Foto: Brooke Anderson
Os conflitos e problemas apresentados em Sídon, como os conflitos sectários de extremismo religioso, corrupção, violência, pobreza entre outros, vem denegrindo a imagem e a reputação de uma das cidades históricas, milenares e mais notórias do Líbano. Diante de tantas coisas ruins que vem acontecendo sucessivamente em Sídon, ninguém se lembra de mencionar que a maioria de seus cidadãos, são pessoas educadas, gentis, atenciosas, hospitaleiras, e que buscam uma vida melhor, mais calma, mais pacífica e tranquila, na antiga cidade fenícia.
Pensando nisso, o sidônio Ali Khalifeh há seis meses desenvolveu um projeto, para mostrar o lado positivo e bom da cidade e de seus cidadãos, para tirar a estigma de que a cidade é um lugar ruim e com pessoas violentas. A princípio, ele começou a fazer vídeos promocionais para a Saida TV, mas depois, a ideia de Khalifeh cresceu, e se transformou num projeto muito maior, aonde ele vem arduamente trabalhando para mostrar o lado mais humano de sua cidade natal, onde ele registra as experiências de pessoas comuns, simples da cidade.
O projeto, que ele chama de “maioria silenciosa”, e que virou uma série no Youtube, intitulada “Seu direito de dizer, o direito de saber (حقك تحكي، حقك تعرف)”, revela de forma simples e carinhosa o que acontece no coração da cidade, por meio de sua população, mas não a população que aparece nos noticiários inflamados da TV, envolvidas em casos de violência e ocorrências ruins. O estudante de 22 anos, da Universidade Internacional Libanesa, considera-se afortunado por estar em uma fase de sua vida, onde ele não tem a responsabilidade de sustentar uma família, e poder se concentrar em um ativismo pacífico pessoal, e que ainda lhe trás recompensa financeira.
Khalifeh afirma que não é fácil realizar manter um projeto baseado em vídeos na internet, num país onde a conexão é lenta e cara, e por conta disso, ele considera os milhares de acessos por episodio, um sinal positivo, principalmente pelo baixo orçamento usado em seu projeto. Desde o início, ele já lançou 18 episódios, sendo 2 a 3 vídeos por mês, cada um com 15 minutos de duração, que abordam diversos temas específicos da cidade, que a mídia libanesa (do ponto de vista humano) já se esqueceu, por conta da constante associação da cidade em noticiários negativos, que apenas abordam os conflitos sectários e violentos, movidos por extremismo religioso.
O que não significa que os vídeos de Khalifeh sejam lúdicos e fictícios, de forma alguma, ele aborda como temas dos episódios, os problemas sociais da cidade, mas revelados não por emissoras de TV profissionais, entrevistando autoridades da cidade. Suas filmagens são feitas por uma equipe de duas pessoas, com ocasionais free-lancers que esporadicamente contribuem com seus serviços, de forma amadora, mas natural; e ele dá voz às pessoas que nunca são ouvidas: o povo humilde da cidade.
A trilha sonora da música popular árabe ajuda a dar vida à paisagem cotidiana, que possa passar despercebida em Sídon, e não há espaço para tédio nos vídeos, que saltam rapidamente de uma cena para outra, muitas vezes, com o som de suspense ou tambores ecoando.
Por exemplo, num segmento, um jovem pobre palestino do campo de Ain Al-Hilweh conta sua historia sobre ser detido e interrogado por um crime que ele não teve nada a ver, mostrando um lado diferente da situação, e mostrando, sem vergonha a sua realidade em ser pobre, porém, conversando de forma, calma e educada. Na sequência, entre a história de um pescador simples, que passou toda sua vida pescando para sobreviver, fala sobre a interferência política e o suborno mafioso no porto de Sídon, explicando do seu jeito, como ele foi injustiçado ao procurar o presidente do Sindicato dos Pescadores de Sídon, e como ele foi confrontado com outro candidato por outro candidato que teve apoio de um dos principais partidos políticos do país.
O projeto também mostra em outro episodio, como funciona um dia de pesca no mar, revelando como é a vida de homens que passam seus ofícios de geração a geração, onde os mais velhos ensinam meninos, que afirmam amar fazer o trabalho que fazem, enquanto um pescador começa a discursar sobre a corrupção do governo no porto, afirmando que não tem medo de denunciar, porque ele quer mais é que os políticos vejam como eles vivem, para dar aos pescadores os seus direitos.
Khalifeh explica que as pessoas não sentem medo de reclamar diante das câmeras, sobre a corrupção do governo, porque o maior medo dos políticos é a mídia (e quando esta se coloca ao lado do povo, o seu poder fica mais amplo, e mais fortalecido), e eles temem as vozes independentes que não são politicamente filiadas.
O episodio mais popular do projeto de Khalifeh, com mais de 14 mil visitas, os moradores de Abra, falam sobre a destruição de suas casas, que foram carbonizadas pelos bombardeios ocorridos no último mês, durante os confrontos entre o Exercito Libanês e o clérigo salafista Ahmad Assir e seus seguidores.
Khalifeh foi criticado por não ter entrevistado apoiadores de Assir, porém, ele respondeu que eles já estavam muito bem representados pelos meios de comunicação, e que seu intuito era contar as histórias de pessoas comuns, que foram envolvidas sem qualquer participação na violência ocorrida.
Pessoas que não apareceram nas mídias de TV, pessoas silenciosas, que não foram percebidas ou ouvidas por ninguém... São essas pessoas que o interessam, e o motivam a ligar a sua câmera, para que elas possam se expressar livremente, sem qualquer interferência ou manipulação...
Se você tiver interesse em ver os vídeos feitos por Khalifeh, clique aqui:
Claudinha Rahme
Gazeta de Beirute
Leia Mais: http://www.gazetadebeirute.com/2013/07/libanes-cria-projeto-que-mostra-outro.html#ixzz2aUGq1vd1
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