Relatórios obtidos pelo ‘Estado’ mostram que, em 2011 e 2012, órgãos como Anac e Antaq – cujos diretotes estavam ligados ao esquema desmantelado pela Operação Porto Seguro – arrecadaram 45% do total cobrado de empresas que descumpriram normas
Fábio Fabrini
Fábio Fabrini

A Agência Nacional do Cinema (Ancine) arrecadou, entre multas quitadas e parceladas, no máximo 5% do total cobrado: R$ 5,1 milhões. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) pleiteia R$ 957,8 milhões, mas a receita não passou de R$ 105 milhões (11%).
Telefonia. A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) gerou R$ 207,7 milhões em multas, mas recebeu R$ 13,6 milhões (6,5%). Permanecem pendentes 2.500 autuações. Operadoras de telefonia e outras empresas do setor só têm arcado com débitos irrisórios; quando o valor ultrapassa a casa do milhão, dão calote ou recorrem à Justiça.
As 22 maiores multas aplicadas pela Anatel no período não foram pagas – 15 delas estão sendo discutidas nos tribunais. Do total cobrado, 63% estão sub judice. Por esse mecanismo, a Oi protela o pagamento de R$ 35,7 milhões; a Telefônica, mais R$ 44,4 milhões. Desde 2000, R$ 2,1 bilhões em multas foram aplicadas pela Anatel, mas R$ 1,2 bilhão está sendo questionado na Justiça. “As empresas entram na Justiça com qualquer argumento. O intuito é meramente protelatório”, diz o procurador-geral da agência, Victor Epitácio Cravo Teixeira.
Dar calote nas agências reguladoras, não raro, compensa, pois o processo de cobrança é lento. Cabe a elas inscrever a empresa multada no Cadastro Informativo de Créditos Não Quitados do Governo (Cadin) e na Dívida Ativa da União para, em seguida, executar o débito na Justiça. Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) apresentado em 2012 mostra que, de 2008 a 2011, 17 órgãos de fiscalização – entre eles as dez agências reguladoras – aplicaram média de 14 mil multas por ano. Apesar da alta inadimplência, anualmente houve 926 inscrições por órgão no Cadin. Nesses quatro anos, as multas somaram R$ 29 bilhões, dos quais R$ 1,6 bilhão foi efetivamente arrecadado.
Recursos. Segundo o TCU, cujo porcentual de recolhimento também é pífio (8,3% no período), o problema se deve a um caldo de fatores: excesso de instâncias para recursos, falta de estrutura para analisá-los, excesso de multas suspensas ou canceladas pela Justiça e as próprias agências.
Para o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), os dados demonstram a fragilidade do sistema de regulação na sua principal função – fiscalizar. “O aparato das agências é insuficiente. É necessário reavaliar a estrutura”, diz a gerente jurídica do Idec, Maria Elisa Novais. Para ela, outros mecanismos de punição devem ser adotados, como a proibição de vender produtos.
O presidente da Sociedade Brasileira de Direito Público, Carlos Ari Sundfeld, diz que falhas nos regulamentos favorecem a inadimplência. Os tipos de penalidade (notificação, multa, advertência, suspensão) são descritos de forma genérica, sem precisar em quais situações cada um se aplica. “As normas são amplas, o que gera o interesse das empresas em questionar.” Para a advogada Letícia Queiroz de Andrade, especialista em Infraestrutura e Direito Regulatório, outro problema são as obrigações criadas via resoluções, não previstas no contrato de concessão.

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