quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Sírios e libaneses em Rio Preto, SÃO PAULO


São José do Rio Preto, 29 de outubro de 2006 
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1947 Casa Moysés - M.M.Haddad & Cia

Nilce Lodi

O mundo árabe integra ao todo 21 países. Constituído de povos diferentes, com organizações políticas próprias, compartilham de fundamentos comuns: a língua ou dialetos derivados do árabe, os traços culturais e a religião. O domínio otomano nas regiões de origem, até o final da Primeira Guerra Mundial, determina o registro de “turco” nos passaportes e por isso passam assim a serem designados. A partir de 1920 são registrados como libaneses e de 1922 em diante, como sírios. A grande diferença que caracteriza a imigração árabe das demais, é o fato de ter sido espontânea, sem nenhuma participação direta do governo ou subsídio para a viagem. Sírios e libaneses começam a chegar ao Brasil ainda nos anos setenta do século 19. Fogem dos conflitos políticos decorrentes do domínio do Império Otomano, na região do Oriente Médio. A partir de 1895, o fluxo imigratório se adensa e, a partir de 1903, cresce ininterruptamente até às vésperas da Primeira Guerra.

O ano de 1913 registra a chegada máxima de 11.101 imigrantes e nos anos vinte, o movimento é revitalizado com um contingente ao redor de cinco mil entradas anuais. A maioria deles fixa-se nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Uma parcela deles fixa-se no Norte do país, nos estados do Pará, Amazonas e no então Território do Acre. De 1920 a 1940, a imigração árabe ocupa o sexto lugar entre as etnias, contribuindo com cerca de quatro por cento do total da imigração vinda a São Paulo nesse período, o que corresponde a quase o dobro de sua participação relativa no país como um todo. Em São Paulo, portugueses, espanhóis e italianos, somados, perfazem cerca de sessenta por cento de todo o contingente imigratório no período. As estatísticas a seu respeito, embora imprecisas, nos dão informações interessantes.

O ingresso de imigrantes árabes no Brasil em 1920, de 50.337, salta em 1940 para 58.970. O número de imigrantes árabes no Estado de São Paulo, que em 1920 era de 19.285, passa em 1940 para 24.084. O censo de 1920 flagra uma concentração importante deles, na região servida pela estrada de ferro Araraquarense. Temos aí, uma das regiões do estado que mais se desenvolveu nas décadas seguintes, beneficiada pela marcha do café em direção ao Oeste Paulista. As cidades de São José do Rio Preto, Barretos, Olímpia, Catanduva, Taquaritinga e Monte Alto, todas na mesma região, abrigam um número bastante expressivo de sírios e libaneses no interior de São Paulo. Conforme nos mostra o quadro abaixo, podemos afirmar que a região de Rio Preto, recebeu o maior número de imigrantes sírios-libaneses, na década de 20, sendo superada apenas pela Capital do Estado.


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Chaim José Elias 

Perfil dos imigrantes
Em geral são solteiros de 16 a 23 anos, vindos com o objetivo de ganhar a vida e retornar. Enviam dinheiro para a terra natal, onde é aplicado pela família. Embora em seus países de origem estivessem ligados à estrutura rural, quando aqui chegam, descartam a lavoura e escolhem traçar uma trajetória nitidamente urbana. A miséria da população rural e o sistema de compra, vinculado ao proprietário da terra, repelem esses imigrantes do trabalho no campo.

Comércio urbano
Nessa época, já existiam mascates portugueses e italianos. Em poucos anos, no entanto, a mascateação se tornou uma marca registrada da imigração árabe e o mascate é ligado à figura do pequeno comerciante. Eles contam com uma grande vantagem, trabalham para patrícios já estabelecidos em lojas, que lhes adiantam as mercadorias a serem vendidas. Rredefinem as condições de lucro; introduzem as práticas da alta rotatividade e grande quantidade de mercadorias, e utilizam-se das promoções e das liquidações. Estas inovações revelam o traço definidor da versão árabe da mascateação e do comércio popular, pois seu o interesse é conquistar o consumidor.

Os árabes derrubam a concorrência com sua sutil visão de lucro e com a venda a prazo, baseada no respeito à palavra do consumidor, que compromete-se a pagar, sem promissórias. A palavra do consumidor, basta. A confiança depositada na clientela, que compra a prazo é um dos fatores de seu sucesso, pois os moradores das cidades e os colonos, rapidamente abandonam o compromisso de comprar nos armazéns dos proprietários das fazendas.Os mascates percorrem, com suas caixas enormes, as cidades do interior e as fazendas, em busca de fregueses, até reunir capital para contratar carregadores ou comprar carroças.

Comércio popular
Com o tempo os imigrantes árabes percebem que não retornarão à cidade de origem. Mandam buscar, na terra natal, as noivas que lá deixaram ou se casam com patrícias aqui estabelecidas. Trazem os parentes para ajudarem no trabalho. Seu próximo objetivo é o estabelecimento de uma casa comercial própria, investindo nela seus lucros. Localizada próxima à linha de trem, nela trabalham e vivem, com a família, nos fundos ou no segundo andar.A história da rua General Glicério, no centro de Rio Preto, é um pouco a história dos árabes e seus descendentes. No início da vila, a rua era denominada rua da Fartura, mas a população lhe dá um apelido, “rua Jerusalém”. Nela se instalam lojas de tecidos à varejo e armarinhos, empresas maiores, para a venda dos mais variados produtos, do chapéu à casimira, do querosene aos pneus, das panelas aos perfumes.

