segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Ministro iraniano admite 'acordo nuclear' e pede respeito do Ocidente

O ministro do Exterior iraniano, Mohammad Javad Zarif, cumprimenta diplomatas depois de ouvir o presidente dos EUA, Barack Obama, na ONU

Christophe Ayad E Serge Michel
O ministro do Exterior iraniano, Mohammad Javad Zarif, cumprimenta diplomatas depois de ouvir o presidente dos EUA, Barack Obama, na ONU
Mohammad Javad Zarif, 53, é o ministro iraniano das Relações Exteriores desde agosto. Depois de ter se encontrado com Laurent Fabius na terça-feira (5), em Paris, ele vai para Genebra para retomar as negociações na quinta-feira sobre a questão nuclear.
Le Monde: O Líder supremo Ali Khamenei acaba de declarar que não está otimista quanto ao resultado de suas negociações. E o senhor?
Mohammad Javad Zarif: Ele disse que confiava na equipe de negociação, mas não na outra parte. E nós também não. Nos últimos anos, certos comportamentos dos ocidentais arruinaram a confiança dos iranianos, assim como as inúmeras sanções impostas ao Irã, que vão bem além das resoluções do Conselho de Segurança. Os pacientes iranianos foram privados de medicamentos dos quais precisavam.
Para resolver o problema, existe uma janela de oportunidade que o próprio povo iraniano abriu em junho, ao eleger o presidente Rohani. Nós viemos negociar com uma nova abordagem e todo mundo percebeu nossa seriedade, tanto em Genebra quanto em Nova York. Ainda estamos aguardando uma abordagem similar da parte de nossos parceiros.
Vocês estão longe de fechar um acordo?
Nem tanto. Nós identificamos os assuntos nos quais todos devem ceder. Na semana passada, em Viena, além de uma reunião muito positiva na Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), nós fizemos uma reunião entre especialistas. Eles falaram sobre tudo que havia sido levantado. Agora, é preciso fazer os ajustes necessários e avançar. Podemos fechar um acordo esta semana em Genebra, e se não for o caso, não vai ser um desastre, contanto que haja avanços.
A França é mais intransigente do que os Estados Unidos?
Sim. Já tivemos dias melhores com Paris. A França é uma parceira importante, temos laços históricos, com altos e baixos, e no momento não estamos em um alto... Mas espero que consigamos avançar. E que os franceses demonstrem pragmatismo, flexibilidade e vontade de fechar um acordo. Existe um potencial enorme de coisas a serem feitas em conjunto.
De quanto urânio enriquecido a 20% o Irã dispõe? Em agosto a AIEA falava em 186 quilos...
Isso me parece exato. Os números da AIEA são os mais confiáveis, porque seus inspetores estão em toda parte, monitoram tudo, gravam tudo. Não temos nada a esconder.
Por que vocês produziram tanto, sendo que oficialmente não têm outro uso além de um reator de pesquisa?
O que nós fizemos é legal. Pedimos para comprar urânio enriquecido para esse reator de pesquisa que os Estados Unidos nos deram há muito tempo. Ninguém quis nos vender um único grama. Isso levou o Irã a enriquecer seu próprio urânio a 3,5% e a 20%.
Cabe dizer que nos últimos oito anos as duas partes entraram em um jogo que consistia em se prejudicarem mutuamente. Do lado ocidental, o objetivo era impor sanções ilegais ao Irã, prejudicar os iranianos. E do lado iraniano, a única possibilidade era aumentar sua capacidade de produção. No dia 23 de março de 2005, vim a Paris apresentar um "pacote" a meus interlocutores europeus. Eles não quiseram e até hoje se arrependem amargamente. Na época, tínhamos menos de 160 centrífugas. Agora, são mais de 19 mil. Eis no que deram as sanções. Que fracasso!
Hoje, existe uma abertura com um novo governo eleito pelo povo iraniano. Se eu fosse o encarregado em Paris, agarraria a oportunidade. Eu manteria essa janela aberta antes que ela se fechasse novamente.
