terça-feira, 7 de agosto de 2012

Começa julgamento do assassinato de jovem militante da esquerda argentina


Começa julgamento do assassinato de jovem militante da esquerda argentina

Morte de Mariano Ferreyra, um jovem militante do Partido Obrero que morreu vítima de um tiro no abdômen durante protesto em 2010, provocou uma comoção na opinião pública, e gerou um antes e um depois na relação entre os sindicatos, o poder político e os negócios. Para o Governo de Cristina Kirchner também foi um duro golpe. Entre os 17 acusados no processo, estão sindicalistas, policiais e integrantes de torcidas organizadas

Buenos Aires - Na manhã do dia 20 de outubro de 2010, um grupo de militantes de esquerda e lutadores sociais tentou cortar as vias de trem da linha Gral. Roca em protesto pela situação dos trabalhadores e pela regularização laboral dos terceirizados da empresa de trens. Ao chegar à estação Avellaneda, outro grupo, este da União Ferroviária Sindical – trabalhadores da empresa - os dissuadiu. Quando a marcha decidiu se separar, o grupo da UF, apoiado por torcidas organizadas de futebol e em coordenação com a Polícia Federal, que havia liberado a zona, avançou com máxima violência e disparou sobre o grupo.

Mariano Ferreyra, um jovem militante do Partido Obrero recebeu uma bala calibre 38 em seu abdômen. Durante longos minutos esteve no chão, sem assistência médica, até que uma ambulância privada que passava pelo setor o auxiliou. Mariano morreu a caminho do hospital. A investigação posterior determinou que o jovem teria se exposto para proteger seus companheiros. Além de Ferreyra, outros militantes foram feridos com balas do mesmo calibre: Elsa Rodríguez recebeu um disparo na cabeça que a manteve em coma, mas conseguiu sobreviver. Pablo Pintos e Nelsom Aguirre também foram baleados. 

O assassinato de Ferreyra provocou comoção na opinião pública, e gerou um antes e um depois na relação entre os sindicatos, o poder político e os negócios. Foi também um ponto de inflexão para que a reivindicação dos trabalhadores terceirizados fosse conhecida publicamente. Para o Governo de Cristina Fernández de Kirchner também se tratou de um duro golpe. Desde 2003, quando Néstor Kirchner assumiu a presidência, os protestos sociais haviam se transformado em um direito inalienável e carente de qualquer repressão. O golpe teria sido tão duro que teria provocado uma deterioração na saúde do ex-presidente.

O julgamento do crime que vitimou Mariano Ferreyra - que começou segunda-feira (6) no Tribunal Oral n°21 de Comodoro Py - é histórico. Em apenas dois anos, a investigação conseguiu acumular todos os dados que dão conta da participação dos 17 acusados, entre sindicalistas, policiais e integrantes de torcidas organizadas -, dez dos quais estão presos. É também um julgamento com um enorme peso simbólico. 

O principal acusado é um histórico dirigente do grêmio ferroviário, José Pedraza, uma referência da burocracia sindical, que aparece na causa como instigador do ataque. Pedraza é secretário geral da União Ferroviária desde 1994; desde 1984 foi secretário administrativo do sindicato. Durante sua gestão, favoreceu as privatizações nos anos noventa e o saque das empresas de trens.

Segundo fontes judiciais, as audiências públicas poderão durar mais de seis meses e tentarão estabelecer como foi a coordenação entre os 17 acusados que terminou com a vida do jovem militante de esquerda. Além de Pedraza, está sendo acusado seu número dois, Juan Carlos “Gallego” Fernández; sete ferroviários e um barra brava que compunham o grupo de choque, além de sete policiais, três deles delegados, encarregados de liberar zona. Todos os acusados podem receber penas por homicídio qualificado e prisão perpétua. A juíza será María Luz Jalbert.

O ataque, revelaria posteriormente a investigação, pretendia “aliciar” os trabalhadores terceirizados para que deixassem de insistir em suas reivindicações. A força de choque atuava com um “plano criminoso”, desenhado por Pedraza, que via ameaçado seu poder com o ingresso à empresa de trabalhadores subcontratados. O lado político deste crime foi visível desde o primeiro dia e as provas poderão ser conhecidas no julgamento oral que começa hoje. 

Segundo os advogados do CELS, que representam os denunciantes, por trás do assassinato de Mariano Ferreyra há uma tentativa de defender um modelo de sindicalismo empresarial. Maximiliano Medina, um dos advogados, sustenta que Pedraza utilizou seu papel de dirigente sindical para fazer negócios, “sem essa liderança não poderia continuar a fazê-los e o ingresso de uma massa de terceirizados gerava um perigo concreto para esses benefícios”. Alberto Bovino agrega que “o plano dos ferroviários não podia ser concretizado sem a atuação dos policiais, são partícipes do homicídio”. 

A advogada María del Carmen Verdú (da Coordenadora contra a repressão Policial e Institucional) sintetiza: “Houve um plano criminoso, orquestrado por empresas, Estado e burocracia sindical, onde cada um teve uma tarefa definida”. Verdú representa os feridos junto com a advogada do Partido Obrero, Claudia Ferrero. “Esperamos que apliquem à Pedraza a pena perpétua e castigos a todos os acusados. Uma pena ao autor intelectual seria um marco para a história argentina e do movimento operário, em favor da luta contra a burocracia sindical. Este julgamento mostrará o envolvimento do sindicalismo empresarial com o Estado, através do manejo dos subsídios e das ferrovias”, disse Ferrero.

As implicações sociais e políticas do julgamento pelo crime contra Mariano Ferreyra gerarão um precedente, já que põe em discussão um modelo econômico, os métodos do sindicalismo e até o papel das forças de segurança. 

Organizações sociais se encontraram na manhã de segunda nos arredores do tribunal para testemunhar seu repudio a este crime e seguir de perto os debates do julgamento público. 

Tradução: Libório Junior

Nenhum comentário:

Postar um comentário