Adital
A empresa suíça produtora de transgênicos e agrotóxicos Syngenta foi judicialmente responsabilizada pelo assassinato do trabalhador rural Valmir Mota de Oliveira (conhecido como Keno) e pela tentativa de assassinato de Isabel do Nascimento de Souza. Os dois eram integrantes da Via Campesina e foram vítimas do ataque de seguranças particulares armados, em 2007.
A resolução, emitida pelo juiz de Direito Pedro Ivo Moreira, da Primeira Instância Civil, da localidade de Cascavel (Estado do Paraná, Brasil), foi publicada no Diário Oficial do Estado, nesta quarta-feira, 17 de novembro. A sentença determina que a empresa indenize os familiares de Keno e a vítima Isabel pelos danos morais e materiais que provocou. A ação foi julgada no ano de 2010, a fim de obter respostas do Estado em relação à responsabilidade da corporação Syngenta pelo ataque, realizado por uma milícia armada privada.
Para a Via Campesina, essa resolução é vista com bons olhos pelos movimentos sociais e organizações de direitos humanos, já que a responsabilidade das empresas que cometem violações dos direitos humanos é um desafio de ordem global. "Atualmente, as empresas transnacionais têm grande liberdade de atuação transnacional, mas não há normas nem mecanismos nacionais e internacionais suficientes para obrigá-las a respeitarem os direitos humanos ou para responsabilizá-las, em caso de violações. A condenação da Syngenta, neste caso, é uma exceção à regra”, explica o advogado da Terra de Direitos Fernando Prioste, que acompanhou o caso.
Sobre a decisão
O juiz reconheceu que o fato ocorrido na estação experimental da empresa Syngenta foi um verdadeiro massacre. Em sua decisão, afirma que "dizer que o ocorrido foi um confronto é fechar os olhos para a realidade, pois [...] não há dúvida de que o fato, na verdade, foi um massacre, com roupagem de reintegração de posse”. Com isso, a versão apresentada pela Syngenta foi rechaçada pelo Poder Judiciário. A empresa alegava que o ataque, ocorrido em 2007, seria resultado de um confronto entre seguranças privados e integrantes da Via Campesina.
Em sua defesa, a Syngenta reconheceu a ilegalidade da ação da segurança privada, assim como o cunho ideológico da ação contra a Via Campesina e o MST [Movimento dos Sem Terra]. A empresa afirmou que "mais do que a proteção desta ou daquela fazenda, fica claro que a guarda privada tinha por objetivo a defesa de uma posição ideológica, que se contrapunha àquela do MST, de modo a propagar a ideia de que, para cada ação, corresponde uma reação”. Com isso, a transnacional tentava evitar sua responsabilidade, alegando que o ataque não foi realizado pela empresa por ela contratada e, sim, por uma milícia a mando dos fazendeiros.
No entanto, em sua decisão, o juiz reconheceu que "a má eleição do serviço terceirizado de fornecimento de segurança, assim como o financiamento indireto das atividades ilícitas, constituem fato gerador de responsabilidade civil”. Além disso, reprovou com veemência o ataque realizado, ao afirmar que, "por mais reprovável e ilegítima que fosse a invasão à propriedade, não seria apropriado atuar por conta própria, impondo pena de morte aos ocupantes, e sim buscar os meios legais para a solução do conflito, afinal de contas, a lei considera delito o exercício arbitrário das próprias razões”. Portanto, a decisão judicial que condenou a Syngenta não somente afirma o cunho ideológico da ação miliciana, como também vincula a empresa a essa ação.
A decisão judicial, no entanto, não é definitiva. A Syngenta, por meio do seu advogado de defesa, Renne Ariel Dotti, poderá recorreu ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Para o advogado popular da Terra de Direitos Fernando Prioste, espera-se que o Tribunal mencionado mantenha a decisão, para restabelecer a verdade sobre os fatos ocorridos em outubro de 2007. "As provas são contundentes contra a empresa”, apontou. "Uma eventual absolvição da Syngenta significaria a cumplicidade do sistema judiciário com os massacres, como ocorreu neste caso”.