Por que não permitir que seu estoque de urânio enriquecido saia do país?
Por que não temos que fazer isso! Os ocidentais precisam parar de querer ditar suas soluções. Já faz muito tempo que não é mais assim. Vocês querem ter certeza de que o programa nuclear iraniano continue pacífico? É nosso objetivo. Oito anos foram perdidos. Não podemos voltar atrás. Vamos buscar soluções aceitáveis para todos que mantenham o programa iraniano o mais transparente possível e garantam que ele permaneça pacífico.
Vocês estão dispostos a abrir todas suas usinas? De Fordow, Arak e Parchin?
Elas já são abertas para os inspetores! No caso de Parchin, estamos conversando a respeito com a  AIEA. Certas alegações sem fundamentos precisam de um mecanismo para serem resolvidas. Estamos dispostos a acabar com as dúvidas, e isso em um prazo razoável. Devemos receber a AIEA em Teerã novamente na semana que vem, e espero chegar a um acordo.
A AIEA poderá questionar Mohsen Fakrizadeh, considerado o pai de uma possível seção militar de seu programa?
Estamos conversando com a AIEA, que tem várias solicitações a fazer. Não quero falar à imprensa sobre assuntos que façam parte das negociações. O melhor meio de encontrar um acordo é mantendo a discrição.
Que importância o senhor dá às ameaças militares dos Estados Unidos e de Israel?
É uma pena que no mundo de hoje certas pessoas ainda ameacem apelar para a força. Quando elas dizem "Todas as opções serão consideradas", não sei se são membros ou não da ONU. Nem todas as opções são consideradas. Elas foram descartadas pelas nações civilizadas. O uso da força é um desastre para todo mundo. Veja o que o uso da força por parte dos americanos gerou no Iraque e no Afeganistão!
Estamos no século 21. O Irã não invade ninguém há 250 anos. Mas ele se defendeu vigorosamente da última vez, contra a invasão de Saddam Hussein, em 1980. É preciso pensar duas vezes antes de nos ameaçar.
Fora a questão nuclear, seu objetivo é uma reconciliação com os Estados Unidos?
O objetivo hoje é resolver a questão nuclear. Depois, veremos se os Estados Unidos são capazes de conquistar a confiança do povo iraniano.
Justamente, o senhor confia no presidente Obama?
Ele faz comentários positivos e outros que o contradizem. Mas suas declarações não bastam, o que contam são as ações. Veremos se o presidente Obama tem coragem de dar um passo à frente para resolver problemas que nunca deveriam ter existido. Resolvê-los porque eles merecem ser resolvidos, e não por causa de seu eleitorado. Esperamos que os governantes governem.
Se esses problemas forem resolvidos, vocês poderiam reconhecer a existência de Israel?
Não importa. Nós não ameaçamos ninguém com o uso da força. O problema no Oriente Médio são práticas que violam os direitos dos palestinos. O drama dos palestinos deve ter respostas se quisermos a paz na região.
O Ocidente pode viver sem o Irã. Não são vocês que precisam de qualquer jeito de um acordo?
O Irã também pode viver sem o Ocidente. O mundo está mudando do Atlântico para o Pacífico. O Ocidente está perdendo sua grandeza e a Europa vai passando de uma crise financeira para outra. A verdade é que a política ocidental – em relação ao Irã – é um fracasso. Se precisamos de um acordo, eles precisam ainda mais. Se tínhamos 160 centrífugas no Irã dez anos atrás e 19 mil hoje, quem precisa de um acordo? O Irã pode se virar sozinho. Com algumas dificuldades, mas ele pode.
É preciso sair do "Se eu ganhar isso, você vai perder isso". Todos nós vamos perder juntos. Não existe segurança às custas da insegurança dos outros, não há prosperidade às custas da miséria dos outros. Senão, o 11 de setembro não teria acontecido. É preciso mudar a abordagem e fazer com que todos ganhem, em pé de igualdade. E respeito mútuo. É essa a regra do jogo do século 21.
Tradutor: Lana Lim

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