quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

E NÓS, OS ÁRABES.



A imigração árabe para o Brasil e para o Espírito Santo é diferente de todas as demais imigrações. O ponto que diverge por completo é a decisão de partir da terra de nascimento. Enquanto os imigrantes vindos das terras da Europa, em quase a sua totalidade, vieram atraídos e de certa maneira, protegidos pela nova Pátria, os árabes- falo dos libaneses, sírios e alguns poucos palestinos- vieram isolados ou na busca de um parente que havia chegado um pouco antes.

A fundamentação que levou milhares de patrícios árabes a deixarem suas vilas tem o peso maior nas questões políticas, econômicas e mais recentemente determinada pelo confronto da guerra religiosa. O meu avô chegou na década de 80 do século XIX, tangido pela dominação do Império Turco Otomano sobre sua região, Zgharta, no norte do Líbano. Era maronita, que é o ramo cristão católico no Líbano. O laço familiar e de solidariedade no grupo de imigrantes sempre falou mais alto, daí o trato carinhoso de um chamar o outro de “brimo” ou “brima”.

A chegada dos nossos antepassados era em forma de conta-gotas, que ampliava na medida direta dos conflitos no Oiriente ou na ascensão social, econômica e política de um imigrante nas terras brasileiras. Assim foi e ainda tem sido.

A presença e a marca dos árabes aqui no Espírito Santo e em todo Brasil é significativa, passando pela culinária, pelo envolvimento comercial e pela integração com a comunidade da nova Pátria. Uma gente de boa conversa.

Outro ponto que diverge a imigração dos nossos patrícios dos demais imigrantes é a localização inicial. Com raras exceções eles foram pra o meio rural, situação diversa da quase totalidade dos imigrantes europeus. A preferência pelos centros urbanos e o exercício da venda de porta em porta são marcas registradas. Meu avô, Francisco Marolino Mansur, Chico Turco, que veio de Zgahrta em 1883- vila de Aalma- mascateou pelo Sul do Estado, o que também fez meu pai. É o sangue fenício no exercício da vida e da sobrevivência.

Outro exemplo é Pedro José Aboudib, também de Zgharta, que aqui chegou no ano de 1889, com apenas 16 anos de idade, depois de ter ficado algumas semanas no Rio de Janeiro. Assim que estabilizou a sua vida trouxe seu irmão. O laço de sangue falando de dentro da alma do imigrante. São 120 anos de História.

Aboudib naturalizou-se e participou ativamente da vida social, política e econômica capixaba. Foi comerciante de café, areia monazítica e montou uma usina de açúcar e cachaça e projetou uma linha férrea que ligaria o empreendimento de Jabaquara até Alfredo Chaves. A trajetória dele está registrada num depoimento de 1945, depois registrado num boletim do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo.

A nossa colônia deve ao Espírito Santo relatos de sua trajetória pela terra capixaba. Tenho certeza de que as famílias de origem libanesa, síria e palestina possuem histórias que merecem ser escritas e divulgadas, como fez Pedro José Aboudib. Em tempo: o texto original de Aboudib está no site estacaocapixaba.com.br.

E nós, os árabes, temos de fazer alguma coisa para a garra, a competência, a solidariedade e a determinação dos nossos antepassados não fiquem apenas nas  nossas cabeças. É preciso registrar e espalhar a história.

Texto publicado em A Gazeta, 16-01-2009

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