O representante do MST da região de Cascavel, Eduardo Rodrigues, destaca a importância da decisão. Segundo Rodrigues, é comum a impunidade das grandes empresas que violam os direitos, ao mesmo tempo em que é frequente que integrantes do movimento campesino sejam criminalizados por sua luta de oposição ao modelo do agronegócio. "O ataque não sucedeu sem o conhecimento da multinacional”, denunciou o agricultor. "Eles não deram somente o apoio institucional, e sim também o apoio financeiro e a logística”. Rodrigues disse desejar que a decisão seja estendida a outros casos de responsabilidade das empresas pelos ataques que perpetram.
Os obstáculos existentes para conseguir que as empresas respeitem os direitos humanos e sejam responsabilizadas pelas violações que cometem fez com que a Organização das Nações Unidas (ONU) passasse a debater o estabelecimento de um tratado internacional vinculante, que crie mecanismos de prevenção, reparação e responsabilidade ao tema "empresas e direitos humanos”. O grupo de trabalho da ONU, que desenvolve atividades para o estabelecimento deste tratado, visitará o Brasil no mês de dezembro próximo. "Espera-se que os representantes da ONU possam utilizar o caso da condenação da Syngenta como referência para a prestação de contas das grandes empresas que cometem violações aos direitos humanos, por meio de empresas terceirizadas”, pontua a Via Campesina.
Sobre o caso
No dia 21 de outubro de 2007, cerca de 40 pistoleiros da empresa "NF Segurança”, atacaram o acampamento da Via Campesina, localizado no campo de experimento com transgênicos da transnacional Syngenta, em Santa Tereza do Oeste (Estado do Paraná). Naquela manhã, o local havia sido reocupado por aproximadamente 150 integrantes da Via Campesina e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Os ocupantes denunciavam a realização de experimentos ilegais com milho transgênico na zona do Parque Nacional de Iguaçu. Os integrantes da Via Campesina também buscavam denunciar as empresas de biotecnologia, que atuam de forma a impor um modelo de agricultura, que gera danos ambientai, com a utilização indiscriminada de transgênicos e agrotóxicos, invisibilizando a produção de alimentos saudáveis para os camponeses, povos indígenas e povos e comunidades tradicionais.
Uma milícia fortemente armada da empresa "NF Segurança” invadiu o local, disparando em direção às pessoas que ocupavam o espaço. Segundo informações da Via Campesina, a ação havia sido promovida pela Syngenta, que utilizava os serviços da "NF Segurança”, em conjunto com a Sociedade Rural da Região Oeste (SRO), e o Movimento dos Produtores Rurais (MPR), vinculado ao agronegócio. Indícios apontam que a empresa de segurança seria uma fachada e contratava policiais, de forma ilegal, para as operações de ataque. Além de Keno, os atiradores dispararam contra Isabel e feriram outros três agricultores.
Detentora de 19% do mercado de agroquímicos e terceira empresa com maior lucro na comercialização de sementes no mundo, próximo às estadunidenses Monsanto e Dupont, a Syngenta, juntamente com outras transnacionais, agrava o cenário de violência no campo, com a imposição de um modelo de agricultura baseado no monocultivo, na superexploração do trabalhador, na degradação ambiental, na utilização de agrotóxicos e na apropriação privada de recursos naturais e genéticos.
Na área em que ocorreram os fatos, atualmente funciona o Centro de Pesquisas em Agroecologia Valmir Mota de Oliveira, "Keno”.
Sobre o tema da responsabilidade de empresas por violações de direitos humanos, a Terra de Direitos desenvolveu um guia para auxiliar na avaliação sobre possibilidades de litigar contra empresas, no âmbito internacional.
A resolução, emitida pelo juiz de Direito Pedro Ivo Moreira, da Primeira Instância Civil, da localidade de Cascavel (Estado do Paraná, Brasil), foi publicada no Diário Oficial do Estado, nesta quarta-feira, 17 de novembro. A sentença determina que a empresa indenize os familiares de Keno e a vítima Isabel pelos danos morais e materiais que provocou. A ação foi julgada no ano de 2010, a fim de obter respostas do Estado em relação à responsabilidade da corporação Syngenta pelo ataque, realizado por uma milícia armada privada.
