A descoberta de que a riqueza líquida dos alemães é menor do que a do Sul tem mais a ver com salários baixos do que com riquezas imaginárias
Costas Lapavitsas
Costas Lapavitsas
Pobreza na Alemanha em 2011 - Na imagem são destacados os Länders com as taxas de pobreza mais elevadas
A descoberta de um recente relatório do Banco Central Europeu (BCE) sobre a riqueza das famílias inflamou a opinião pública na Alemanha. Em 2010, a média dos rendimentos líquidos nos lares alemães – todos os bens menos todas as perdas – era de €195,000 (£168,000). Nos Estados Membros do Sul, os números eram surpreendentemente altos: €291,000 em Espanha, €275,000 em Itália, €153,000 em Portugal, €148,000 na Grécia e, esperem, €671,000 no Chipre. Parece que foi pedido ao povo alemão para salvar os povos do Sul os quais são mais ricos que os seus salvadores. “A mentira da pobreza”, diz a primeira página do semanário Der Spiegel. Terão os cidadãos alemães o direito de estarem zangados? A resposta é sim, mas escolheram o alvo errado.
Entretanto, o argonauta exportador causou o pânico no resto da união monetária europeia. Incapazes de competir, os países periféricos acumularam dívidas pública e privada enormes. Durante algum tempo, o endividamento disfarçou as fraquezas inerentes ao impulsionar o consumo interno e, em alguns países, levando à bolha imobiliária. Mas quando a crise global chegou e falha estrutural da Europa da periferia tornou-se evidente. O Sul encontrou-se na posse de casas sobreavaliadas e de dívidas que mal podem pagar. Ricos, sem dúvida.
O plano da Alemanha para solucionar o problema tornou as coisa piores. Os países periféricos foram forçados a cortar os salários para aumentar a sua competitividade assim como adoptar medidas austeras. Inevitavelmente, o resultado foi uma recessão profunda e desemprego galopante. Os aparentemente ricos do Sul estão agora a cambalear perante a depressão, os rendimentos caem e o valor das suas casas desce. A sua riqueza está a desaparecer e, contudo, as suas dívidas persistem e estão a tornar-se cada mais insuportáveis. Se a Alemanha forçar os sulistas a comprometerem parte da sua riqueza putativa para suportar a crise através, por exemplo, dos cortes nos depósitos bancários, como aconteceu no Chipre, o resultado será uma devastação económica acelerada.
O público alemão tem razão para estar aborrecido sobre como é as coisas estão a desenrolar-se na zona euro. Mas deviam procurar o verdadeiro culpado que é a política alemã de contenção salarial que suprime a procura interna e aumenta as exportações. É esta a razão dos constrangimentos no rendimento, e até da pobreza na Alemanha. Se querem uma resposta eficaz, não deveriam procurar punir ainda mais os ricos imaginários do Sul mas sim, apontar para salários mais altos, aumentar o consumo interno e reduzir o peso das exportações. Isto sim, é uma luta que vale a pena travar.
Costas Lapavitsas é professor de economia na School of Oriental and African Studies da Universidade de Londres e cronista do diário inglês "The Guardian"
Tradução de Sofia Gomes para o Esquerda.net
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