Exame internacional Pisa, realizado em vários países do
mundo e que tem como objetivo avaliar sistemas educacio
nais acaba de desfazer 7 mitos sobre eficiência da educação
Andreas Schleicher e Sistema educacional (Imagem: Pragmatismo Político)
A cada três anos, estudantes de vários países fazem o exame internacional Pisa
(sigla inglesa para Programa Internacional de Avaliação de Alunos), cujo objetivo
é avaliar sistemas educacionais no mundo por meio de uma série de testes em
assuntos como leitura, matemática e ciências.
Cerca de 510 mil estudantes de 65 países participaram da rodada mais recente
de testes, realizada em 2012. Os resultados foram divulgados em dezembro de
2013.
O Brasil ocupa a posição 55 no ranking de leitura, 58 no de matemática e 59 no
de ciências. Xangai (China) está no topo da lista nas três matérias, Cingapura
e Hong Kong se revezam na segunda e terceira posições.
No artigo a seguir, o responsável pelo exame, Andreas Schleicher, usa dados
revelados pelo Pisa para destruir alguns dos grandes mitos sobre o que seria
um bom sistema de educação:
1. Alunos pobres estão destinados a fracassar na escola
Em salas de aula de todo o mundo, professores lutam para impedir que alunos
mais pobres fiquem em desvantagem também no aprendizado.
No entanto, resultados do Pisa mostram que 10% dos estudantes de 15 anos
de idade mais pobres em Xangai, na China, sabem mais matemática do que
10% dos estudantes mais privilegiados dosEstados Unidos e de vários países
europeus.
Crianças de níveis sociais similares podem ter desempenhos muito diferentes,
dependendo da escola que frequentam ou do país onde vivem. Sistemas de
educação em que estudantes mais pobres são bem sucedidos tem capacidade
para moderar a desigualdade social. Eles tendem a atrair os professores mais
talentosos para as salas de aula mais difíceis e os diretores mais capazes para as escolas mais pobres, desafiando os estudantes com padrões altos e um ensino excelente.
Alguns americanos criticam comparações educacionais internacionais, argumentando que elas têm um valor limitado porque os Estados Unidos têm divisões socioeconômicas muito particulares.
Mas os Estados Unidos são mais ricos do que a maioria dos outros países e gastam mais dinheiro com educação do que a maioria. Pais e mães americanos têm melhor nível educacional do que a maioria dos pais e mães em outros países e a proporção de estudantes de nível socioeconômico baixo nosEUA está perto da média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE).
O que as comparações revelam é que as desvantagens socioeconômicas têm impacto particularmente forte sobre o desempenho de estudantes nos Estados Unidos.
Em outras palavras, nos Estados Unidos, dois alunos de níveis socioeconômicos diferentes variam muito mais em seu aprendizado do que se observa em outros países que integram a OCDE.
2. Países onde há muitos imigrantes têm pior desempenho
Integrar estudantes imigrantes, ou descendentes de imigrantes, pode ser um desafio.
No entanto, resultados dos exames Pisa mostram que não há relação entre
a porcentagem de estudantes imigrantes – ou descendentes de imigrantes
– em um dado país e o desempenho dos estudantes daquele país nos exames.
Estudantes com históricos de imigração e níveis sociais similares apresentam
desempenhos variados em países diferentes, o que sugere que as escolas
onde os alunos estudam fazem muito mais diferença do que os lugares de
onde os alunos vêm.
3. É tudo uma questão de dinheiro
A Coreia do Sul – país com melhor desempenho (em termos individuais) em
matemática na OCDE – gasta, por estudante, bem menos do que a média.
O mundo não está mais dividido entre países ricos e bem educados e países
pobres e mal educados. O sucesso em sistemas educacionais não depende
mais de quanto dinheiro é gasto e, sim, de como o dinheiro é gasto.
Se quiserem competir em uma economia global cada vez mais focada no
conhecimento, os países precisam investir em melhorias na educação.
Porém, entre os integrantes da OCDE, gastos com educação por estudante
explicam menos de 20% da variação no desempenho dos alunos.
Por exemplo, aos 15 anos de idade, estudantes eslovacos apresentam uma
média de desempenho similar à de um estudante americano da mesma idade.
No entanto, a Eslováquia gasta cerca de US$ 53.000 para educar cada
estudante dos 6 aos 15 anos de idade, enquanto os Estados Unidos gastam
mais de US$ 115.000 por estudante.
4. Salas de aula menores elevam o nível
Por toda parte, professores, pais e autoridades responsáveis por políticas
educacionais apontam salas de aula pequenas, com poucos alunos, como
essenciais para uma educação melhor e mais personalizada.
Reduções no tamanho da classe foram a principal razão para os aumentos
significativos nos gastos por estudante verificados na maioria dos países
ao longo da última década.
