quinta-feira, 15 de março de 2012

UMA ESCOLA DIFERENTE - ESCOLA FAMÍLIA AGRÍCOLA



Um esquema diferente de educação vem funcionando no interior do Espírito Santo, desde 1968, é a Escola Família Agrícola, que tem a característica da alternância. Esta situação prevê que o aluno fique 15 dias na escola e um igual número de dias passe na sua casa, desenvolvendo projetos baseados no aprendizado. Enquanto uma turma vai para casa, uma outra chega a escola.
Para o padre |Humberto Pietrogrande, este esquema de ensino tem 11ª promoção do homem do campo, sobretudo, do pequeno e do mais abandonado. A Escola Família Agrícola visa criar condições para este homem no campo, para que ele se insira dentro da sua própria realidade e possa crescer. Vemos que não poderá ser um crescimento isolado, tem de ser com a comunidade e com os seus componentes.”.
Lembra o jesuíta padre Humberto que ‘’quando cheguei ao Espírito Santo, entre 1965 e 1966, o que mais me impressionou foi o fato de quando visitava as comunidades do interior, a juventude. Via que a juventude era um capital imenso.  Era somente olhar para a rapaziada e percebia quanta inteligência, quanta carga humana ali dentro. Nós perguntávamos: o que você vai fazer? A resposta era sempre a mesma: não sei. Era esta pergunta e resposta que nos angustiava. Naquele tempo o interior não tinha nada, ou poucas escolas perdida.
A chegada do padre Humberto foi em Anchieta e ele logo em seguida viajou para Itália,  onde tomou conhecimento da Escola Família Agrícola. Segundo ele, “nós pensávamos que sendo a região do Espírito Santo composta de descendentes de imigrantes, poderíamos ter alguma coisa em comum. Assim conseguimos que sete jovens fossem a Itália para se preparem na Escola Família, neste intervalos nós fomos preparando o terreno para lançarmos a semente’’.
Hoje, 13 anos do início oficial do Mepes, 11 escolas se espalham nos seguintes municípios de Anchieta, Alfredo Chaves, Piuma, Rio Novo do Sul, Iconha, São Mateus, Rio Bananal, São Gabriel da Palha e Barra de São Francisco, em implantação.
Nos  municípios as escolas de primeiro grau e as creches funcionam com apoio das comunidades. Em Anchieta funciona um esquema de segundo grau, capacitação de técnicos em ensino médio. É nesse esquema que o padre fala “nós estamos formando não estudantes, mas agricultores engajados com a sua realidade e com a realidade de sua comunidade. Nós acreditamos que é o homem que tem de ficar no centro e tem de ser o artífice de qualquer progresso e desenvolvimento. Mas não o homem sozinho, mas o homem inserido na sua comunidade, o homem que faz crescer a sua comunidade e está o faz crescer também. Cremos que o homem não se realiza fugindo e deixando o campo sozinho.”
ALTERNÂNCIA
De acordo com os  documentos do Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo (MEPES) a alternância permite ao jovem viver num internato e numa comunidade, para discussões e depois colocar em prática os ensinamentos e a reflexão. Diz que ‘’a Escola se preocupa em dar meios para solucionar os problemas e não solucionar ela mesma, os problemas dos jovens e de suas famílias.”
As Escolas procuram sempre realizar um currículo funcional visando a realidade local. Diz ainda o relatório que ‘’os currículos foram realizados sempre tendo presente que o processo da descoberta, de soluções de problemas, a partir da própria experiência e das aquisições congnitivas é de fato o ápice da aprendizagem  que não se confunde com o acúmulo de informações memorizadas. Por isso o currículo prevê muitas atividades práticas.
No primeiro ano do segundo grau os alunos começam estudando a origem da família e entram no mundo do meio rural, envolvendo desde a horta, até todo o esquema de tradições e costumes, passando pela cultura da região.
Já no segundo ano o esquema cresce e as aulas começam a envolver assuntos como comercialização, sindicalismo, crédito rural, êxodo rural e questões relacionadas com meio ambiente. Nesta fase ainda se continua o estudo das culturas.
No terceiro ano o assunto já cresce  mais, porque falam em distribuição de terras e estrutura fundiária, bem como sindicalismo, culturas e criações.
Como o jovem volta a sua casa quinzenalmente, ele pode dialogar com a família, passando assim para os seus, o que aprendeu. Também a reação da família serve de aprendizado. O importante é que a escola forme o jovem para permanecer no meio rural, mas também o capacita para trabalhar em muitas empresas.
