publicado em 5 de agosto de 2014 às 1:32
Duda antecipa Aécio: O arrocho é benéfico para os “colaboradores”
Chamando os funcionários de “colegas”, presidente da RBS anuncia demissões e defende crescimento da empresa
por CR, de Porto Alegre
Passando os olhos pela carta enviada pelo Grupo RBS aos jornalistas da empresa, no fim da tarde desta segunda-feira, chama a atenção a intimidade da assinatura do e-mail: Duda. Trata-se de Eduardo Sirotsky Melzer, presidente da empresa, que escreve logo após o anúncio das 130 demissões que o grupo deve fazer esta semana. Ele – o patrão – também chama os funcionários de colegas, prática recorrente da mídia nativa, como seguidamente alerta Mino Carta.
Mas quem pensar que a intimidade do tratamento tenta estabelecer uma certa empatia com os funcionários vai se enganar. A leitura do longo texto revela que o objetivo da empresa é bem outro. E não tem nada a ver com qualidade da informação ou algum resquício de jornalismo. Não se fala em comunicação e conteúdo nem pró-forma.
A carta prega o DESAPEGO de coisas que não fazem a empresa crescer, trata o tema das demissões com frieza, como se fosse uma ação cotidiana qualquer, defende enfaticamente a meritocracia como método, tenta convencer que os cortes são pelo bem dos próprios funcionários e traz como únicas pautas positivas os negócios da empresa.
Não se sabe quais jornalistas serão demitidos, e até quarta todo o grupo vai ter que dormir com a incerteza. Mas o mais dramático é a indiferença do grupo com a situação. Em vez de lidar com as questões pessoais dos profissionais que vão sofrer com o corte e de mostrar alguma sensibilidade e humanismo, o e-mail foca no desempenho da empresa, buscando, em um momento como esse, apenas o engajamento dos jornalistas com a situação do grupo.
Pouco importa que colegas estejam indo pra rua, em um mercado em que não há muitas alternativas viáveis, o importante é que agora todos podem comprar vinhos e cervejas das outras empresas do grupo. Que, aliás, já estão chegando a outros países.
É até difícil escolher quais trechos destacar para comentar essa carta, mas fico com o extremo desrespeito não só ao jornalismo, mas principalmente às pessoas que fazem com que ele aconteça.
Acrescento ainda cinco fatos da trajetória recente da Zero Hora que podem contribuir para a interpretação da carta:
1) Agoniza prejuizo de R$ 60 milhões com o grupo RBS em 2013
2) Perde circulação de 4% no primeiro trimestre de 2014
3) É condenada em R$ 300.000,00 por uso de informação confidencial. A Justiça considerou a prática crime de concorrência desleal
4) É condenada em R$ 300.000,00 por submeter trabalhadores a condições humilhantes
5) Anuncia a demissão de mais de uma centena de trabalhadores na próxima quarta-feira (06/08) e deixa o clima tenso em toda a redação
O e-mail:
Caros colegas,
Escrevo para reforçar a mensagem que compartilhei com vocês nesta segunda-feira, em videoconferência, e para detalhar minha visão em relação ao futuro da nossa empresa, pois quero manter entre nós um ambiente de clareza e transparência.
As transformações radicais e a velocidade impressionante pelas quais a indústria da comunicação tem passado exigem energia e dedicação para entender o momento e também coragem para promover os ajustes que precisam ser feitos para continuarmos crescendo.
Mudar não é opcional. É vital para o nosso projeto empresarial.
O cenário atual apresenta realidades paradoxais. Por um lado, os modelos tradicionais estão altamente desafiados. Por outro, o avanço tecnológico e a forma de consumir mídia nunca geraram tantas oportunidades e tanta abertura para a inovação como nos dias de hoje. Aquelas empresas que têm a coragem de se posicionar no mundo novo sairão fortalecidas.
Nesse sentido, acredito muito na relevância dos nossos produtos, no jornalismo de qualidade, na comunicação e no desejo cada vez maior por conteúdo de entretenimento diferenciado. As necessidades continuarão existindo. O que muda é a forma como serão atendidas. Se queremos continuar crescendo temos de nos reinventar imediatamente, investindo em atividades e negócios que geram resultados positivos e deixando de fazer o que não agrega para nossa empresa e para o mercado.
Quero convidar todos vocês a romper paradigmas, quebrar barreiras e colocar a RBS cada vez mais no grupo das empresas vencedoras, daquelas empresas que constroem oportunidades de mercado para se posicionar e conquistar a liderança.