Desta nova etapa destacamos alguns, dentre os inúmeros nomes de famílias: Chaim José Elias, Haddad, Homsi, Scaff, Suriani, Madi, Mahfouz, Fauaz, Hawilla, Tarraf, Rahad, Raduan, Gorayeb, Buchala, Mitaini, Mussi, Muanis, Naffah, Younes, Kfoury, Bassitt, Cury, Chalela, Azem, Aidar, Daud, Barcha, Arif, Fahad, Taufic,Calil, Chacra, Buzaidi, e muitos mais. Sírios e libaneses e seus descendentes, que já dividiram essa rua com italianos, portugueses e armênios, atualmente o fazem também, com coreanos e chineses. O contínuo progresso da indústria nacional desvia a atenção dos ricos imigrantes para o comércio atacadista e a indústria. Eles dominam toda a região com lojas a varejo e no atacado, investem nas indústrias, adquirem propriedades urbanas e rurais, participam de todos os setores, especialmente, da política.
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1947 Indústrias Reunidas Medlij-Homsi SA 

Interação dos costumes árabes
Em um processo lento, os imigrantes árabes, imprimem sua marca, contribuem para a diversidade cultural da região que assimila seus conhecimentos, valores, tradições e costumes. Regra geral, no início, os primeiros imigrantes conversam em árabe, em casa, no comércio, nas reuniões com os patrícios, nas festas animadas com a música árabe. Para manter o idioma e costumes, organizam escolas e clubes recreativos, como o Jovem Sírio e o Monte Líbano. A comunidade árabe em São José do Rio Preto, a partir da década de 40, como em todo o Brasil, mantém cultura e religião, mas esquece o idioma, em função da própria integração entre eles e os brasileiros.

Estima-se que, em torno de cinco mil palavras originárias do idioma árabe, fazem parte do vocabulário brasileiro. Muitas palavras que começam com al, como alface e algarismo, são de origem árabe. E outras como: almanaque, alfaiate, bazar, mascate, almofada, alcaide, arroz, açúcar e alfombra. Outras trocas culturais se firmam na gastronomia, nos casamentos e na religião. A cultura e os costumes árabes se misturam até aos pratos da mesa brasileira, com o quibe e a esfirra. O entrosamento dos sírios-libaneses à cultura brasileira fica evidente na figura do Rei Momo mais popular dos carnavais rio-pretenses. Aziz Mitaini, conhecido por “Michelin”, durante décadas presidiu e animou todas as manifestações carnavalescas locais com muita alegria e descontração.
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Interior da Catedral de São jorge 

Crenças religiosas
Na década de 30, constróem a Igreja Católica, Ortodoxa de Antioquina, Catedral São Jorge, uma das poucas existentes em cidades brasileiras. Desde 30 de março de 2003 foi fundada em Rio Preto por D. Mahfouz, arcebispo maronita de São Paulo, com o beneplácito do bisoi diocesano local, D. Orani Tempesta, a Paróquia “Nossa Senhora do Líbano”, que provisoriamente está instalada na igreja da Paróquia de São Benedito, na Vila Ercília. As celebrações, com a consagração em aramaico, a língua de Jesus, acontecem no último domingo de cada mês às 19h30, e todas as segundas-feiras, na capela do cemitério da vila Ercília, às 16 horas.

Libaneses maronitas (cristãos/católicos), que possuem ritos e liturgias próprias e originais, se empenham na preservação de suas tradições religiosas Estimativas indicam que hoje, os árabes, seus filhos e netos somam 12 milhões de pessoas no Brasil. Muito difícil indicar hoje, quantos fazem parte da população de nossa região. Eles estão no comércio, na indústria, nas profissões liberais, no setor de serviços, na política , na saúde e nos meios de comucação, ocupando alguns, o top do ranking de seus setores e profissões.

Mobilidade social e educacional
Escalando os degraus da mobilidade social, seus descendentes diversificam na escolha de suas atividades. Uns continuam com os negócios da família. Outros, são atraídos pelos cursos universitários, em especial pela medicina, engenharia e direito, indo estudar na Capital. Todos marcam presença nas atividades políticas e na organização de entidades. São eleitos vereadores, prefeitos e deputados. E´ importante lembrar que na criação, instalação e desenvolvimento das instituições de ensino superior na cidade, destaca-se o nome de um descendente de imigrante árabe, o prof. Daud Jorge Simão.

Tendo vivido as dificuldades de poder freqüentar uma universidade na capital, apresentou projeto para a criação de uma universidade municipal. Considerada então uma idéia utópica, conquista a aprovação da Câmara e do Executivo Municipal. Assim, a partir de 1957, São José do Rio Preto se torna um pólo do ensino superior do norte ocidental paulista, atendendo aos estudantes vindos de toda região e dos estados de Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás. A criação da Faculdade Regional de Medicina (Farme) na cidade expande as possibilidades de estudo universitário.

2 comentários:

  1. Obrigada por compartilhar! Morei 26 anos em Rio Preto e sempre quis saber a história dos Sírios-Libaneses.

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  2. Minha Mae Salime Mansur Ali nasceu sao José rio preto 1939

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