Importantes comerciantes varejistas dos Estados Unidos vendem plantas de jardim como “amigáveis com as abelhas”, mas borrifadas com pesticidas tóxicos para esses insetos, segundo um estudo preliminar (o primeiro sobre o assunto) divulgado esta semana. Pesquisadores da seção norte-americana da organização Amigos da Terra e do Instituto de Pesquisas sobre os Pesticidas afirmam que mais da metade das plantas de viveiros estudadas contêm resíduos de pesticidas “neonicotinóides”, acusados de contribuir para a morte em massa de populações de abelhas melíferas no mundo.
CAREY L. BIRON
CAREY L. BIRON
Muitos compartilham desse sentimento. No dia 14, mesmo dia em que a pesquisa foi divulgada, estas organizações tornaram pública uma petição assinada por cerca de 175 mil pessoas e dirigidas a grandes varejistas, pedindo que deixem urgentemente de vender plantas tratadas com neonicotinóides. O último inverno boreal foi um dos piores para as populações de abelhas comerciais dos Estados Unidos. Os apicultores registraram entre 40% e 90% de mortalidade e o colapso de quase um terço das colmeias. Segundo os especialistas, a mortalidade normal durante o inverno deveria ficar entre 10% e 20%.
Nos Estados Unidos, aproximadamente um terço do fornecimento de alimentos (e dois terços dos cultivos alimentares) depende da polinização realizada pelas abelhas. Os ecossistemas, num sentido mais amplo, têm ainda mais a perder, já que cerca de 80% das plantas que florescem dependem desses insetos para sobreviver. Os neonicotinóides (ou neônicos) são pesticidas sistêmicos, solúveis em água, que podem viajaratravés de um cultivo por suas raízes, permanecendo dentro da planta por múltiplas temporadas. Atualmente, constituem a classe mais comum de praguicidas no mundo, incluídos os tratamentos para quase todos os grãos plantados comercialmente nos Estados Unidos.
Cada vez mais evidências científicas sugerem que uma baixa exposição aos neônicos pode estar deixando as populações apícolas mais vulneráveis a uma série de outros problemas, incluindo parasitas e mudança climática. Embora os cientistas se centrem cada vez mais no potencial impacto do uso agrícola dos neônicos, o estudo divulgado no dia 14 é o primeiro que procura avaliar o uso destas substâncias em jardins ornamentais industriais e domésticos. O informe indica que “muitos dos arbustos e das plantas vendidas em viveiros e no comércio de jardinagem nos Estados Unidos são pré-tratados com neonicotinóides em doses muito mais elevadas do que as usadas nas fazendas”.
A mostra na qual se baseou o estudo foi muito pequena, de apenas 13 plantas conhecidas como muito atraentes para os polinizadores, e por isso os cientistas pedem uma pesquisa mais extensiva. As plantas foram compradas em três redes varejistas com presença em todo o país, em três áreas dos Estados Unidos, e depois foram analisadas por um laboratório independente. Mais da metade das amostras apresentavam algum grau de concentração de neônicos, oscilando entre 11 e 1.500 microgramas por quilo. Descobriu-se que algumas plantas continham dois ou mesmo três tipos dessas substâncias tóxicas.
Embora os menores níveis desse espectro provavelmente não causem morte às abelhas, Archer destacou que quantidades menores poderiam ter um impacto significativo. “Definitivamente, é possível que ocorram efeitos adversos inclusive com quantidades menores, o que inclui o impacto sobre a fertilidade das abelhas e sobre sua capacidade de orientar-se, como foi demonstrado em situação de laboratório”, afirmou Archer. “As abelhas já têm suficientes problemas, por isso nossa esperança com este estudo é que os varejistas agora possam tomar medidas e liderar neste tema, para garantir que os consumidores ao menos tenham acesso a plantas livres de neônicos”, destacoou.
Archer ignora que grau de conhecimento existe na indústria dos viveiros varejistas sobre o potencial impacto dos neônicos sobre as populações de abelhas. Um porta-voz da Home Depot, gigante dos serviços para o lar que opera cerca de 2.250 pontos de venda, disse à IPS que seu escritório ainda não avaliou o novo estudo. “Porém, sem dúvida, apreciamos a importância da população apícola, por isso nos aproximaremos dos grupos de estudo para aprender mais”. A Lowe’s, outra rede varejista incluída no novo estudo, não respondeu à solicitação de declarações.
No mês passado congressistas dos Estados Unidos apresentaram um projeto de lei com medidas interinas de emergência para salvaguardar as colmeias do país, depois que cerca de 50 mil abelhas melíferas morreram após a aplicação de pesticida neônico em um estacionamento. Se for aprovado, freará o uso de neônicos até que a Agência de Proteção Ambiental (EPA, que aprovou seu uso inicialmente) volte a avaliar estes pesticidas em 2018.
“Há 12 anos a EPA ficou tão cativada pelos inseticidas sistêmicos que aprovou centenas destes produtos”, disse à IPS o advogado Peter Jenkins, do Centro para a Segurança Alimentar, que entrou com processo contra a agência por este tema. “Mas acontece que estes inseticidas sistêmicos apresentam riscos importantes que a EPA não entendeu plenamente. Agora, a agência está na defensiva. Será difícil jogar fora estes produtos, mas pode ser feito”, ressaltou.
Apesar de alguns sugerirem que a campanha conservadora poderia condenar a legislação sobre os polinizadores, atualmente pendente, Jenkins apontou recentes evidências de um importante apoio bipartidário para tal ação. Uma disposição relacionada poderia ter sido aprovada no começo deste ano na Câmara de Representantes, controlada pelo opositor Partido Republicano, como parte de um projeto de lei mais amplo que acabou fracassando, pontuou.
Além disso, o comitê da Câmara que controla as destinações de dinheiro para a EPA atualmente pede que a agência tome com urgência medidas regulatórias relacionadas. Em boa parte, o precedente mundial sobre o uso de neônicos foi registrado na Europa. A União Europeia está determinada a aprovar uma moratória de dois anos para o uso de três tipos de neônicos, o que está sujeito a pesquisas adicionais, enquanto a maioria dos comerciantes de produtos para jardinagem doméstica na Grã-Bretanha já deixou de vender plantas tratadas com essas substâncias.
“Se os comerciantes podem fazer na Grã-Bretanha, também podem fazer aqui”, enfatizou Archer. “Segundo a Associação Norte-Americana de Jardinagem, mais de 80% dos consumidores estão interessados em comprar produtos amigáveis com o meio ambiente, por isso esperamos que os varejistas vejam isto como uma oportunidade de serem líderes na proteção de polinizadores”, acrescentou.
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