Gilmar Mendes se sente confortável em expor seu rancor não apenas com os apenados, mas também com os que se atrevem mostrar solidariedade tácita.
Não bastassem suas usuais provocações ao PT, ao governo do PT, aos líderes do PT, aos petistas presos no suspeitíssimo julgamento da AP-470, ainda acha por bem tripudiar sobre as centenas de pessoas que voluntariamente fizeram doações para ajudar no pagamento de multas judiciais devidas por José Genoíno e Delúbio Soares.
E até ao senador Eduardo Suplicy, que lhe enviara carta aberta cobrando explicações por suas descabidas declarações, não se faz de rogado e lhe responde com o veneno da ironia mal digerida pelo fígado: “Tenho certeza, senador, que o senhor seria dos primeiros a apoiar uma vaquinha para levantar os R$ 100 milhões de prejuízos causados pelo mensalão”.
Coloca sob suspeição todos os doadores, considera um escárnio que exista pessoas doando para os “mensaleiros”, facilitando assim que estes não sejam punidos com os rigores próprios a quem “pratica malfeitos” e por aí segue sua estranha cantilena, uma mistura de ressentimento político, militância antigoverno e antiPT e frustração com um julgamento que parte da população considera ter viés claramente político e não jurídico.
Se Gilmar Mendes se sente confortável em expor seu rancor não apenas com os apenados, mas também com os que se atrevem mostrar solidariedade tácita, verbal e financeira com esses mesmos apenados, como seria sua reação – e a reação de alguns dos seus pares que como ele pensam e também a reação dos meios de comunicação que usualmente potencializam a ira do ministro do STF?
Se é legítimo que Gilmar Mendes assim proceda, renegando o perfil de sobriedade e discrição que tanto se espera de um magistrado de Corte Suprema, não seria legítimo que outros ministros da mesma instituição se sentissem à vontade para lhe fazer o contraponto – defendendo o direito dos mensaleiros a terem uma execução da pena de maneira justa, a receberem a solidariedade de seus amigos, militantes de partido, simpatizantes de suas ideias políticas, seja em comentários nas redes sociais da Web, seja em artigos publicados em jornais e revistas impressos, seja contribuindo financeiramente para o pagamento das multas que lhe foram impostas?
Se é legítimo que Gilmar Mendes conclua que, pela rapidez com que os valores das multas foram arrecadados por José Genoíno e Delúblio Soares, tais valores foram levantados de maneira espúria, não seria também legítimo que algum outro colega seu na Suprema Corte chegue à conclusão que tais contribuições financeiras estão absolutamente dentro do arcabouço jurídico e legal e mais, se sintam mesmo à vontade para... terem também ajudado com sua própria doação, assim como o fez (e divulgou) o antigo presidente do STF Nelson Jobim?
Se o modo Gilmar Mendes de proceder vira ‘modismo’ dentre os magistrados brasileiros, será que tais declarações, acintosas em sua essência e objetivos, não poderiam ter como contraponto declarações de outros magistrados em direção diametralmente opostas?
Ante o silêncio obsequioso dos meios de comunicação tradicionais, aqueles que pertencem majoritariamente a não mais que meia dúzia de famílias, o que poderia se esperar caso o mesmo Gilmar Mendes mudasse radicalmente de opinião e fizesse questão de defender os “mensaleiros”, se inssurgisse contra qualquer de seus pares que ousasse desqualificar apenados da AP-470 como José Genoíno, Delúbio Soares, João Paulo Cunha, José Dirceu?
Estamos testemunhando uma época difícil para o funcionamento regular do STF, e os sinais disso poderiam facilmente ser escrutinados com o comportamento de seu atual presidente Joaquim Barbosa:
- - desqualifica seus pares em diversas oportunidades em que estes tenham posição jurídica divergente da sua;
- - manda que jornalista que deseja lhe entrevistar “vá chafurdar no lixo”;
- - compra apartamento em Miami (EUA) usando artimanhas contábeis para não pagar impostos, criando empresa para alcançar tal fim e oferecendo para esta empresa seu próprio endereço residencial, algo vetado na Lei da Magistratura do Brasil;
- - transforma a prisão de apenados da AP-470 em raro show midiático, transportando-os em voos das cidades em que residem para Brasília e somente depois, aos poucos, para as cidades onde deverão cumprir penas;
- - revoga de maneira monocrática decisões de presidente do STF em exercício (Ricardo Lewandowski), sem ao menos submeter tais ações ao plenário da Corte, como aliás estabelece o artigo 317 do regimento do STF;
- - viaja de férias sem assinar documento hábil para a prisão de um dos apenados (João Paulo Cunha);
- - deixa de mandar prender outro dos apenados (Roberto Jefferson);
- - vaza a um de seus pares (Marco Aurélio Mello) a intenção de se candidatar à presidência da República em outubro de 2014, em coroamento de um processo (AP-470) que ostenta todas as tintas do verniz partidário, onde atuou como perseguidor implacável dos réus e fustigou exatamente aqueles com quem pretende disputar o Palácio do Planalto.
Acima apenas vislumbres da crônica recente envolvendo o presidente do STF, mas crônicas não menos auspiciosas e nem airosas podem ser rapidamente elencadas tendo como protagonistas os ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Luiz Fux.
Esses juízes tem seus nomes e biografias relacionadas com temas espinhosos e de difícil justificação jurídica e moral: o Instituto de Direito Público (IDP), investigado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em convênios firmados com a Justiça na Bahia; os dois habeas-corpus concedidos a Daniel Dantas, o notório dono do Banco Opportunity; a denúncia de grampos falsos (e nunca comprovados) tendo como interlocutor o ex-senador Demóstenes Torres; as relações perigosas observadas para se alcançar a nomeação para o STF. E mais, muito mais.
Aos interessados não será preciso os préstimos de Edward Snowden: tudo consta dos arquivos da imprensa, acessíveis na internet ao alcance de meia dúzia de cliques.
Créditos da foto: Gervásio Baptista, STF
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