Dois anos depois que milícias locais derrubaram o ditador líbio Muammar Gaddafi, muitos desses mesmos combatentes fizeram com que a importante indústria petrolífera da Líbia paralisasse suas operações, em um desafio para o mais recente de uma série de governos provisórios do país.
Clifford Krauss
Clifford Krauss

Manifestante segura cartaz comparando Hitler ao general Abdel Fattah al-Sisi durante protesto na praça Algeria, em Tripoli, Líbia, nesta sexta-feira (16). A manifestação foi em apoio à Irmandade Muçulmana e ao presidente egípcio deposto, Mohamed Mursi
Protestos e greves em vários dos grandes terminais de exportação e campos de petróleo da Líbia diminuíram a produção diária da commodity no país, fazendo-a chegar a um décimo da capacidade líbia nos últimos dias, prejudicando a economia nacional e reduzindo a oferta mundial de petróleo em um momento em que a agitação política tem se espalhado pelo Oriente Médio.
O primeiro-ministro da Líbia, Ali Zeidan, anunciou na quarta-feira passada que seu governo emitiu mandados de prisão para os líderes da greve, provocando um confronto potencialmente perigoso.
"Eu não vou permitir que ninguém transforme a Líbia e seus recursos em reféns desses grupos por muito tempo", disse Zeidan a repórteres na capital da Líbia, Trípoli, ao anunciar os mandados de prisão. Mas analistas políticos e especialistas do setor de petróleo duvidam que Zeidan seja capaz de cumprir sua ameaça, uma vez que os militares e as forças policiais nacionais permanecem, em grande parte, impotentes.
A crise começou no mês passado, quando grupos armados invadiram os principais terminais de exportação de petróleo do país, alegando que as vendas realizadas pela companhia nacional de petróleo estariam envolvidas em corrupção. Esses grupos também exigiram autonomia para a região do leste da Líbia, onde a rebelião contra o governo de Gaddafi se mostrou mais forte. Desde então, os protestos migraram para o oeste do país e têm sido levados a cabo principalmente por guardas de vários oleodutos e campos de petróleo, que visam obter aumentos salariais do governo.
Enquanto os protestos na região oeste têm se espalhado, as concessionárias de serviços públicos locais foram obrigadas a reduzir a geração de energia elétrica, o que tem provocado apagões. Os protestos no lado oeste do país são apoiados pela milícia Zintan, fortemente armada e que está baseada em uma cidade montanhosa da região. Há muito tempo que essa milícia tem se esforçado para ganhar influência sobre o governo e sobre as nascentes forças de segurança do país.
O Parlamento líbio aprovou, na semana passada, um aumento salarial de 20% para os funcionários públicos, que também beneficiará os guardas que atuam no setor petrolífero. A Casa também nomeou um comitê anti-crise para ir de aldeia em aldeia e negociar com os conselhos governamentais locais aliados das milícias.
David L. Goldwyn, coordenador do Departamento de Estado para assuntos energéticos internacionais durante o primeiro governo de Barack Obama, classificou os esforços do governo líbio como "uma estratégia de luta e negociações".
"O desafio para Zeidan", disse Goldwyn, "é que será difícil reunir as forças necessárias para fazer essas detenções, pois algumas das milícias com as quais ele poderia contar se aliaram aos grevistas".
Nos últimos anos, o petróleo, que é o sustentáculo da economia da Líbia, respondeu por 95% das receitas de exportação do país e por 75% das receitas do governo. O governo líbio estima que atualmente o país está perdendo cerca de US$ 130 milhões por dia em receitas que seriam obtidas com as vendas de petróleo.
Embora os especialistas digam que o governo líbio deva ter seis meses de reservas para manter o funcionamento do aparelho do Estado, executivos internacionais do setor de petróleo têm observado atentamente a evolução da situação para determinar se Trípoli será capaz de recuperar o controle sobre o país e garantir a segurança para os investimentos estrangeiros.
"A Líbia está parando", disse J. Badr Jafar, presidente da Crescent Petroleum, empresa de petróleo e gás sediada nos Emirados Árabes Unidos, que conversou com o governo líbio sobre a realização de investimentos no país. "Assim como aconteceu com a maioria dos países da Primavera Árabe, o otimismo na Líbia teve curta duração".
A queda na produção de petróleo da Líbia --que, em circunstâncias normais, representaria cerca de 2% da oferta mundial-- ocorre em um momento ruim. A agitação na Síria e no Egito ameaça se espalhar de forma mais ampla para outras regiões produtoras de petróleo do Oriente Médio, especialmente para o Iraque. Ataques persistentes contra um grande oleoduto localizado no norte do Iraque já interromperam a produção de 150 mil barris de petróleo por dia nas últimas semanas.
Atualmente, poucas empresas estrangeiras mantêm mais do que poucas e reduzidas equipes de expatriados trabalhando nos campos de petróleo da Líbia devido ao perigo que ronda esses locais. A OMV, empresa petrolífera austríaca que é uma grande produtora na Líbia, anunciou esta semana que suspenderia sua produção.
"A situação está muito ruim e não há segurança", disse Dragan Vuckovic, presidente da Mediterranean International, empresa de serviços petrolíferos que se retirou da Líbia durante o conflito, há dois anos, e ainda não retornou. "Cada aldeia tem uma milícia, e não há governo central".
Jafar, executivo do setor petrolífero dos Emirados Árabes Unidos, disse que ainda gostaria de investir na Líbia. "Tudo depende da frágil situação da segurança", disse ele.
Tradutor: Cláudia Gonçalves
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