Existe um sistema de serões noturnos com a duração de até duas horas, onde está inserida a proposta das atividades formativas. Os assuntos variam de escola e de turma, e basicamente envolvem:
- assuntos sociais;
-conhecimentos do Mepes;
- assuntos religiosos;
- realidade brasileira e internacional;
- relações humanas – vida em grupo e vida em família;
- saúde, higiene e sexo;
- debates sobre noticiários;
- teatro;
- avaliação de atividades realizadas; e,
- encontros com líderes das comunidades
A escola de segundo grau possui alunos de diversos Estados, como Bahia, Maranhão e Amazonas. Os alunos de outros Estados se comprometem a prestar serviços nas suas comunidades e prosseguirem o sistema. Por isto é que já existem escolas na Bahia e Paraná e grande possibilidade de surgirem novos grupamentos no Maranhão, Pará e Amazonas. Os alunos de outros Estados quando tem de sair da escola, para obedecer a alternância, passam a viver nestes quinze dias em propriedades capixabas. Para João Martins, presidente do Conselho da escola de Rio Novo do Sul ‘’o surgimento da Escola Família foi fundamental para nós, porque é difícil para um pai do meio rural colocar um filho na escola. Ainda existe o fato de que a escola do meio urbano não satisfaz o meio rural. Acho que o meio rural não vai se desenvolver nunca se não lhe derem a educação própria. Veja que o exemplo é tão bom que ele se espalhou por todos os lados, ele é um exemplo ligado à realidade rural”.
A Escola Família conta com grande apoio da cúpula do Espírito Santo, o bispo de São Mateus, D. Aldo Gerna, em carta enviada ao Padre Humberto Pietrogrande, afirma que:
- é um belo documento, é mais uma escola que merece todo apoio e, fazemos votos, aqueles que pensam na educação formação de jovens, de maneira mais humana e mais promissora para os nossos muitos sofridos homens do campo.
Dentro do esquema de preparar o jovem para continuar no meio rural, o Mepes desenvolve também através dos estudantes e sua famílias, atividades que vão envolver a comercialização e a produção. É fato normal no meio rural sempre sobrar alguma mercadoria para o comércio, situação que o produtor sempre utiliza para comprar os produtos que não produz e não tem condições de fazê-lo. A organização de feiras de produtores na sede dos municípios também é um fato que eles desenvolvem. Nas feiras, o intermediário é eliminado, o produtor recebe mais e o consumidor paga menos.
Existe ainda o fato de que em recente movimentação dos produtores de banana, a presença de alunos do Mepes e de seus pais foi fundamental. Agora os produtores estão organizados em uma associação, que divulga semanalmente os preços do mercado de Vitória e Rio de Janeiro, via as capelas do interior. A associação é o primeiro embrião de uma cooperativa. Os produtores sentiram que não poderiam formar uma cooperativa, porque os intermediários possuem uma estrutura muito sólida que fatalmente os levaria a falência. Vigiar os preços e manter os produtores informados do mercado.
No último relatório do Mepes, diz que “estamos procurando novas picadas nestes dias. Esta é uma hora importante. Há muito o que fazer. O agricultor não tem ainda uma consciência de classe. Há bons agricultores, boas pessoas, mas ainda falta o trabalho unido, de mãos dadas. O agricultor foi muito dividido e há interesse em mantê-lo desunido. Esta classe unida será uma força. ‘’ Fala ainda que “o  nosso agricultor tem de se unir integralmente, desde a oração até a sua atuação. As outras classes sabem se unir e pedir respeito a seus direitos. O agricultor ainda não conseguiu dar este passo. Para isso, muitas vezes, mais vale perder juntos do que ganhar sozinhos, porque de fato esta perda é mínima em relação do que se vai ganhar. A importância da união, através das pequenas atividades comuns, aqui citadas, feira-livre e mutirão de vendas. O saber ariscar juntos, tudo isto é de alto valor na promoção da união do agricultor’’. Outra colocação indica que “não é papel do Mepes tornar-se um partido ou um sindicato, mas ser a consciência críticade tudo isto”.
REVISTA VISÃO, 29-04-81

Um comentário:

  1. Mansur,
    como é que eu faço para ter um livro desse? Vende em Brasília?
    Abs,
    Historinha

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