segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Livro debate o conceito de 'nova classe média' no Brasil


Livro debate o conceito de 'nova classe média' no Brasil

‘A "Nova Classe Média" no Brasil como conceito e projeto político’ é organizado pelo diretor no Brasil da Fundação Heinrich Böll, Dawid Danilo Bartelt. O lançamento ocorre nesta terça-feira, 27 de agosto, em São Paulo, no Instituto Pólis (Rua Araújo 124 – Centro), com apoio da Plataforma Política Social e do Le Monde Diplomatique.

A Fundação (alemã) Heinrich Böll está lançando o livro ‘A "Nova Classe Média" no Brasil como conceito e projeto político’, organizado por seu diretor no Brasil, Dawid Danilo Bartelt. O lançamento ocorre nesta terça-feira, 27 de agosto, em São Paulo, no Instituto Pólis (Rua Araújo 124 – Centro), com apoio da Plataforma Política Social e do Le Monde Diplomatique. 

O programa começa às 10 horas da manhã e continua às 14 horas, com duas mesas reunindo diferentes colaboradores do livro. Entre os colaboradores do mesmo estão nomes como Márcio Pochmann, Candido Grybowski, Christiane Uchôa, Lígia Bahia, entre outros. De um modo geral o livro aborda criticamente este conceito de “nova classe média” que emergiu na política brasileira recente como explicação, rótulo, marketing, justificativa, ou outra palavra que se queira como interpretação, das mudanças sociais ocorridas no Brasil nos últimos anos. 

Também analisa – também, em geral, de modo crítico – as limitações destas mesmas mudanças sociais, com uma visão assentada sobretudo a partir das últimas manifestações de junho em diversas cidades brasileiras. Apresenta-se, a seguir, o trecho inicial da Introdução, assinada pelo organizador Dawid Bartelt, que, além de dirigir a Fundação H. B. no Brasil, é conhecido e reconhecido pesquisador da realidade brasileira na Alemanha e no próprio Brasil. 

