sexta-feira, 20 de julho de 2012

Dois meses de mobilização



Estratégia do governo parece ser protelar. Alastramento da greve para outros setores sugere que aposta pode ser de alto risco
Por Laís Bellini

Iniciada há cerca de 60 dias, a greve dos professores das universidades federais assumiu repercussões surpreendentes nesta quarta-feira (18/7). Entre 10 mil (segundo a PM) e 30 mil pessoas (para os manifestantes) concentram-se na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, para protestar contra a demora do governo em abrir negociações efetivas. Além da mobilização numerosa, o movimento chamou a atenção por ter se alastrado rapidamente. Agora, 26 setores da administração pública (e 350 mil funcionários) estão parados. Nas universidades, a adesão é quase total: de 59 universidades públicas federais, apenas uma a três (há informações contraditórias) ainda não aderiram.

Centenas de professores ainda estão em Brasília. Eles querem uma reunião com a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, a fim de debater suas três reivindicações básicas (vertexto de Bruna Bernacchio): reajuste salarial, plano nacional de carreira e melhores condições de trabalho, ensino e pesquisa.
A greve começou em 17 de maio, inicialmente em 14 universidades federais. Além de ter se espraiado a quase todas as instituições, abrange 34 dos 38 institutos federais, dos Centros de Educação Tecnológica (Cefets) e o Colégio Federal Pedro II, no Rio de Janeiro. São cerca de 55 mil professores e 600 mil estudantes – estes últimos, ativamente paralisados em cerca de 40 universidades.
O histórico do conflito começa com a grande expansão das universidades federais, nos últimos anos. Só entre 2008 e 2010, o número de estudantes saltou de 653 mil para 850 mil em 2010. O Orçamento do sistema cresceu de R$ 3,9 bilhões para R$ 7,7 bilhões em 2012 no período – mas não foi suficiente, segundo a presidente do Andes (Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior), Marinalva Oliveira.
A expansão das matrículas acabou elevando a carga horária dos docentes e tornando ainda mais precárias as condições de pesquisa, diz a professora. Em consequência, ela acrescenta, muitos recorrem a financiamento privado, o que ameaça sua autonomia e compromete os objetivos de seu trabalho. Além disso, as salas de aula estão lotadas, chegando a reunir 80 alunos. Soma-se falta de laboratórios, restaurantes, creches e professores. Segundo Marinalva, o ANDES defende a expansão das universidades federais – “mas com qualidade”…
Em busca de saídas, governo e sindicato firmaram, em 2011, acordo que visava implantar um Plano Nacional de Carreira até março deste ano. No final de maio, contudo, o MEC anunciou que a medida ficaria para 2013.
pauta de reivindicações dos professores foi protocolada em fevereiro deste ano. O governo tem optado pela protelação. Só em 12 de junho, marcou a primeira reunião depois do início da greve, pedindo trégua que não foi dada. O encontro, porém, foi adiado e depois suspenso.
Durante a campanha eleitoral, a então candidata Dilma Rousseff frisou que Educação seria uma de suas prioridades – e que isso incluía correção da defasagem salarial dos professores. Hoje, alega dificuldades provocadas pela crise financeira internacional. Marinalva contra-argumenta lembrando que há dinheiro, por exemplo, para as obras da Copa do Mundo. Lembra também que o governo não vê problemas em dar isenção fiscal a empresários. Cita o caso da dívida tributária das universidades particulares, que atingiu R$ 17 bilhões. Uma proposta de renegociação daria a elas o direito de pagar 90% em bolsas de estudos e os 10% restantes, apenas em 15 anos. Quanto às negociações, a presidente do Andes diz: “Temos interesse em encerrar essa greve, mas desde que o governo nos receba, analise nossa proposta”.

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