segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Corte de água e luz tenta forçar saída de vizinhos do Itaquerão


Comunidade está situada em trecho que abrigará o Parque Linear Rio Verde, obra complementar para a Copa 2014
15/08/2012
Jorge Américo,
de São Paulo, da Radioagência NP
   
   Comunidade da Paz - Foto: Jorge Américo
As famílias que vivem na Comunidade da Paz, a 500 metros de distância do futuro estádio do Corinthians (Itaquerão), no bairro paulistano de Itaquera, sofrem pressão para deixar o local. Os moradores relatam que não receberam nenhum comunicado oficial sobre possíveis remoções. No entanto, a água e a luz foram cortadas há mais de três meses.
A comunidade está situada em um trecho que abrigará o Parque Linear Rio Verde. Essa é um das obras complementares que deverão preparar a região para receber jogos da Copa 2014. Somente esses projetos demandam gastos de R$ 480 milhões.
Os moradores mais antigos vivem na comunidade há mais de 20 anos. É o caso de Cícero Jailson Ponciano da Silva. Em entrevista à Radioagência NP, ele afirma que as autoridades públicas promovem ações indiretas para expulsar as famílias sem precisar pagar indenizações. Entre os ataques sofridos está o corte no fornecimento de água e luz.
A consequência mais trágica foi um incêndio, possivelmente provocado por uma vela, no último dia 16 de julho. O acidente resultou na morte de um morador e destruiu seis casas.

Radioagência NP: Jailson, como está o diálogo com o poder público? Vocês já foram informados que serão removidos?
Cícero Jailson Ponciano da Silva: A gente soube por meio de jornal e da televisão. De concreto, o poder público ainda não falou nada pra gente. Como não tem expectativa para aonde a gente vai, fica aquela apreensão, sempre pensando no que vai acontecer porque não tem proposta nenhuma. Como esse subprefeito [Paulo Cesar Máximo] teve a capacidade de mandar cortar a energia da gente, vai saber se ele vai chegar aqui com as máquinas para derrubar tudo em cima da gente.

O que vocês esperam que seja feito?
Esperamos ser tratados como cidadãos que pagam impostos. Apesar de viver na favela, ninguém está aqui porque quer ou porque gosta, mas por falta de oportunidades. Então, espero que eles olhem pra gente por essas condições e deem moradia - que troquem moradia por moradia - e dêem condições melhores para que a gente possa viver melhor em outro lugar sem precisar construir outra favela.

Agora comente a situação da água e da luz.
A luz foi o subprefeito de Itaquera que mandou cortar. Chegou a Eletropaulo escoltada pela Polícia e cortou. Ficamos sabendo pelo [José] Cavaletti, superintendente da Eletropaulo, que foi ele que mandou cortar. Já a água, quando começaram a fazer a construção do Parque Linear, cortaram também. Jogaram concreto em cima [da nascente] sem dar explicação para ninguém. Agora só com racionamento, alguém precisa desligar [fechar a torneira] para chegar água na casa do vizinho. Para muita gente, só chega água 1h da manhã. Essa água vem da nascente do córrego e já chega aqui na comunidade super fraca.

Como ocorreu o incêndio?
Deixaram o morador sem luz e ele usou vela, que encostou na madeira. Ele acabou adormecendo, esqueceu a vela acesa e queimou o barraco.

Então essa tragédia tem tudo a ver com o corte de energia?
Tem tudo a ver. E é uma coisa fácil de resolver. O Cavaletti veio aqui, tirou foto e disse que existia o risco eminente de incêndio, que qualquer hora teria um incêndio aqui.

Em geral, como os moradores veem a possibilidade de ter um jogo da Copa aqui do lado?
Nós enxergamos como positivo, mas os nossos governantes não enxergam assim. Eles mostram o campo, mas não mostram as pessoas que eles estão expulsando dessa área. Mostram só a beleza, o futuro, as coisas boas que serão trazidas para eles. Já o outro lado da moeda eles escondem. Por que não mostram o sofrimento que a gente passa também? Vêm os repórteres de fora do Brasil e lá eles só mostram beleza, a grandiosidade das obras que vão fazer. Nós somos vizinhos do estádio e eles estão escondendo isso.

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