Verões mais quentes, derretimento de geleiras, desastres naturais. Essas são apenas algumas das consequências do aquecimento global, processo decorrente de emissões de gases de efeito estufa pelo homem, segundo muitos especialistas. Mas seríamos mesmo os responsáveis por alterações de tamanha proporção? Apesar do aparente consenso entre cientistas sobre a existência do fenômeno de aumento da média de temperatura terrestre, ainda há fortes debates sobre a contribuição antropogênica e até mesmo sobre a comprovação de mudanças climáticas significativas nas últimas décadas.
Ricardo Schinaider De Aguiar
Ricardo Schinaider De Aguiar
Evidências favoráveis
Evidências contrárias
"De acordo com o quarto relatório do IPCC, os fluxos de carbono entre a atmosfera e a biosfera continental somam cerca de 120 trilhões de toneladas por ano, enquanto os fluxos da atmosfera para os oceanos somavam 90 trilhões. Tais valores podem conter uma margem de erro de até 20%, para mais ou para menos. Já os seres humanos contribuem com 4,1 trilhões de toneladas por ano, míseros 10% da margem de erro dos fluxos naturais", afirma Daniela Onça, geógrafa e pesquisadora da Universidade do Estado de Santa Catarina. "As circulações atmosférica e oceânica transportam quantidades colossais de matéria e energia. A adição de dióxido de carbono à atmosfera pelo homem é irrisória frente aos fluxos naturais, que incluem processos como fotossíntese, respiração, decomposição, erupções vulcânicas, formação de esqueletos, dissolução de dióxido de carbono na água, entre outros", completa.
Outro importante ponto de crítica em relação ao aquecimento global está relacionado aos modelos de previsões climáticas. Pesquisadores canadenses publicaram um estudo na revista Nature Climate Change, em setembro, no qual analisaram 117 desses modelos e suas previsões entre 1993 e 2012. Em média, os modelos previram um aumento 50% maior do que o real. Quando analisaram somente os dados de 1998 a 2012, as previsões chegaram a ser quatro vezes maiores quando comparadas à realidade. "As evidências favoráveis à hipótese do aquecimento global antropogênico são resultados de modelos climáticos de computador que simulam o clima terrestre e são programados para registrar elevações de temperatura quando, por exemplo, adicionam-se gases de efeito estufa à atmosfera. Se os dados inseridos neles são de elevações da concentração atmosférica de dióxido de carbono, eles denunciarão aquecimento, pois foi justamente para isso que foram programados", diz Onça. "Já as evidências contrárias à hipótese do aquecimento global antropogênico estão no mundo real: temperaturas que não se elevam há 15 anos, sequências de invernos muito frios, padrões e eventos meteorológicos que nem de longe se assemelham a grandes tragédias vividas no passado, nível do mar e derretimentos de geleiras com a mesma ciclicidade de aumento e retração que sempre exibiram", diz a geógrafa.
Mudanças climáticas, políticas e econômicas
Enquanto ainda há polêmica sobre a existência de mudanças climáticas e suas causas, mudanças políticas e econômicas têm sido adotadas para minimizar as emissões de gases de efeito estufa. As discussões nesse sentido foram iniciadas em 1992 com a Cúpula da Terra, conhecida como Rio-92. Nesse ano, foi estabelecida a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), embasada pelas avaliações do IPCC e que tinha como objetivo procurar soluções para problemas relacionados ao aquecimento global. Era necessário um acordo para limitar as emissões dos gases de efeito estufa, o que poderia ter impactos econômicos, pois diminuiria o ritmo de crescimento das economias.
"A principal medida adotada pelo UNFCCC foi o Protocolo de Kyoto, elaborado em dezembro de 1997 e que entrou em vigor em fevereiro de 2005, demora justificada pela não ratificação por parte dos Estados Unidos, na época o maior emissor de gases de efeito estufa", aponta Eliezer Diniz, economista da Universidade de São Paulo. "O objetivo do Protocolo de Kyoto foi controlar as emissões de seis tipos de gases de efeito estufa, mas apresentou um problema importante em sua concepção: os países em desenvolvimento não tinham metas de redução de emissões dos gases, o que caracterizava um comportamento de carona, usufruindo eventuais ganhos sem nenhum tipo de custo. Suas metas vigoraram entre 2008 e 2012, e atualmente há negociação entre países para que um novo protocolo seja consenso e entre em vigor o mais rápido possível", explica. Além do Protocolo de Kyoto, outras ações foram tomadas visando ao combate das mudanças climáticas. Entre elas, destaca-se o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, inspirado em uma proposta brasileira. "Essa medida fazia com que países desenvolvidos buscassem o cumprimento de suas metas pelo investimento em projetos de mitigação das emissões de gases de efeito estufa nos países em desenvolvimento", diz o economista.
