domingo, 26 de maio de 2013

Partidos de direita são maioria desde o final dos anos 70


Ascensão do Likud e de seus aliados está relacionada à chegada de judeus da África e da antiga URSS em Israel

Breno Altman
Durante os primeiros trinta anos da existência do Estado de Israel, o Partido Trabalhista e seus aliados foram a força dirigente do país. David Ben-Gurion, Moshe Sharett, Levi Eshkol, Yigal Allon, Golda Meir, Yitzhak Rabin e Shimon Peres dominavam a cena política, comandando governos sionistas de centro-esquerda.
A origem histórica do Havoda (nome hebraico desta corrente política) remonta ao antigo Mapai, fundado em 1930, que forneceu os principais quadros dirigentes do movimento sionista, do Haganah (seu braço armado) e da luta pela independência. Alinhado à social-democracia, sempre atraiu para seu leito legendas menores, à esquerda e à direita, que aceitavam defender seu programa de incentivo à construção de uma economiafortemente baseada em cooperativas e na propriedade pública.
Os principais eleitores dos trabalhistas estavam constituídos pelas primeiras gerações de imigrantes, oriundos da Europa central e do leste, denominados de asquenazes. Essa fatia do judaísmo liderava as principais fazendas coletivas (os kibutzim), as forças armadas, os sindicatos e a vida cultural. Durante algumas décadas, foram a maioria da população israelense.



Novos fluxos, porém, alteraram a composição demográfica e ajudaram a minar o predomínio dos seguidores de Ben-Gurion, segundo muitos estudos. Levas judaicas, provenientes do norte da África e de outros países do Oriente Médio, os chamados sefarditas, colocaram sob pressão o sistema organizado pelos imigrantes europeus.

A esses grupos se somou, entre os anos 70 e 90, uma onda de refugiados da União Soviética e de outras nações do campo socialista. Mais de um milhão de russos, por exemplo, chegou nesse período. A maioria muito crítica de qualquer ideia que cheirasse a socialismo e ávida para demonstrar as melhores e mais ortodoxas credenciais judaicas.

Acima de tudo, esses segmentos, sefarditas e neoasquenazes, eram mais pobres e sentiam-se com menos oportunidades que as camadas sociais tradicionais de Israel. Estavam prontos para uma mensagem que lhes abrisse caminho e defendesse claramente seus interesses. Teriam sido estas, enfim, as principais condições para a ascensão da direita sionista, que colou seu discurso à dinâmica destes atores sociais.

Vitória do Likud

Foi nesse cenário que o Likud ganhou as eleições de 1977, com Menachem Begin assumindo o posto de primeiro-ministro até 1983. Além desses seis anos, os conservadores estiveram à frente do governo por mais 19, com Yitzhak Shamir, Ariel Sharon e Benjamin Netanyahu, que atualmente lidera a administração. Os trabalhistas detiveram o comando em menos de um terço dos últimos 36 anos, com Peres, Rabin e Ehud Barak.

Em sentido horário, os ex-premiês Shimon Peres, Benjamin Netanyahu (na terceira administração), Yitzhak Rabin e Golda Meir

O programa que levou o Likud ao poder se contrapunha fortemente à perspectiva social-democrata e propunha medidas radicais de privatização e desregulamentação da economia. Também defendia o aprofundamento da luta contra a resistência palestina e uma ampla política de colonização dos territórios ocupados após a guerra de 1967. A fusão de bandeiras, contra a “oligarquia dos kibutzim e do sindicalismo” e a favor da extensão das fronteiras israelenses, mobilizou judeus que se sentiam preteridos pelas escolhas até então vigentes.

