terça-feira, 31 de julho de 2012

Muito mais grave que Belo Monte


Parque Nacional da Amazônia, cartão postal da floresta e um dos oito que podem ser atingidos: quase 1 milhão de hectares, 99% dos quais de floresta densa
Hidrelétrica projetada para Rio Tapajós, no Pará, pode ser a quarta maior do país – e abrir clareira do tamanho de São Paulo numa das áreas de maior biodiversidade do planeta
Por Antonio Martins
São Luiz do Tapajós: os movimentos que lutam por uma uma nova política energética e pelas causas ambientais no Brasil precisam ficar atentos a este nome. É como está sendo chamada a possível usina hidrelétrica a ser instalada no Pará, em meio a um santuário amazônico, até agora intocado. Projetada para produzir 6 mil megawats (um quarto de Itaipu), a usina é peça importante do projeto estratégico da Eletrobrás – que quer explorar intensamente, nas próximas décadas, o potencial energético da Região Norte.
Uma rica reportagem de André Borges, publicada no Valor de 25/7, ajuda a compreender as dimensões e riscos de São Luiz do Tapajós. A usina chama atenção pelo ponto em que poderá ser construída: numa área cerca de 700 quilômetros a oeste de Belém e em meio a doze unidades de conservação que formam o Complexo do Tapajós, considerado por alguns o maior mosaico de biodiversidade do planeta.
Ao contrário da área semiocupada em que será erguida a barragem de Belo Monte, o ponto onde se quer instalar São Luiz do Tapajós é virgem. Não há assentamento humano. A cidade mais próxima é Itaituba (110 mil habitantes), 70 quilômetros rio abaixo. Mas a inundação será maior. Em Belo Monte, devido às pressões sociais e a mudanças na tecnologia de geração hidrelétrica, o lago projetado terá 516 km². Gerará 11 mil Mw (embora não possa funcionar com tal potência durante todo o ano). Já o novo projeto ocupará uma área com o dobro do tamanho (1368 km², quase tanto quando o município de São Paulo) e gerará pouco mais de metade da energia.
A decisão de construir não está 100% tomada. Para viabilizar o projeto, a presidente Dilma deu um primeiro passo. Baixou, em janeiro, Medida Provisória (já transformada em lei) reduzindo a área de oito das doze unidades de preservação que formam o Complexo do Tapajós. O processo é chamado, no jargão técnico, de “desafetação”. Houve compensações apenas parciais: as unidades ganharam novos territórios – porém, sem a mesma biodiversidade, segundo biólogos ouvidos por André Borges. Ainda não há licenciamento ambiental para São Luiz do Tapajós, o que pode favorecer a luta em defesa da floresta.
No Complexo de Tapajós já foram catalogadas 390 espécies de aves e 400 de peixes. Vivem animais em extinção, como a onça-pintada e onça-vermelha. Maria Lúcia Carvalho, chefe do Parque Nacional da Amazônia (uma das doze unidades) e pesquisadora do Instituto Chico Mendes, afirma que a construção da hidrelétrica traria grandes riscos para os ecossistemas. Também lamenta o caráter abrupto da decisão de iniciar o levantamento: “Estávamos trabalhando a mil por hora no plano de manejo do parque. De repente, fomos avisados de que parte dele simplesmente iria ser desafetada [desprotegida]. Recebemos este banho de água gelada, o trabalho foi perdido”. Em 30/7, André Borges informou que, além da diretora, um grupo de técnicos prepara manifesto contra a desafetação.
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