Cabelos brancos, os meus e os nossos

Janaína Araújo

Adital

Na mesa do almoço com amigas assumo publicamente meu desejo discreto de deixar os meus cabelos brancos expostos ao mundo. Genuinamente, um desejo que está chegando até nos meus sonhos. Neles, os cabelos brancos aparecem soltos e revoltos. Livres de amônia, tinturas e cheiros do salão de beleza mensal para retocar os fios que teimam em aparecer. E são muitos! São tantos cabelos brancos que olho no espelho com duas vontades. A primeira de deixá-los livres e a segunda de ver com gosto o meu envelhecer.

Não fico surpresa com as respostas que surgiram entre um garfo e outro, um suspiro no meio, e um almoço para terminar. Primeiro minha fala gera um incômodo. Um silêncio sepulcral. Mas como você vai deixar à mostra os brancos? Será que você está enlouquecida em assumir sua idade? É muito feio! Cabelo branco é sinal de descuido, de velhice, de falta de estética. Você precisa aproveitar a onda que vivemos de beleza em favor das mulheres. Onde você está com a cabeça?

O curioso é que entre o grupo havia um único homem, com apenas 30 anos. Eu vou fazer 40, daqui a pouco. Inquieta, perguntei ao garotão sobre o seu cabelo branco aparente e feliz. Incomoda-te? Faz-te mal? Você pensa em pintar? Mas, claro não! Nem me passa pela cabeça. E sabe, ele gosta mesmo de cultivar os branquinhos para dar certo charme.

Durante as justificativas calorosas, uma das defesas é que homem pode e mulher não! Homem pode assumir os brancos. Uma mulher com 30, 40 anos não poderia, jamais, se despedir das tinturas das fábricas de beleza. Pelo menos, no ambiente classe média pessoense onde resolvi dedicar umas horinhas para celebrar a amizade com as amigas.

Percebo que somos seres abomináveis, como diria Marilena Chauí. Quem já viu ousar em criar asas e curtir sua identidade. Enfrentar a pressão e sair do circuito beleza 24 horas. Onde está escrito que não podemos deixar os belos branquinhos aparecerem antes dos 60 anos? Quem determinou? Bom, se você tentar, você sentirá!

Aproveite para enfrentar a pressão social! De mulheres e de homens. Olhares, expressões e comentários de desqualificação sobre a opção estética de vida. Realmente não está escrito em nenhum lugar que não podemos deixar os brancos livres, leves e soltos. Nem regra, nem norma. Ideologicamente e subjetivamente, está lá o recadinho para quem deseja desafiar o modelo padrão que tão bem conhecemos. Você quer testar?