Faustão é mestre em lembrar expressões populares que padeceram com o tempo. Arrastão já foi
trabalho de pescadores e, hoje, é assalto coletivo em grandes concentrações urbanas. Quem ainda
diz "mandar brasa", "sujeito pau", "aquele broto" ou "mocorongo"?
Frei Betto
Frei Betto
Deonísio da Silva, mestre em nosso idioma, escreveu o imprescindível "De onde vêm as palavras" (Mandarim), desnudando-as em suas etimologias, significados e empregos.
Palavras, como tudo, se gastam com o tempo. Perdem o brilho, o significado e, portanto, o uso. É o caso de direita e esquerda. No tempo da bipolaridade mundial entre capitalismo e socialismo, elas demarcavam terrenos nítidos. Hoje, o que é ser de direita ou de esquerda?
No Brasil, a esquerda está no poder? Suponhamos que sim. Mas quem são os líderes de sua base aliada? Todos conhecemos sobejamente: Sarney, Collor, Renan Calheiros, Jáder Barbalho, Maluf, Romero Jucá, Kátia Abreu...
Como um governo de um partido de trabalhadores pode se dar tão bem com o patronato brasileiro e manter relações tensas com movimentos sociais, como indígenas e sem terra?
Agora estão presos companheiros meus na luta contra a ditadura, como Dirceu e Genoíno. Todos foram condenados por juízes nomeados, em sua maioria, pelo governo petista. Considero ilegal, injusta e despropositada a maneira como foram detidos na data da Proclamação da República. Fazer espetáculo com a dor alheia é tripudiar sobre a dignidade humana.
É o efeito tostines: no Brasil, o produtos são caros porque dependem do sistema rodoviário? Ou os produtos são caros porque os caminhões são abastecidos com petróleo? Temos 8 mil quilômetros de litoral, rios caudalosos navegáveis, e quase nenhuma navegação comercial. E quando se fala em ferrovia se pensa no trem-bala, capaz de transportar a elite no circuito Campinas-São Paulo-Rio e não em trilhos que cortem o país de ponta a ponta, facilitando o escoamento barato de nossa produção.
Sim, o atual governo é muito diferente do governo FHC. E muito semelhante. Prometeu investigar as privatizações - "herança maldita" - do governo anterior, e ficou o dito pelo não dito. E adotou o mesmo procedimento: privatização do Campo de Libra, que abriga petróleo, um produto estratégico; e de rodovias, portos e aeroportos, sem prestar atenção na queda do lucro da Vale após ser privatizada, do valor das ações da Petrobrás depois que 60% delas passaram às mãos do capital privado e na falência da Vasp. E não houve nenhuma iniciativa de reestatização, como fez Evo Morales na Bolívia.
Segundo o IPEA, órgão federal, a desigualdade social entre os mais ricos e os mais pobres no Brasil é de 175 vezes! Por que não são tomadas medidas estruturais para reduzi-la? Em 10 anos de governo petista, houve apenas uma reforma estrutural no Brasil, a da Previdência do funcionalismo público, que favorece o capital privado.
Enquanto o orçamento da República destinar mais de 40% do nosso dinheiro para pagar juros, amortização e rolagem da dívida pública, e menos de 8% para a Saúde e a Educação, o Brasil continuará sonhando em ser o país do futuro.
Frei Betto é escritor, autor de "O que a vida me ensinou" (Saraiva), entre outros livros.
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