Apesar disso, os resultados do Pisa mostram que não há relação entre o
tamanho da classe e o aprendizado, seja internamente, em cada país, ou
se compararmos os vários países.
E o que é mais interessante: os sistemas educacionais com melhor
esempenho no Pisa tendem a dar mais prioridade à qualidade dos
professores do que ao tamanho da classe. Sempre que têm de escolher
entre uma sala menor e um professor melhor, escolhem a segunda opção.
Por exemplo, em vez de gastarem dinheiro com classes pequenas, eles
investem em salários mais competitivos para os professores, desenvolvimento
profissional constante e cargas horárias equilibradas.
5. Sistemas únicos de educação são mais justos, sistemas seletivos
oferecem resultados melhores
Parece haver um consenso, entre educadores, de que sistemas educacionais
não seletivos, que oferecem um mesmo programa de ensino para todos os
estudantes, são a opção mais justa e igualitária. E que sistemas onde alunos
aparentemente mais inteligentes são selecionados para frequentar escolas
com programas diferenciados oferecem melhor qualidade e excelência de
resultados.
No entanto, comparações internacionais mostram que não há incompatibilidade
entre qualidade do aprendizado e igualdade. Os sistemas educacionais que
apresentam melhores resultados combinam os dois modelos.
Nenhum dos países com alto índice de estratificação está no grupo de sistemas
educacionais com os melhores resultados – ou entre os sistemas com a
maior proporção de estudantes com o melhor desempenho.
6. O mundo digital requer novas matérias e um currículo novo
Globalização e mudanças tecnológicas estão tendo um grande impacto
sobre os conteúdos que estudantes precisam aprender.
Num mundo onde somos capazes de acessar tantos conteúdos no Google,
onde habilidades rotineiras estão sendo digitalizadas ou terceirizadas e onde
atividades profissionais mudam constantemente, o foco deve estar em
permitir que as pessoas tornem-se aprendizes para a vida toda, para que
possam lidar com formas complexas de pensar e trabalhar.
Resumindo, o mundo moderno não nos recompensa mais apenas pelo que
sabemos, mas pelo que podemos fazer com o que sabemos.
Como resposta, muitos países estão expandindo currículos escolares para
incluir novas matérias. A tendência mais recente, reforçada pela crise financeira,
foi ensinar finanças aos estudantes.
Porém, os resultados do Pisa mostram que não há relação entre o grau de
educação financeira e a competência dos estudantes no assunto. Na
verdade, alguns dos sistemas de educação em que os estudantes tiveram
o melhor desempenho nas provas do Pisa que avaliaram competência
em finanças não ensinam finanças – mas investem pesado no desenvolvimento
de habilidades matemáticas profundas.
De maneira geral, nos sistemas educacionais de melhor desempenho, o currículo
não é amplo e raso. Ele tende a ser rigoroso, com poucas matérias que são bem
ensinadas e com grande profundidade.
7. O segredo do sucesso é o talento inato
Livros de psicólogos especializados em educação tendem a reforçar a crença
de que o desempenho de um aluno brilhante resulta de inteligência inata, e
não do trabalho duro. Os resultados do Pisa questionam também este mito.
Às vezes, professores se sentem culpados por pressionar estudantes tidos
como menos capazes, acham injusto fazer isso com o aluno. O mais
provável é que tentem fazer com que cada estudante atinja a média de
desempenho dos alunos em sua classe. Na Finlândia, em Cingapura ou
Xangai, por outro lado, o objetivo do professor é que alunos alcancem
padrões altos em termos universais.
Uma comparação entre as notas escolares e o desempenho de estudantes
no Pisa também indica que, frequentemente, professores esperam menos
de alunos de nível socioeconômico mais baixo. E pode ser que os próprios
alunos e seus pais também esperem menos.
A não ser que aceitem que todas as crianças podem alcançar os níveis mais
altos de desempenho, é pouco provável que os sistemas educacionais (com
resultados piores) possam se equiparar aos dos países com índices de
aprendizado mais altos.
Na Finlândia, Japão, Cingapura, Xangai e Hong Kong, estudantes, pais,
professores e o público em geral tendem a compartilhar a crença de que
todos os estudantes são capazes de alcançar níveis altos.
Um dos padrões mais interessantes observados entre alguns dos países
com melhor desempenho foi o abandono gradual de sistemas nos quais
estudantes eram separados em diferentes tipos de escolas secundárias.
Esses países não fizeram essa transição calculando a média de desempenho
(entre todos os grupos) e usando essa média como o novo padrão a ser
almejado. Em vez disso, eles colocaram a nova meta lá em cima, exigindo
que todos os estudantes alcançassem o nível que antes era esperado
apenas dos estudantes de elite.
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