domingo, 14 de julho de 2013

Onde foi parar o processo de sonegação da Globo?

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Funcionária da Receita acusada de fazer desaparecer documentação.

Paulo Nogueira
O caso da sonegação da Globo tende a se tornar um marco na história nacional.
Dadas as informações que vão surgindo – tudo fora da mídia corporativa, aliás – é difícil acreditar em impunidade, mesmo se tratando da Globo com sua poderosa, quase indestrutível rede de amigos, de influência, de represálias e de intimidação.
A mais recente informação veio da internet, pelo twitter de Edu Goldenberg (@edugolbenberg).
E é uma paulada.
Segundo um documento vazado por Goldenberg, uma funcionária da Receita Federal, Cristina Maris Meinick Ribeiro, simplesmente sumiu com o processo em que a Globo é acusada de trapaça fiscal na aquisição dos direitos de transmissão da Copa de 2002.
Segundo os relatos, ela está respondendo à justiça em liberdade por uma decisão atribuída ao ministro do STF Gilmar Mendes.
Papeis da Receita, veiculados pelo blog O Cafezinho, mostraram que a Receita pilhara a Globo numa manobra em que a aquisição dos direitos da Copa foi tratada como investimento no exterior.  Com isso, a Globo não pagou o imposto devido no Brasil – e sim o do paraíso fiscal em que a falsa operação foi realizada, as Ilhas Virgens.
Em 2006, o valor que a Globo tinha que pagar batia em 615 milhões de reais.
Divulgado o caso, a Globo ignorou primeiro, tergiversou depois e só reconheceu o problema quando o UOL entrou em ação (para depois, misteriosamente, abandonar a história).
Numa nota, a empresa afirmou ter pago multa à Receita.
Mas então a fonte da Receita que passara a informação ao Cafezinho veio com uma nova bomba: disse que a Globo na verdade jamais pagou a multa e nem nada dos 615 milhões assinalados. “Se pagou, mostra o darf”, desafiou a fonte.
Darf é o recibo da Receita.
Como certos cadáveres de romances policiais, o darf da Globo jamais apareceu, e esta informação ficou limitada aos sites jornalísticos, o Diário incluído.
A grande mídia não compareceu a um assunto de claro, torrencial interesse público.
Considere.
Uma escola com uma área de 10 mil metros quadrados, e 5,2 mil metros quadrados de área construída, custa cerca de 4 milhões de reais. Este custo inclui 12 salas de aula, laboratórios multidisciplinares e de informática, salas de arte e de vídeo, biblioteca, auditório, praça central e quadra esportiva coberta.
Você poderia construir mais de 150 escolas públicas desta com a sonegação da Globo – naquele e apenas naquele episódio da Copa.
E então chegamos ao interesse público.
No Brasil, o sigilo fiscal é um desdobramento da proteção à intimidade.
A Constituição diz no artigo 5º, X: “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas”. (Tudo aquilo que a mídia infringe constantemente contra seus adversários, e impunemente.)
Os tribunais, incluído o STF, entendem que este direito não é absoluto. O sigilo pode e deve ser rompido quando o caso é de “preponderante interesse público”.
“A proteção aos sigilos bancário e fiscal não é direito absoluto, sendo que os mesmos podem ser quebrados quando houver a prevalência do direito público sobre o privado, na apuração de fatos delituosos ou na instrução dos processos criminais, desde que a decisão esteja adequadamente fundamentada”, disse o STJ numa decisão.
O Ministério Público teria que pedir a quebra do sigilo no caso da Globo. Mas, pelo menos até aqui, não pediu – e este é um dos pontos que devem ser também devidamente esclarecidos.
Não que o MP não faça este tipo de coisa.
Eis um trecho de uma notícias no site do STJ: “No último mês de setembro, o ministro João Otávio de Noronha acatou parcialmente a manifestação do Ministério Público e retirou o sigilo, em parte, do Inquérito n. 681, que investiga denúncia de desvio de verbas públicas no estado do Amapá, fato esse apurado pela Polícia Federal na Operação Mãos Limpas.”
Ao acolher o pedido do Ministério Público, nesta fase de investigação, o ministro João Otávio ressaltou que, com a realização das buscas e apreensões e as prisões, o caso caiu em domínio público, “e a imprensa tem noticiado fatos com restrição de informações, o que enseja a distorção delas”.
Tudo isso – incluídas as distorções pela falta de informações oficiais – demandaria a quebra do sigilo fiscal neste caso da Globo.
Recentemente, quando o presidente do Bayern de Munique foi flagrado numa sonegação pelo uso de paraíso fiscal, o governo alemão explicou assim o rigor empregado (ele teve que pagar uma fiança de 15 milhões de reais para escapar da prisão): “Nenhum país pode funcionar quando as pessoas imaginam que podem fazer aquele tipo de coisa sem consequência.”
Neste particular, o que vale para a Alemanha vale – integralmente – para o Brasil.

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