacional Texaco, que entre os anos 1970 e 1990, provocou imensos estragos ecológicos no campo de Lago Agrio, no Equador, com sua exploração predatória. Para economizar, a multinacional despejou, sem qualquer tratamento, mais de 16 bilhões de lixo tóxico nos rios e córregos da região, contaminando mais de 30 mil moradores da área, multiplicando os casos de câncer, leucemia, aborto, anomalías congênitas e doenças crônicas. 

O processo judicial teve início na Justiça Federal dos Estados Unidos, em 1993, e acabou sendo transposto para o Equador em 2003, a pedido da Chevron, sucessora da Texaco, que via no governo neoliberal de então um possível anteparo aos seus crimes. Mas, uma vez que o governo mudou e a decisão equatoriana foi desfavorável à multinacional, condenada a pagar uma indenização de US$ 19 bilhões, a Chevron passou a questionar a “competência” e a “lisura” da Justiça equatoriana para julgar o caso.

No dia 7 de fevereiro deste ano, um tribunal internacional de arbitragem emitiu uma sentença em que conclui que o Equador “violou” as sentenças provisórias emitidas anteriormente - com base em um Tratado de Investimento Bilateral firmado com os Estados Unidos -, por não haver impedido a tentativa de execução da sentença judicial de US$ 19 bilhões contra a Chevron Corp. Cúmulo dos cúmulos, o tal “Tribunal” considerou o Equador culpado por ter violado o TIB e tentar buscar que a Chevron pagasse pelos seus crimes. 

Há quase um ano, o “Tribunal” emitiu uma Segunda Sentença Provisória ordenando a República do Equador - e todos os seus poderes, incluindo o judiciário - a tomar todas as medidas necessárias para evitar a execução e o reconhecimento da sentença de Lago Agrio, tanto dentro como fora do país.

“Estamos ao lado do Equador e de boa parte dos países da Unasul, ao propor a criação de uma instância própria da União de Nações Sul-americanas sobre regulação e tratamento de investimentos estrangeiros”, declarou o chanceler venezuelano Elías Jaua, frisando que as multinacionais só respeitam governos que mostram firmeza na defesa dos interesses de seus povos.

Elías Jaua expressou o profundo mal estar causado pelos TBI que, na verdade, “não servem para atrair investimento estrangeiro, mas para submeter nações soberanas”. Por isso, sublinhou, desde 2012 a República Bolivariana vem denunciando o Centro Internacional de Ajuste de Diferenças Relativas a Investimentos (Ciadi), por favorecer permanentemente às transnacionais.

“Tivemos graves problemas com as transnacionais porque quando estas descumprem os compromissos assumidos, e os Estados têm que terminar os contratos, nos submetem a uma arbitragem. Isso é uma ofensa e por isso estamos aqui reunidos, para colocar a casa em ordem”, enfatizou o chanceler equatoriano, Ricardo Patiño. O diplomata esclareceu que o investimento estrangeiro é bem-vindo, sempre que “respeite as leis, que venha para complementar o investimento nacional, que tenha disposição de transferir tecnologia, que consuma produtos nacionais e gere desenvolvimento”.

Destacando a importância de políticas comuns para o enfrentamento coletivo ao problema, Patiño explicou a postura adotada pelo país: “Na última década foi quando nasceram a Alba, Celac, Unasul, o Banco do Sul, o Sucre e muitas conversações entre nossos Estados, que decidiram caminhar com nossos próprios pés para avançar a nossa independência política. Um dos âmbitos é este: a relação com as transnacionais”.

Frente a tamanhos atropelos, os participantes decidiram constituir um Comitê Executivo para “planejar e executar ações de apoio mútuo nos âmbitos político e jurídico”, coordenar “a defesa conjunta das ações jurídicas através de equipes legais internacionais de especialistas e advogados profissionais”, e “planificar estratégias de comunicação, como oposição às campanhas globais empreendidas pelas empresas transnacionais”. 

Também será criado um “Observatório Internacional” para apoiar aos Estados demandados e difundir publicamente a situação de litígios, identificando procedimentos que permitam “auditar, avaliar e monitorar a ação dos tribunais internacionais de arbitragem em matéria de investimentos”.

Vários dos representantes governamentais expuseram suas experiências sobre os valores que precisaram desembolsar às transnacionais devido às demandas interpostas em instâncias internacionais e que, finalmente, prejudicaram a soberania – e a economia - dos seus países.

Um dos mecanismos propostos, no qual atualmente já estão trabalhando os países da Unasul, é a criação de um Centro de Controvérsias regional, com o objetivo de garantir equidade na defesa dos interesses das partes, algo que é anulado pelo TBI.

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