A atitude dos governos desenvolvidos em relação à China está marcada pela ambivalência. Por um lado, as nações europeias procuram seduzir o país para que invista em seus territórios e abra seus mercados para ajudá-los a sair da crise iniciada em 2007-2008. Por outro, a China é percebida como um perigo para as democracias ocidentais
Marcelo Justo
Marcelo Justo
Segundo acaba de revelar o “The Australian Financial Review”, a aliança da inteligência ocidental conhecida como os cinco olhos (Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia) vetou, desde 2006, o uso de computadores da empresa chinesa Lenovo para sua rede de informação confidencial por temor de uma manipulação do circuito eletrônico que facilitasse o acesso à informação.
A rede vincula a informação altamente confidencial que circula nas agências de inteligência dos cinco países e, segundo membros da inteligência britânica e australiana, estava ameaçada por supostos “circuitos maliciosos” e problemas de segurança nos chips de computadores produzidos por uma empresa com fortes vínculos com o governo chinês. Em 2005, a Lenovo adquiriu a operação de computadores da IBM, intensificando as suspeitas das agências encabeçadas pela CIA e pelo britânico GCHQ.
A Lenovo desmentiu categoricamente nesta quarta-feira que houvesse interferência em seus produtos, mas a empresa não é o único caso deste vínculo entre o setor produtivo e o governamental, característico do sistemaeconômico chinês, que preocupa as agências ocidentais. O ex-chefe da CIA, Michael Hayden, disse ao “The Australian Financial Review” que o gigante de telecomunicações Huwei, a segunda maior empresa chinesa, espionava para o governo chinês e constituía um perigo para a segurança dos Estados Unidos e da Austrália. Entre 1995 e 2005, Hayden foi diretor da National Security Agencia (NSA), a agência que dirige a inteligência eletrônica estadunidense. “Creio que este é o tipo de situação na qual o Estado tem que intervir: quando está em jogo a segurança nacional”, assinalou Hayden.
O tom escandalizado de Haypen pode parecer uma ironia vindo do ex-chefe de uma organização que espionou governos aliados europeus e seuscidadãos, segundo as revelações de Edward Snowden, que segue à deriva em Moscou esperando que se decida seu destino. Mas o certo é que a atitude dos governos desenvolvidos em relação a China está marcada pela ambivalência. Por um lado, as nações europeias procuram seduzir a China para que invista em seus territórios e abra seus mercados para ajudá-los a sair da crise iniciada em 2007-2008 que, segundo diversos cálculos, projetará sua sombra até o final desta década, pelo menos. Por outro, a China é percebida como um perigo para os princípios da democracia ocidental com um sistema autoritário regido por um Partido Comunista que, por mais práxis capitalista que adote, continua qualificando-se como marxista. O dilema está claro no diálogo pelo twitter que o editor de temas internacionais da BBC News, John Simpson, conduziu esta semana sobre esse tema. O título do diálogo era eloquente: “China, amigo ou inimigo?”.
Esta ambivalência não é estranha ao mundo em desenvolvimento, ainda que se expresse de outra maneira. O dilema que existe na América Latina e na África é se o investimento e a demanda da China, que tem sido fundamental no crescimento de ambas regiões nos últimos anos, é uma benção ou um novo neocolonialismo. No caso da América Latina soma-se a este dilema o conflito global entre Estados Unidos e China, que está se expressando, segundo alguns analistas, na confrontação entre dois projetos, o neoliberal da Aliança do Pacífico (Colômbia, Chile, Peru e México), e o do Mercosul e da Unasul, mais focado na integração regional.
Derrotada a integração neoliberal proposta por George W. Bush – a ALCA – na cúpula de 2005, em Mar del Plata, Argentina, muitos analistas assinalam que a estratégia dos Estados unidos hoje é conter a China na América Latina e em outras regiões do mundo com tratados de livre comércio.
O novo projeto estadunidense se completa com a negociação do TPP que pretende integrar três países latino-americanos – Chile, Peru e México – com Estados Unidos, Austrália, Brunei, Japão, Malásia, Nova Zelândia, Singapura, Vietnã e Canadá. No artigo “O cisma do Pacífico”, o professor de política econômica na Universidade Federal do Rio de janeiro, José Luís Fiori, assinala que o Brasil deveria assumir sua liderança regional para evitar o destino de ser uma “periferia de luxo” e conseguir uma integração que evite esta ALCA II que é o que a Aliança do Pacífico quer ser.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer
Esta ambivalência não é estranha ao mundo em desenvolvimento, ainda que se expresse de outra maneira. O dilema que existe na América Latina e na África é se o investimento e a demanda da China, que tem sido fundamental no crescimento de ambas regiões nos últimos anos, é uma benção ou um novo neocolonialismo. No caso da América Latina soma-se a este dilema o conflito global entre Estados Unidos e China, que está se expressando, segundo alguns analistas, na confrontação entre dois projetos, o neoliberal da Aliança do Pacífico (Colômbia, Chile, Peru e México), e o do Mercosul e da Unasul, mais focado na integração regional.
Derrotada a integração neoliberal proposta por George W. Bush – a ALCA – na cúpula de 2005, em Mar del Plata, Argentina, muitos analistas assinalam que a estratégia dos Estados unidos hoje é conter a China na América Latina e em outras regiões do mundo com tratados de livre comércio.
O novo projeto estadunidense se completa com a negociação do TPP que pretende integrar três países latino-americanos – Chile, Peru e México – com Estados Unidos, Austrália, Brunei, Japão, Malásia, Nova Zelândia, Singapura, Vietnã e Canadá. No artigo “O cisma do Pacífico”, o professor de política econômica na Universidade Federal do Rio de janeiro, José Luís Fiori, assinala que o Brasil deveria assumir sua liderança regional para evitar o destino de ser uma “periferia de luxo” e conseguir uma integração que evite esta ALCA II que é o que a Aliança do Pacífico quer ser.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer
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