Teremos uma semana intensa pela frente, pois na quarta-feira faremos cerca de 130 demissões, de um universo de 6 mil pessoas, com o objetivo de buscar produtividade e maior eficiência. São cortes que precisam acontecer, principalmente na operação dos jornais. Não estou de forma alguma insensível ao impacto que demissões geram na vida das pessoas e da própria empresa, porém acredito que tanto os profissionais quanto as empresas precisam repensar o modo como atuam.
O Grupo RBS emprega milhares de pessoas. Não promover mudanças seria uma irresponsabilidade com estes profissionais, um erro com todos vocês, além de um descaso com nossos clientes e com o nosso projeto de futuro, que já está em andamento.
É importante destacar que a RBS não passa por uma crise financeira. Ao contrário. Estamos investindo e redesenhando a nossa operação, buscando velocidade e desprendimento que são vitais para a preservação do nosso projeto empresarial.
Fizemos, nos últimos 12 meses, uma análise muito detalhada de todos os nossos negócios e atividades. Eu me envolvi pessoalmente nesse processo. A partir do que vimos, fizemos investimentos importantes que ajudam a deixar clara a nossa crença no negócio.
Dobramos as equipes dedicadas ao digital, tanto nas redações quanto no Tecnopuc, e triplicamos os investimentos nesta área. Até o fim do ano, só no Tecnopuc, em Porto Alegre, teremos quase 100 profissionais trabalhando exclusivamente na criação de soluções digitais para nossos produtos, em especial para os jornais.
Os 50 anos de Zero Hora marcaram o início de uma grande renovação do jornal, que agora começa a ser replicada em outros veículos. Inovamos na organização do conteúdo e criamos novos espaços para fortalecer o vínculo com o leitor. A partir de amanhã, Diário Catarinense, A Notícia e Jornal de Santa Catarina entram também nessa nova fase.
Na TV, teremos nesse ano as 18 emissoras com equipamentos totalmente renovados e tecnologia de última geração, cobrindo com sinal digital o Rio Grande do Sul e Santa Catarina antes do prazo determinado pelo governo federal.
Em rádio, nosso alcance cresceu com o lançamento da Gaúcha Serra, da Gaúcha Santa Maria e da Gaúcha Zona Sul. O rádio também tem feito um excelente trabalho na internet.
Na e.Bricks, nossa empresa digital criada há três anos em São Paulo, lançamos o Early Stage, um fundo para impulsionar ideias em tecnologia – um negócio contemporâneo que atrai empreendedores em busca de parceria para crescer. O fundo deve chegar ao final do ano com 16 empresas no portfólio.
Também na e.Bricks, ampliamos a operação da Wine, que já é a maior empresa de vinhos online do mundo, tanto que estamos agora preparando sua entrada no mercado internacional. E muitos de vocês que já são sócios da Wine agora poderão também ser da Have a Nice Beer, o maior clube online de cervejas da América Latina, que está vindo para o Grupo.
Gostaria ainda de citar dois exemplos de inovação e empreendedorismo que marcam a nossa gestão. O primeiro é o HypermindR, um centro de pesquisa no Rio de Janeiro, que vai desenvolver softwares para medir hábitos do consumidor. E o segundo diz respeito ao nosso modelo de gestão de pessoas, baseado na meritocracia. As ferramentas que desenvolvemos para dar mais transparência aos planos de carreira tornaram-se benchmark para muitas empresas e agora serão disponibilizadas ao mercado através da Appus, um negócio que nasceu aqui, dentro do RH.
Temos apoio dos acionistas nas nossas decisões e temos também pessoas qualificadas e comprometidas, recursos financeiros, solidez de caixa, coragem, energia e desapego para deixar de fazer coisas que não agregam e investir no que pode nos fazer crescer.
Na próxima sexta-feira, vou apresentar aos líderes da empresa a Carta Diretriz, um documento que reforça na RBS princípios como simplicidade, produtividade e eficiência, qualidade, inovação, crescimento sustentável e meritocracia. Tenho dito que somos uma empresa em beta. Isso significa que nosso processo de transformação será contínuo e permanente.
Como presidente, tenho compromisso com os acionistas, com a história da nossa empresa, com o nosso público e os nossos clientes.
Estou motivado, principalmente, pela grande confiança que tenho no trabalho e no comprometimento de cada um de vocês.
Vamos em frente!
Duda
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