domingo, 26 de agosto de 2012

A indispensável CPI da telefonia celular


  24 DE AGOSTO DE 2012

Por meio dela, Congresso poderia investigar tarifação exagerada, sistema que subsidia ricos, quedas propositais nos sinais. Mas os deputados terão independência para tanto?
Tarifas mais caras para a população mais pobre, práticas ilegais aos consumidores e quedas frequentes nos sinais. Esses sãos os efeitos mais conhecidos pelo cidadão comum da crise na telefonia móvel. E o país que antes celebrava a expansão no acesso ao serviço, agora pressiona o Congresso Nacional a instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) a fim de tornar público as causas e apontar soluções para o setor. Já foram colhidas 246 assinaturas para iniciar as investigações, e agora a decisão está nas mãos de Marco Maia, presidente da Câmara dos Deputados.
Caso levada à frente, a CPI tem como ponto de partida o alto custo da tarifação para ligar de uma operadora para outra (R$, 0,35) ou mesmo da telefonia fixa para a móvel (R$ 0,41). As consequências dessa tarifação se tornam ainda mais pesadas para 82% da população, que ainda utiliza o regime pré-pago e paga por minuto de ligação uma média de R$ 1,35.
Outro problema a ser destacado é a fragilidade no sinal. A Agência Nacional de Telecomunicação (Anatel) já identificou que a operadora TIM o derruba propositalmente a fim de provocar mais lucros. No entanto, há um congestionamento generalizado na infraestrutura da telefonia móvel. O recomendado pela União Internacional de Telecomunicações (UIT) é de mil usuários por antenas, mas no Brasil são 4600 usuário por antenas, que tem um fluxo ampliado devido à tecnologia 3G da banda larga.
Serviço essencial
A advogada da Associação de Defesa do Consumidor (Proteste), Flávia Lefèvre, acredita que as movimentações em torno da CPI têm como foco a qualidade do serviço e a expansão da tecnologia 3G, fundamental no fornecimento da banda larga. Os altos valores cobrados são relacionados à alta concentração no mercado, que chegou ao ponto de as operadoras de telefonia fixa e móvel se fundirem e, por isso, não demonstrarem interesse em abaixar o valor da interconexão, que representa cerca de um terço do faturamento. Quanto às tarifas pré-pagas, Flávia Lefèvre alerta que no Brasil “os mais pobres estão subsidiando os mais ricos”.
Já o professor da UFRJ Marcos Dantas diz que uma oportunidade histórica foi perdida de revisar o setor quando o ex-presidente Lula assumiu o governo federal em 2003, e que o ideal se tornou “impensável” no Brasil: separar as prestadoras de serviço e das detentoras da infraestrutura. No atual panorama, ele alega que a concentração se tornou “totalmente previsível” e, para além dos órgãos de controle, defende que a regulação do mercado deve ser feita por uma empresa nacional, seja pública ou privada.
Marcos Dantas e Flávia Lefèvre convergem em outro caminho fundamental para uma qualificação estrutural no setor: considerar a telefonia móvel um serviço essencial e, consequentemente, de natureza pública, dotado de metas de investimentos e qualidade a serem cumpridas pelas operadoras. Para ambos, a transformação em serviço público também recai diretamente sob a banda larga, que por sua vez, utiliza-se da infraestrutura móvel.
Anatel
A CPI da telefonia pode responsabilizar as empresas, bem como a agência reguladora do setor, a Anatel. O Tribunal de Contas da União (TCU) tem acompanhado os passos do órgão e no último dia 24 de julho concluiu um relatório que responsabiliza a agência por não cumprir os mecanismos de fiscalização na prestação do serviço. Quase de forma simultânea a Anatel cancelou a venda de chips, acusou a TIM de derrubar o sinal e solicitou um plano de investimento às operadoras, sob um prazo semelhante ao solicitado pelo TCU para a agência dar respostas a sua inércia.
O integrante do Intervozes João Brant, em artigo publicado neste Observatório, avaliou a manobra da Anatel como um fato político a fim de desviar sua responsabilidade pela crise. “A situação não precisava ter chegado ao ponto que chegou”, defende. Ele também coloca dúvidas sobre a eficácia da iniciativa. “Na prática, isto significa que essa cena feita pela Anatel terá muito pouco efetividade. A Anatel vai ter de se contentar com qualquer plano que as empresas quiserem apresentar. E o papel, como se sabe, aceita tudo”.
Ainda assim, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, se diz contrário à instalação da CPI e credita a responsabilidade à Anatel para resolver o problema. O senador Walter Pinheiro também não tocou em mudança na legislação nem na sigla CPI, em artigo intitulado “Solução para a telefonia móvel” (FSP, 19/08/2012). Para o senador, a Anatel deve ser cobrada a fim de aplicar o compartilhamento da rede, compatibilidade de frequências (a linha utilizar diferentes faixas do espectro) e eliminação dos dois dígitos específicos de cada operadora. Essas medidas, para ele, já qualificariam o setor, se somadas a uma ação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica a fim de evitar práticas de concentração e os obstáculos para universalização.
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