quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Qual o peso do voto religioso nestas eleições?


  31 DE AGOSTO DE 2012

Elton Flaubert investiga pesquisas eleitorais e polemiza: evangélicos tem muito menos influência nas urnas do que convencionalmente se pensa
Por Elton Flaubert, no Razão Crítica
Desde as eleições presidenciais de 2010, o debate a cerca da relação entre religião e política ganhou impulso. Não raro, ele destemperou-se. Não faltaram aqueles que em nome do “Estado laico” (sob uma acepção ideológica e pouco rigorosa) quiseram calar a boca dos religiosos, revelando uma concepção ingênua (na verdade, tosca) da re-ligação encarada como pura fé, sem considerar os aspectos simbólicos, construídos a partir da consciência da inverdade e da incompletude, como reconquista da tentativa por certeza na busca pela transcendência, ou até mesmo, encarada sociologicamente, como sentido que constrói uma sociedade (ordem) dando cabo a sua existência (afinal de contas, o ocidente e a democracia liberal não existiriam sem a cristandade); ou, por outras vias, aqueles que instrumentalizaram a mais genuína experiência de “unidade na multiplicidade”, por questões partidárias ou financeiras (ou mesmo por falta de preparo teológico, político e filosófico), bagunçando a linha tênue que separa o público do privado.
 Deixando de lado o som e a fúria dos que não sabem conviver com limites ou aporias, justamente pela falta de entendimento de que a estrutura ontológica do mundo sensível é bipolar, podemos constatar pelas pesquisas eleitorais que o peso do “voto religioso” é superestimado. Se formos olhar as pesquisas já analisadas por este blog, encontraremos alguns dados que nos guia nessa afirmação.
Em Curitiba, na última pesquisa Datafolha, os três principais candidatos, Ratinho Jr., Luciano Ducci e Gustavo Fruet, possuem, respectivamente, 27%, 23% e 21%. Olhando em detalhes os dados, verificamos que acima de 10% se encontram apenas dois grupos: católicos (57%) e evangélicos pentecostais (20%). Deixamos de lado opções abaixo de 10% por representar camadas muito específicas e com margem de erro ampliada. Entre os católicos e evangélicos, temos:
Ratinho Júnior (PSC) – 26% – 31%
Luciano Ducci (PSB) – 25% – 27%
Gustavo Fruet – 23% – 20%
Ratinho Júnior, considerado um candidato forte entre os evangélicos, cresce cinco pontos em comparação com os católicos. Apesar disso, é preciso considerar que, segundo a mesma pesquisa, os evangélicos são proporcionalmente mais numerosos entre os mais pobres (carro-chefe do candidato do PSC). Como avaliar, então, se este voto é devido a questões sociais ou religiosas? Se formos avaliar a diferença de votos entre os candidatos, iremos verificar que a diferença de votos dados dos mais pobres aos mais ricos ao candidato do PSC é de vinte pontos, enquanto, de uma religião para outra é de cinco. Além disso, o voto dado pelos evangélicos ou católicos são praticamente proporcionais aos votos dados no geral. Ou seja, nenhum candidato tem um ganho ou perda significativa entre o tão propalado “voto evangélico”. Outra prova é que: Gustavo Fruet que tem um desempenho ruim entre os mais pobres e menos escolarizados, varia três pontos negativamente dos católicos para os evangélicos.
Minha hipótese é de que a religião e a opinião de seus líderes tem algum impacto entre os fiéis, mas bem menor do vem sendo falado (inferior a qualquer curral eleitoral do sertão nordestino), pelo menos, em campanhas majoritárias. Pegando o exemplo de Recife (no geral, Humberto tinha 35%, Mendonça 22%, Daniel 8% e Geraldo Júlio 7%), iremos verificar pela última pesquisa Datafolha, o seguinte percentual de votos entre católicos (45%), evangélicos pentecostais (22%), e evangélicos não pentecostais (11%) :
Humberto Costa (PT) – 36 % – 34% – 38%
Mendonça (DEM) – 25% – 21% – 27%
Daniel Coelho (PSDB) – 9% – 7% – 6%
Geraldo Júlio (PSB) – 5% – 7% – 6%
Percebe-se mais uma vez que a movimentação entre religiões é muito pequena, ao contrário, do nível de escolaridade e da renda familiar mensal, que não raramente nos mostra um candidato liderando no topo e outro liderando na base. Humberto, que seria o candidato teoricamente rejeitado pelos evangélicos, tem seu pior desempenho neste segmento, mas variando apenas 1% (dentro da margem de erro) do seu percentual geral.
Em São Paulo (segundo a última pesquisa Datafolha, Russomano tinha 31%, Serra 27%, Haddad 8% e Chalita 6%), onde teoricamente Celso Russomano é um candidato fortíssimo entre os evangélicos, e o candidato do PT, Fernando Haddad, enfrenta oposições, os números variam muito pouco. Vejamos os resultados entre os católicos (51%) e evangélicos pentecostais (21%):
Celso Russomano (PRB) – 31% – 38%
José Serra (PSDB) – 28% – 25%
Fernando Haddad (PT) – 7% – 6%
Gabriel Chalita (PMDB) – 8% – 4%
Russomano confirma seu favoritismo entre os evangélicos, com sete pontos a mais do seu desempenho geral, mas longe de um favoritismo tão amplo quanto se imaginava, até mesmo por que o candidato já parte de um partido ligado a uma destas igrejas. Enquanto, Fernando Haddad varia apenas um ponto negativamente neste segmento. Mais uma vez, a religião mostra sua influência, mas em nível muito menor do que outras variáveis.
No Rio de Janeiro (pela última pesquisa Datafolha, Paes tinha 54%, Freixo 10% e Maia 6%), temos um exemplo importante. Vejamos os resultados entre os católicos (45%), evangélicos pentecostais (21%):
Eduardo Paes (PMDB) – 56% – 55%
Marcelo Freixo (PSOL) – 10% – 5%
Rodrigo Maia (DEM) – 7% – 9%
Podemos reparar que Rodrigo Maia e Eduardo Paes praticamente não variam de um segmento para outro. Embora o demista tenha seu melhor rendimento entre os evangélicos (com era o esperado), sua taxa varia dentro da margem de erro. Em compensação, Marcelo Freixo cai cinco pontos entre evangélicos pentecostais, mas é bom lembrar que o candidato tem um desempenho pior entre os mais pobres, que proporcionalmente compõe mais essa faixa do que entre os católicos, repetindo o caso de Curitiba.
Acredito que o “voto religioso” tenha influência, mas em escala muito limitada, decisiva apenas em eleições majoritárias apertadíssimas. É comum, por exemplo, termos um candidato à frente entre os do topo social, e outro liderando na base. Assim, quando um líder religioso, como Silas Malafaia, alardeia aos quatro ventos que irá derrotar o candidato do PT em São Paulo, está julgando ter mais força do que pensa, jogando psicologicamente com a inabilidade política dos nossos “estadistas”, e faturando politicamente acima do que deveria. As pesquisas de intenção de voto nos mostram que outros fatores têm sido mais decisivos, como: renda salarial mensal, nível de escolaridade, avaliação da atual gestão, propostas para resolver problemas urgentes da cidade.
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