domingo, 7 de julho de 2013

Sobre Pecado, Moral, Felicianos e Malafaias – breve exercício retórico



Marcos Jungmann
Adital

O professor Dr. Oneide Bobsin, reitor das Faculdades EST, em um encontro de formação pastoral da Pastoral Popular Luterana em São Leopoldo, levantou para os presentes a necessidade de, hoje em dia, desmoralizarmos o pecado. Certo das diversas interpretações que tal sugestão pode levar, fiquemos com a aparentemente mais simples: a de desassociar a prática do pecado de espectros morais, ou vice-versa. Pois, se bem atentarmos, é sobre essa ligação entre pecado e moral que se fundamenta toda a discussão evangelical sobre homossexualidade. O argumento é simples: homossexualidade é imoral e, logo, é pecado e, logo, deve ser combatida. Não se trata de doença! –Feliciano e Malafaia destacam muito atentamente esse ponto– não sendo passível de se sugerir uma "cura gay”, como os opositores oportunistas da mídia insinuam!
Pelo contrário, ambos os pastores/especialistas no assunto –um deles, inclusive, psicólogo– trabalham com a ideia de que a homossexualidade é um comportamentoe, sendo assim, pode ser modificado. De fato, na clínica de terapia cognitivo-comportamental, é possível seguir um tratamento breve e focal com o objetivo de abandonar certos vícios, transtornos de ansiedade, compulsões e, por que não, práticas homossexuais? Assim, não se é necessário conceber homoafetividade como doença para haver um tratamento, mas simplesmente como um conjunto de comportamentos indesejados pelo cliente que podem ser aos poucos abandonados. O que haveria de errado nisso?
De fato, o projeto popularmente denominado "cura gay”, reforça tais posições. Seu parecer, aprovado pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal em 18/06/2013, sustou o parágrafo único do artigo 3º e integralmente o artigo 4º da Resolução do Conselho Federal de Psicologia 1/99. Estes vetavam os psicólogos de colaborarem com "eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades” e de participarem ou se pronunciarem publicamente "nos meios de comunicação de massa de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica” (ver Resolução 1/99 de 23/03/2013 do CFP).
Duas posições são mobilizadas para justificar tal legitimidade. Em primeiro lugar, o direito inalienável da pessoa de, livremente, procurar um "tratamento”. Em segundo, o pressuposto de que tais comportamentos gerariam uma angústia interna no indivíduo. Segundo o vídeo de Marcos Feliciano(1), presidente da referida Comissão, seria essa angústia interna, essa dor que o homoafetivo carrega dentro de si que o moveria à procura da ajuda psicológica. E atenção: a busca pelo tratamento seria em decorrência da angústia e não pela homossexualidade ser uma doença! Tratar-se-ia, ainda, poderiam argumentar, de uma questão de direitos humanos. Seria correto lhe negar tratamento?
Mas, como chegamos na moral e no pecado? Pensemos em um eventual interessado em não mais desempenhar comportamentos homossexuais por serem impuros, sujos, desprezíveis e, finalmente, pecaminosos. E a pessoa, reconhecendo-se como pecadora ou suja, procura ajuda –o pastor, por exemplo– que o admoesta a procurar acompanhamento psicológico para tratar esses comportamentos e desejos que tanto lhe causam angústia.
Contudo, será que tais angústias, de que fala Feliciano, ainda existiriam se ele, Malafaia e outros expoentes do evangelicalismo simplesmente parassem de dizer que ele está em pecado, que, segundo a Bíblia, ele não herdaria o Reino dos Céus; ou cessassem de promover, por meio de processos muitas vezes difusos e indiretos, sua exclusão da comunidade da qual faz parte?
No final das contas, o que fica é o papel normativo da sociedade e da Igreja quanto à homoafetividade. Não é doença e, logo, não se trata de cura gay; mas, é pecado, e pecado deve ser eliminado, combatido... E o argumento teológico-cognitivo-comportamental de Silas Malafaia e Marcos Feliciano é o de combater a angústia individual do pecado em posse do jovem através do tratamento psicológico. Esquecem-se, contudo, que o gerador dessas angústias foram as mesmas instituições que formaram esse jovem: igreja, escola, família. Todas essas, quando não promovem a aceitação integral e radical de seus jovens/membros homoafetivos ou em processo de formação de sua identidade homoafetiva, são as verdadeiras pecadoras. Pois excluem e geram dor e depois, hipocritamente, lutam pelo direito ao acesso ao tratamento psicológico para resolverem a angústia que eles mesmos introduziram.
Nota:
(1) http://www.youtube.com/watch?v=LcClBBNeczc

Nenhum comentário:

Postar um comentário