Estado judeu proíbe os camponeses palestinos até mesmo de aproveitar a água da chuva
José Coutinho Júnior
José Coutinho Júnior
Em todos os locais da Palestina é possível ver os efeitos da falta de água. Nas vilas agrárias, o controle israelense das fontes naturais impede os camponeses de aproveitar a água para produzir; nas cidades, todas as casas tem tanques pretos grandes nos tetos, para armazenar a pouca água que se tem, e os campos de refugiados sofrem por ter pouca ou nenhuma água, muitas vezes por conta do governo da Autoridade Palestina não liberá-la pelo fato dos refugiados não pagarem taxas.
A questão da água sempre foi estratégica para Israel: no início da ocupação, em 1948, as áreas mais férteis da Palestina, geograficamente próximas a lagos e rios, foram tomadas e os israelenses criaram colônias. O Rio Jordão, que costumava ser utilizado pelos camponeses palestinos para irrigar sua produção, hoje tem 95% de sua área represada por Israel. Dados da Anistia Internacional de 2009 apontam que uma pessoa israelense consome 300 litros de água por dia, enquanto os palestinos consomem no máximo 70 litros, o que significa que 450 mil colonos utilizam a mesma quantia de água que a população inteira da Palestina; em algumas comunidades rurais, os camponeses sobrevivem com menos de 20 litros diários, e cerca de 200 mil camponeses não tem acesso à água corrente, além de o exército israelense proibir o uso de água da chuva.
Além do controle político pelo domínio da água, Israel se beneficia economicamente, vendendo a água furtada dos palestinos de volta para eles. Segundo Aysar Alsaifi , refugiado do campo de Deheishe, existem três grandes lençóis freáticos na Cisjordânia, mas os palestinos não podem utilizá-los pois Israel os controla. “Essa água é vendida para a Autoridade Palestina, que a distribui para a população. Aqui no campo de refugiados, apenas uma semana por mês abrem a torneira para pegarmos água”, conta.
Terra santa, solo sírio
No entanto, não são só os palestinos que sofrem com o controle da água por Israel. As Colinas de Golã são vilas romanas com mais de 2 mil anos. Os territórios pertencem à Síria, mas foram ocupados por Israel em 1967 depois da guerra dos seis dias. Cinco distritos israelenses existem hoje nas colinas, e 10 mil remanescentes sírios vivem sob ocupação. A região é estratégica do ponto de vista militar, por fazer fronteira com a Síria e com a Jordânia: uma cerca de mais de 100 quilômetros de extensão marca as fronteiras do território ocupado pelos israelenses.
Essa cerca separou muitos camponeses de suas terras e de seus parentes. Muitas famílias se encontravam na cerca para poder se ver, proibidos de passar para o outro lado. Ocorrem aí inúmeros conflitos e mortes entre a população local e o exército de Israel.
Mas Golã também é importante por sua abundância em água. Um terço da água consumida em Israel é extraída das colinas. Os remanescentes sírios que ainda vivem lá precisam de permissão para construir reservatórios de água, ou até mesmo para aproveitar a água da chuva. A justificativa israelense para isso é que “a água vem do céu à terra sagrada de Israel”.
Muitos camponeses, majoritariamente produtores de maçãs, prestaram queixas na Justiça contra isso, mas foram condenados pela lei israelense a pagar multas por construir reservatórios sem permissão.
Além de relevante economicamente, a agricultura em Golã exerce o papel político de impedir um avanço ainda maior nas terras sírias. “Aprendemos uma lição ao ver a ocupação israelense na Palestina: terra na qual não se produz, Israel ocupa. Por isso, até mesmo em áreas de montanha e rochosas, desenvolvemos algum tipo de produção. Para conseguir produzir nesse tipo de terra, pegamos o solo úmido de poços para forrar as pedras e plantar”, afirma Fouzi Aber Saler, camponês de Golã.
Vários lagos, que são uma grande fonte de água, onde confluem água de vales e montanhas, foram confiscados por Israel, e empresas do país exploram e comercializam esta água. A única alternativa para os moradores locais foi criar uma cooperativa de irrigação, distribuição e armazenamento de água, responsável por comprar água das empresas israelenses e distribuir aos camponeses a um preço menor.
Além das dificuldades de acesso, os sírios são obrigados por Israel a pagar mais caro pela água. Perto das Colinas há uma colônia israelense com alto padrão de vida, onde moram 40 famílias que, segundo os moradores das Colinas, consomem a mesma quantia de água que toda a vila de 10 mil pessoas. Os moradores dessa colônia pagam 25 centavos para cada shekel (moeda israelense), preço que os sírios pagam pela água.
Para Sobhi Sgier, o controle da água faz parte de “uma política racista israelense, que tem como objetivo exercer pressão para que os camponeses vendam suas terras. Ficar nas nossas terras produzindo é uma forma de manter a tradição milenar de lidar com a terra viva. Tradição essa que quero passar para os meus filhos, pois é ela que mantém a unidade do nosso povo, inclusive na nossa forma de enxergar o mundo e de nos comunicar. O dia em que vendermos nossas terras, perdemos a batalha”.
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