Apesar da guinada à direita ser lugar-comum nas análises sobre a política israelense, alguns preferem identificar mudanças mais sutis. Yossi Beilin, que serviu como vice-ministro das Relações Exteriores e da Justiça em governos trabalhistas, considera uma “simplificação” o raciocínio que Israel está em marcha batida para posições mais conservadoras. “Fora episódios pontuais, os dois grandes partidos confluíram ao centro”, afirma Beilin. “O Likud acabou por abraçar a solução de dois Estados para a questão palestina. Os trabalhistas passaram a defender o livre-mercado.” 
Alguns fatos corroboram sua tese. Entre 1984-1990, quando as principais medidas liberais foram adotadas e romperam o modelo econômico-social anterior, as duas principais agremiações estavam aliadas no governo, fazendo rodízio no cargo de primeiro-ministro. O discurso conservador a favor dos dois Estados, porém, é uma novidade da década atual, sobre o qual pairam muitas dúvidas.
Essas dúvidas e resistências levaram Ariel Sharon, quando se decidiu pela retirada israelense da Faixa de Gaza, em 2005, a se afastar de seu antigo partido e fundar o Kadima. Atraiu para a sua companhia um dos homens de ouro do Havoda, Shimon Peres, atual presidente de Israel. A distância entre os dois grandes aglomerados políticos do sionismo pode realmente ter sido diminuída. Mas o derrame sofrido pelo velho general, em coma desde 2006, parece ter explodido algumas pontes entre os dois principais grupos sionistas.

Administração atual

A atual coalizão de governo, eleita em janeiro, tem como aliança dirigente a junção entre o Likud e o Yisrael Beiteinu, de Avigdor Lieberman, da ultradireita sionista. Essa lista, com 31 cadeiras no Knesset, ocupa os principais cargos na administração. Soma-se ao bloco um partido novo, Yesh Atid, de Yair Lapid, com 19 deputados, que atraiu muitos votos das camadas médias urbanas por seu discurso contra os privilégios dos religiosos ultraortodoxos, subsidiados pelo Estado e liberados da obrigação de servir o exército.

Yossi Beilin, ex-vice-ministro das Relações Exteriores e da Justiça em governos trabalhistas, descarta guinada à direita na política

Outra sigla extremista que compõe a coligação oficialista é Habayit Hayehudi (Lar Judaico), dirigida pelo empresário Naftali Bennett, com 12 vagas no Knesset. Sua plataforma tem como eixos a defesa das colônias judaicas na Cisjordânia, a reivindicação de que boa parte dessa região seja anexada a Israel e a recusa de qualquer negociação com os palestinos sobre a divisão de Jerusalém.

O arco de governo completa sua base de 68 parlamentares com o pequeno Hatnuah, de Tzipi Livni, atual ministra da Justiça. Partido secular, mais moderado que seus aliados, inclina-se para um acordo permanente com os palestinos e uma política para recuperação de direitos sociais.

Os trabalhistas são o maior partido na oposição, com 15 deputados. À sua direita está o desidratado Kadima, com apenas dois parlamentares, mas que já foi uma importante dissidência do Likud, nos tempos áureos em que Sharon e Ehud Olmert (2006-2009) chefiaram o país. À esquerda, tem a companhia do Meretz (seis representantes no Knesset), formação herdeira do Mapam, que combinava, nos anos 40-50, os postulados do sionismo com a identidade marxista e a defesa do socialismo.

Também estão na oposição os dois partidos religiosos, Shas e Yahadut Hatorah. O primeiro, com onze deputados, representa os ultraortodoxos, de origem sefardita. O segundo, com sete integrantes do parlamento, fala pela fração asquenaze da ortodoxia. Ambos os grupos estão fora do governo em razão das políticas defendidas pela corrente de Lapid.

Outro setor contra Netanyahu é integrado pelos agrupamentos externos ao sionismo. O mais relevante entre esses é o Hadash, frente de composição árabe-judaica dirigida pelo Partido Comunista, com quatro deputados. Além de reivindicar a fórmula de dois Estados, propõe o reconhecimento dos direitos coletivos da minoria árabe-israelense e a ruptura do ordenamento liberal da economia.

Nessa fatia também habitam outros dois partidos de origem árabe. Um de características seculares, o Balad, com três parlamentares. Outro de filiação muçulmana, a Lista Árabe Unida, com quatro representantes. Ambos demandam que o Estado de Israel assuma características laicas e deixe de ser caracterizado como judaico.
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