Se por um lado as economias são prejudicadas pelas medidas políticas e econômicas relacionadas às mudanças climáticas, por outro lado o aquecimento global abre brechas para que oportunistas, desde governos e empresários até cientistas, possam se aproveitar do tema. As consequências, nesses casos, podem recair sobre a população, que paga mais impostos e se depara com produtos mais caros apenas pelo fato de serem produzidos de maneira sustentável ou ecologicamente correta. "A hipótese do aquecimento global antropogênico consiste em uma ideologia de legitimação de um sistema capitalista em graves e sucessivas crises", diz Onça. "Essa ideologia serve aos interesses de governos - por resultar em maior arrecadação de impostos, como as taxações das emissões de dióxido de carbono, de cientistas - mais financiamentos públicos e privados para pesquisa, de organizações não-governamentais ambientalistas - arrebanhando adeptos e contabilizando novos contribuintes, e de empresários - que conseguirão vender produtos "verdes", invariavelmente mais caros do que os produtos convencionais. Se perguntarem a uma pessoa se ela aceita a criação de um novo imposto para enriquecer o governo, são poucas as que, em sã consciência, se manifestariam a favor. Mas se for para "salvar o planeta", é provável que muitos aceitem. Afinal de contas, um planeta doente precisa de ajuda; do contrário, os prejudicados seremos nós mesmos".
No futuro
Com tantas controvérsias a respeito das mudanças climáticas, as previsões variam de aquecimentos a esfriamentos nas médias da temperatura global. Para os cientistas que acreditam no aquecimento global e na influência da ação humana, serão necessárias mudanças para minimizar emissões de gases de efeito estufa e controlar o aumento de temperatura. "Todos os acordos internacionais objetivam limitar a emissão de gases de efeito estufa para não ultrapassarmos um aumento de 2°C na temperatura global, que já representaria um grande impacto na vida de animais e no ciclo hidrológico", diz Nobre. "Se o ritmo atual se mantiver, há a possibilidade de a temperatura global ultrapassar limites a partir dos quais processos biológicos são interrompidos, podendo ocorrer, por exemplo, a extinção de espécies".
Uma das maneiras de reduzir as emissões de gases do efeito estufa é adotar formas de energia sustentáveis, diminuindo a queima de combustíveis fósseis e, consequentemente, a concentração de CO 2 na atmosfera. Embora atualmente em segundo plano, elas são uma aposta para o futuro, bem como o desenvolvimento e utilização de produtos menos prejudiciais para o meio ambiente. "As fontes de energia sustentáveis devem se tornar cada vez mais viáveis ao longo do tempo", afirma Diniz, que acredita também que uma tendência inexorável é a popularização de tecnologias menos poluentes, como carros flex, híbridos, elétricos e a geração de energia sem queima de combustíveis fósseis, por meio de bagaço de cana, do vento e das ondas do mar.
Já para os pesquisadores que não creem na hipótese do aquecimento global, a preocupação é outra. Além das temperaturas não aumentarem, a previsão para o futuro inclui possíveis resfriamentos, o que poderia ser até mais perigoso. "O clima deve se manter como está ou exibir algum resfriamento, como pudemos notar pelos últimos invernos na Europa, Estados Unidos e até mesmo no Brasil", diz Onça. "As consequências podem ser significativas, especialmente nos países temperados e polares. Temperaturas mais baixas são mais mortíferas do que temperaturas mais altas, tanto para a saúde humana quanto para a produção agrícola e a manutenção da maioria dos ecossistemas. Os grandes bolsões de biodiversidade do mundo estão em climas quentes e seriam beneficiados por um aquecimento; diante de um resfriamento, devem se retrair".
Ainda segundo a pesquisadora, mudanças climáticas são a regra da natureza, não a exceção, e o ser humano não teria poder para controlá-las, seja para o bem ou para o mal. "O clima sempre mudou e sempre mudará, não importa o que façamos. Muitos dos eventos anunciados hoje como tragédias são completamente normais. A natureza está fazendo o que sempre fez: mudar. O homem precisa se colocar em seu devido lugar: ele é pequeno e a natureza é grande. É ele quem tem que se adaptar às incessantes mudanças climáticas, e não a natureza que tem que se adequar às nossas conveniências", conclui.
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