O que é uma pessoa?
O Projeto de Direitos Não-Humanos, um grupo de defesa liderado por Steven M. Wise, entrou com pedido de habeas corpus em Nova York na semana passada em nome de quatro chimpanzés cativos: Tommy, cuidado por um único dono em Gloversville; dois na Universidade Stony Brook; e um no Santuário de Primatas em Niagara Falls.
Wise acredita que o uso histórico de processos de habeas corpus como uma ferramenta contra a escravidão humana oferece um modelo de como lutar pelos direitos legais para não-humanos.
As provas, argumenta Wise, mostram que os chimpanzés são suficientemente parecidos com os seres humanos a ponto de ter alguns direitos legais, não o direito ao voto ou à liberdade de religião – ele não tem como objetivo um verdadeiro planeta dos macacos – mas um direito limitado de liberdade corporal. Os processos pedem que os chimpanzés sejam libertados para ir para santuários onde teriam mais liberdade.
Legalmente, a estratégia é bastante incomum. Richard L. Cupp, professor de Direito na Universidade de Pepperdine na Califórnia, que é contra garantir direitos a animais não-humanos, descreveu a questão num e-mail como "algo bem pouco convencional". Ele disse: "os tribunais teriam que expandir dramaticamente a lei comum existente para que esses casos tenham sucesso."
Lori Marino, da Universidade de Emory, que estuda os golfinhos e outros cetáceos é diretora de ciência do Projeto de Direitos Não-Humanos, disse que "isso envolve muito mais do que esses quatro chimpanzés." Wise, disse ela, "vê isso como a chave que pode mudar muitas coisas. É potencialmente transformador."
Ela disse que não tem ilusões de que será fácil ganhar os direitos dos animais. "Não pode acontecer enquanto estivermos vivos", disse ela.
A ciência do comportamento é apenas uma parte da argumentação jurídica, embora seja crucial para a ideia central – de que os chimpanzés são autônomos em certa medida. A autonomia pode significar coisas diferentes, dependendo se o assunto é chimpanzés, teleguiados ou robôs aspiradores de pó, e se a linguagem utilizada é a da lei, da filosofia ou da inteligência artificial.
Gruen vê este como um termo repleto de problemas na filosofia, mas Marino diz que, para os fins do esforço jurídico, autonomia significa "uma capacidade muito básica de ser consciente de si mesmo, de suas circunstâncias e de seu futuro."
A ciência pode não ser decisiva para defender este argumento,como Gruen aponta, mas o que ela pode fazer é apoiar ou minar essa ideia de autonomia. "Se você fizer as perguntas certas, há respostas importantes que a ciência pode dar sobre a cognição e o comportamento animal", disse ela.
O pequeno chimpanzé senta ao lado de sua mãe adotiva -- uma cachorra da raça mastim--, que passou a tratá-lo com filho, desde que o animal foi renegado pela própria mãe em um zoológico da Rússia
Marino disse que a ciência poderia "contribuir com provas para os tipos de características que um juiz pode considerar como parte da autonomia".
Gruen, Marino e Wise fizeram apresentações numa conferência, Pessoalidade Além do Humano, na Universidade de Yale, no fim de semana. Eles também deram entrevistas relacionadas ao processo judicial durante a semana antes da conferência.
O tipo de ciência que sustenta a ideia de chimpanzés como seres autônomos também pode sustentar a ideia de que muitos outros animais cabem nessa descrição. Há depoimentos relacionados à capacidade cognitiva, uso de ferramentas, vida social e muitas outras capacidades dos chimpanzés, mas há questões sobre a pertinência de cada linha de provas.
"Isso é importante para ser filosoficamente uma pessoa – o uso de ferramentas?", perguntou Gruen.
As questões de autoconhecimento e de consciência de passado e futuro atingem o cerne de uma visão de senso comum sobre o que é ser uma pessoa. Os chimpanzés, elefantes e alguns cetáceos têm mostrado que podem se reconhecer num espelho.
Mas o projeto de direitos está reivindicando mais, dizendo que os chimpanzés "sabem quem foram ontem, hoje e amanhã", diz Marino, e "têm desejos e metas para o futuro".
Há muitas evidências de que os chimpanzés e outros animais agem pensando no futuro. Algumas aves escondem sementes para recuperar em tempos difíceis, por exemplo.
Um dos depoimentos foi de Matthias Osváth, da Universidade de Lund, na Suécia, que estuda a capacidade de raciocínio dos animais, particularmente de grandes símios e algumas aves. Ele cita uma série de estudos de chimpanzés que sustentam a ideia de que eles têm uma noção de futuro, inclusive recusando uma recompensa imediata para ganhar uma ferramenta que os levará a uma recompensa maior.
Plugs são colocados na pata do chimpanzé Dylan, que fez uma ultra-sonografia de coração no zoológico de Chester, em Liverpool, no Reino Unido. Os testes são parte de um programa internacional que estuda as condições cardiológicas dos macacos
Numa pesquisa bastante conhecida de Osvath, ele relatou sobre Santino, um chimpanzé de um zoológico na Suécia, que estocou e escondeu pedras que mais tarde atiraria nos visitantes humanos. Osvath argumentou que Santino tinha a capacidade de pensar em si mesmo no futuro usando as pedras que guardava.
A ciência não pode provar o que se passava na mente de Santino. Mas Marino disse que as provas acumuladas poderiam ser usadas para pedir a um juiz: "Se você olhar para todas as provas no total, que tipo de ser poderia produzir todas essas provas?"
Nem todos os defensores do bem-estar animal estão convencidos de que pedir direitos para os animais é o melhor caminho.
Gruen disse que tinha dúvidas sobre a abordagem dos direitos, filosófica e politicamente. "Na minha opinião faz mais sentido pensar sobre o que devemos aos animais." O progresso nessa frente em 2013, principalmente para os chimpanzés, surpreendeu e encantou muitos ativistas. Os Institutos Nacionais de Saúde estão aposentando a maioria de seus chimpanzés. E o Serviço de Pesca de Vida Selvagem dos EUA propôs mudanças que classificam todos os chimpanzés, mesmo os que vivem em laboratórios, como ameaçados de extinção, uma iniciativa que levantaria obstáculos para experimentos com chimpanzés de propriedade privada.
Um ponto a lembrar é que a classificação como pessoa não significa ser humano. Robert Sapolsky, primatologista e neurocientista da Universidade de Stanford, que não está ligado ao processo jurídico, disse: "acho que as provas certamente sugerem que os chimpanzés são autoconscientes e autônomos." Isso ainda deixa um grande hiato entre chimpanzés e humanos, disse ele. Os chimpanzés podem olhar para o futuro e guardar comida para mais tarde, ou planejar "como encurralar macacos que estão caçando". Os seres humanos, observou ele, podem pensar "nas consequências do aquecimento global para os netos dos seus netos, ou na eventualidade de o sol morrer, ou de eles próprios morrerem."
Será que esses dois seres são do mesmo tipo? Será que isso se relaciona com o status jurídico de pessoa? Cabe aos tribunais decidirem.
Tradução: Eloise de Vylder
Concordo em gênero número e grau , pois tem humanos que não entende de solidariedade como fez esta cadela com a pequena chipanzé .
ResponderExcluir