“Para um presidente como Lula, pouca coisa poderia servir melhor como
legado do seu governo do que o de ter criado uma “Nova Classe Média”
(NCM), ainda mais em um país emergente com uma longa tradição de
extrema desigualdade. Por isso não pode surpreender o fato de, nos governos
Lula e Dilma, ter sido construída uma narrativa que organiza os
ganhos reais dos salários de pessoas de baixa renda no Brasil e os avanços
nas políticas sociais sob este título. Fica logo evidente que se trata menos
de um fato sociológico e mais de um projeto de estratégia e marketing políticos.
Por isso, a retórica e as artes aritméticas das classificações de renda
que o acompanham não apenas fazem sentido como são estratégicas. Na
era pós-ideológica, o poder político se realiza no centro; é ocupar o meio
entre os “extremos”, pois o centro da sociedade garante a hegemonia e a
luta polarizada, não. Na Europa, os grandes partidos outrora identificados
como “de direita” ou “de esquerda” se movimentam rumo ao “centro”,
declarando direita e esquerda como margens da sociedade, território ideológico
dos de ontem. No Brasil, já assistimos a embates políticos por esta
classe; o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso alertou o seu partido,
o PSDB, para não perder tempo em “brigar” com o PT pela hegemonia
nos movimentos sociais e junto ao povão. O esforço em ampliar e consolidar
a base eleitoral deve-se focar na NCM1.
No ano de 2012, houve interessante junção de fatos, formando uma
ofensiva de marketing na construção de uma visão sobre a NCM brasileira:
• Duas novelas da TV Globo exibiram pela primeira vez a Nova Classe
Média ou Classe C como protagonistas – “Cheias de Charme” e
“Avenida Brasil”,– ocupando, concomitantemente e durante meses,
os horários das 19 e das 21 horas.
• O economista e “pai da Classe C”, Marcelo Neri, lançou seu livro” A
Nova Classe Média: o lado brilhante da pirâmide”, que recebeu alta
atenção nacional e até internacionalmente.
• Além disso, tornou-se diretor do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA), órgão-chave na concepção e divulgação de políticas
econômicas e sociais do governo.
• Foi lançado o projeto “Vozes da Classe Média” pela Secretaria de Assuntos
Estratégicos da Presidência da República (SAE), apoiado pela
Caixa Econômica Federal, Confederação Nacional da Indústria e
pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
O trabalho de Neri, na maior parte enquanto economista destacado
da Fundação Getúlio Vargas, tornou-se referência principal do debate no
Brasil, que já originou pelo menos quatro livros – um mais afirmativo, de
Bolívar Lamounier e Amaury Souza2, e três mais críticos, ainda que de
ângulos diferentes, de Marcio Pochmann3 e os dois livros organizados e escritos
por Jessé Souza4•, sendo que esses dois autores contribuíram para esta
publicação. Além disso, principalmente no ano de 2012, surgiram vários
artigos sobre o tema, além de colunas e artigos na mídia impressa e online.
Não bastassem as manifestações que tomaram conta das ruas brasileiras
em junho de 2013, o tema está mais do que posto. Sua relevância consiste,
entre outras coisas, no fato de que através dele se discute os rumos e as prioridades
políticas do desenvolvimento da sociedade brasileira no futuro próximo.
Por isto, estamos lançando a presente publicação. Ela procura reunir,
de forma mais sistemática, vozes críticas ao que deve ser concebido como
um projeto político de grande porte que precisa, urgentemente, de análise
mais profunda. Podemos afirmar que esta “Nova Classe Média” está, hoje, de
forma aguda, subdeterminada, não apenas sociológica e empiricamente, mas
também ideológica e politicamente. E as manifestações de Junho têm indicado
fortemente que a narrativa ligada à “Nova Classe Média” está se esgotando.
Sociologicamente, as classes médias fazem parte das pesquisas sobre as
elites da sociedade. Ainda que Neri tenha dito5 que o seu uso do termo não
seria sociológico e se referia ao fato da Classe C estar “no meio” das cinco
classes de renda por ele aplicadas, e, portanto uma classe “média”, é clara e
intencional a referência à classe média tradicional, enquanto categoria sociológica.
De fato, não fosse a força propagandística do governo e suas instituições
publicitárias e científicas incumbidas para tal fim, este livro talvez nem
precisasse ser publicado, de tão óbvio e evidente é a crítica que constata: uma
classe que dispõe de entre 1.200 e 5.174 R$6 de renda familiar, visto o nível de
custo de vida nas grandes cidades, não constitui uma nova classe média. Mas
a vantagem deste projeto político chamado “Nova Classe Média” (NCM) é
que ele nos compele, enquanto cidadãos e observadores atentos às mudanças
dinâmicas da sociedade brasileira, a refletir novamente sobre o que constitui
e deveria constituir uma classe média-base de uma sociedade moderna mais
justa e igualitária e quais seriam o papel e as obrigações que o Estado, organizador
e regulador da sociedade moderna, deve assumir.
As análises desta publicação se dividem em duas seções principais, diretamente
interligadas, e ainda apresentam dois textos que se referem à
dimensão internacional do debate.”

Notas
1 Fernando Henrique Cardoso: O Papel da Oposição, em: Revista Interesse Nacional, 02.04.2011. Disponível em:
. Acessado em: 24.06.2013.
2 LAMOUNIER, Bolívar e Souza, Amaury: A classe média brasileira: ambições, valores e projetos de sociedade,
Campus/CNI, 2010
3 POCHMANN, Marcio: Nova classe média? O trabalho na base da pirâmide social brasileira, Boitempo, 2012.
4 SOUZA, Jessé, et alii, A ralé brasileira: quem é e como vive, UFMG, 2009; SOUZA, Jessé, et alii, Os batalhadores
Brasileiros: Nova classe média ou nova classe trabalhadora, UFMG, 2010
5 Em conversa com o autor desta introdução, mas também na p. 83 do seu livro “A Nova Classe Média” (2012)

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