terça-feira, 4 de agosto de 2015

Acertando as contas do câmbio


A grande mídia continua a fomentar insatisfação lançando diariamente informações truncadas e algumas vezes inverídicas: vejamos o exemplo do dólar.


José Carlos Peliano*
Rafael Neddermeyer/ Fotos Públicas
Permanece a grande mídia no fomento à insatisfação de certos grupos da sociedade brasileira ao lançar diariamente informações truncadas, supostas, algumas vezes inverídicas, a maioria delas prejudiciais ao governo eleito democraticamente pelo povo.
 
Muito já se escreveu sobre esse comportamento doentio, raivoso, irracional, o que leva seus representantes a serem candidatos irremediáveis a divãs de analistas. Os consultórios estariam superlotados acompanhados de filas intermináveis de (im)pacientes.
 
Uma das últimas bombas lançadas nas primeiras páginas dos jornais, nas capas de revistas e nas chamadas dos telejornais foi a que mostra ter a taxa de câmbio brasileira (R$/US$) alcançado o maior valor da história nacional agora no mês de agosto.
 
Mais um ingrediente ou mesmo um dos estopins que faltavam para alimentar ainda mais as manifestações contra o governo. Onde o candidato da oposição vencido deve pegar carona, conforme já adiantou, para não ser mais taxado pelos grupos que as integram como covarde, omisso e enganador. 
 
Coube a Rodolfo Gamberini, repórter de currículo limpo, ir contra a informação ao adiantar que a taxa de câmbio não pode ser comparada em períodos diferentes por seus valores nominais. Em outras palavras, os valores correntes delas, aqueles de um período e de outro, devem e têm de ser ajustados pelos índices de preços. No caso, tanto do real quanto do dólar.
 
Aí sim, a comparação faz sentido e mostra de fato e de direito o que realmente acontece. Se não se leva em conta a inflação no Brasil e nos Estados Unidos a comparação está prejudicada e só mostra o que quer o informante, se amenizar ou jogar mais lenha à fogueira.
 
Esta última a ação escolhida mais uma vez pela grande mídia. Será que seus jornalistas, chefes e mandantes calculam seus créditos trabalhistas, de vendas, de participações, de um período a outro do tempo, somente em valores correntes? Não levam em conta a inflação?
 
Dois pesos, duas medidas. Ao darem a notícia sem a correção da taxa de câmbio pela inflação vende-se gato por lebre.
 
Uma simples consulta aos dados do IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas) mostra resultados concretos em lugar dos anunciados aos quatro cantos dos Brasis. Série história de 1980 a 2015 sobre as exportações da indústria para os 16 países compradores mais importantes revela taxas de câmbio efetiva real ajustadas, as quais informam os termos de troca das mercadorias industriais expressas em real e dólar.
 
Pois bem, uma simples comparação das taxas, não se considerando as situações econômicas dos períodos referentes, mostra que a tal taxa de câmbio anunciada como sendo a maior da história não corresponde bem à realidade.
 
A taxa de câmbio corrente em outubro de 2002 (último ano de FHC) atingiu R$ 3,84, enquanto agora em março de 2015 ela chegou a R$ 3,14. Assim, em valores nominais, utilizando aqui os mesmos termos da grande mídia, o número de 2015 é menor do que aquele de 2002. Não o contrário como veiculado.
 
A taxa de câmbio de julho último, por seu turno, motivo da manchete e dos comentários devastadores, atingiu no dia 31 o valor de R$ 3,39. Valor esse que de novo não sustenta a notícia.
 
Já os cálculos do IPEA da taxa de câmbio efetiva real para março de 2015 chegaram ao número índice 141; enquanto isto a mesma taxa para outubro de 2002 atingiu o índice 137. Esta informação considera as inflações nas duas datas e nos dois países.
 
Levando agora em conta os dados da taxa real efetiva de câmbio chega-se à conclusão de que a diferença entre eles não passa de 3%, na verdade 2,9%. O resultado mostra a diferença entre os preços brasileiros e os americanos, no caso minimamente a favor desses últimos no período de 13 anos.
 
O ligeiro aumento dos preços internos no Brasil em comparação aos preços externos nos Estados Unidos, na verdade, longe da catástrofe anunciada pela grande mídia nacional, aponta para uma relativa estabilidade da inflação ao longo do período.
 
A mesma observação caberia fosse o resultado ao contrário, a diferença estar a favor dos preços brasileiros ao invés dos preços americanos.  Tal diferença por ser pequena pode ser atribuída, como em outros tipos de cálculos como esses, a acumulação de arredondamentos nos números utilizados, erros de estimativas, fontes diferentes de informações.
 
Mais ainda a diferença deve estar ligada aos próprios dados utilizados para a taxa real efetiva de câmbio. Ela foi baseada em produtos de exportação da indústria manufatureira, não levando em conta a pauta de serviços e outras transações financeiras e de capital.
 
Mas foi a fonte de informação de acesso mais fácil e rápido. É possível que alguém mais tenha conseguido informação melhor para tal fim. O que importa, no entanto, é enfatizar que a evolução da taxa de câmbio no último quarto de século aponta para uma certa estabilidade, pelo menos nos dois meses e anos extremos considerados.
 
Não à catástrofe anunciada e ao respectivo pânico e insegurança gerados nos investidores, importadores e demais cidadãos que têm algum tipo de relação econômica ou financeira com o mundo exterior. 
 
Por fim, mas não menos importante é conhecida no meio acadêmico econômico a informação de que a taxa de câmbio no Brasil está sobrevalorizada há um bom tempo. Cerca de 50% acima do valor considerado saudável por economistas de várias tendências.
 
Este desajuste macroeconômico prejudica a performance da economia brasileira não só nas relações com o exterior mas também nas decisões internas da política econômica. Neste caso afeta-se o resultado primário, a política fiscal, a política monetária (juros). E consequentemente o vigor da economia real.
 
Assim, mais importante do que alardear uma informação pontual e contestada é combater a política econômica recessiva que só afunda os termos de trocas do País, além de prejudicar sensivelmente nosso parque industrial.
 
*colaborador da Carta Maior

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