O trabalhador rural Valmir Mota de Oliveira, conhecido como Keno, era integrante da Via Campesina e foi assassinado por seguranças particulares armados, em 2007. |
Para a Via Campesina, essa resolução é vista com bons olhos pelos movimentos sociais e organizações de direitos humanos, já que a responsabilidade das empresas que cometem violações dos direitos humanos é um desafio de ordem global. "Atualmente, as empresas transnacionais têm grande liberdade de atuação transnacional, mas não há normas nem mecanismos nacionais e internacionais suficientes para obrigá-las a respeitarem os direitos humanos ou para responsabilizá-las, em caso de violações. A condenação da Syngenta, neste caso, é uma exceção à regra”, explica o advogado da Terra de Direitos Fernando Prioste, que acompanhou o caso.
Sobre a decisão
O juiz reconheceu que o fato ocorrido na estação experimental da empresa Syngenta foi um verdadeiro massacre. Em sua decisão, afirma que "dizer que o ocorrido foi um confronto é fechar os olhos para a realidade, pois [...] não há dúvida de que o fato, na verdade, foi um massacre, com roupagem de reintegração de posse”. Com isso, a versão apresentada pela Syngenta foi rechaçada pelo Poder Judiciário. A empresa alegava que o ataque, ocorrido em 2007, seria resultado de um confronto entre seguranças privados e integrantes da Via Campesina.
Em sua defesa, a Syngenta reconheceu a ilegalidade da ação da segurança privada, assim como o cunho ideológico da ação contra a Via Campesina e o MST [Movimento dos Sem Terra]. A empresa afirmou que "mais do que a proteção desta ou daquela fazenda, fica claro que a guarda privada tinha por objetivo a defesa de uma posição ideológica, que se contrapunha àquela do MST, de modo a propagar a ideia de que, para cada ação, corresponde uma reação”. Com isso, a transnacional tentava evitar sua responsabilidade, alegando que o ataque não foi realizado pela empresa por ela contratada e, sim, por uma milícia a mando dos fazendeiros.
No entanto, em sua decisão, o juiz reconheceu que "a má eleição do serviço terceirizado de fornecimento de segurança, assim como o financiamento indireto das atividades ilícitas, constituem fato gerador de responsabilidade civil”. Além disso, reprovou com veemência o ataque realizado, ao afirmar que, "por mais reprovável e ilegítima que fosse a invasão à propriedade, não seria apropriado atuar por conta própria, impondo pena de morte aos ocupantes, e sim buscar os meios legais para a solução do conflito, afinal de contas, a lei considera delito o exercício arbitrário das próprias razões”. Portanto, a decisão judicial que condenou a Syngenta não somente afirma o cunho ideológico da ação miliciana, como também vincula a empresa a essa ação.
A decisão judicial, no entanto, não é definitiva. A Syngenta, por meio do seu advogado de defesa, Renne Ariel Dotti, poderá recorreu ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Para o advogado popular da Terra de Direitos Fernando Prioste, espera-se que o Tribunal mencionado mantenha a decisão, para restabelecer a verdade sobre os fatos ocorridos em outubro de 2007. "As provas são contundentes contra a empresa”, apontou. "Uma eventual absolvição da Syngenta significaria a cumplicidade do sistema judiciário com os massacres, como ocorreu neste caso”.
O representante do MST da região de Cascavel, Eduardo Rodrigues, destaca a importância da decisão. Segundo Rodrigues, é comum a impunidade das grandes empresas que violam os direitos, ao mesmo tempo em que é frequente que integrantes do movimento campesino sejam criminalizados por sua luta de oposição ao modelo do agronegócio. "O ataque não sucedeu sem o conhecimento da multinacional”, denunciou o agricultor. "Eles não deram somente o apoio institucional, e sim também o apoio financeiro e a logística”. Rodrigues disse desejar que a decisão seja estendida a outros casos de responsabilidade das empresas pelos ataques que perpetram.
Os obstáculos existentes para conseguir que as empresas respeitem os direitos humanos e sejam responsabilizadas pelas violações que cometem fez com que a Organização das Nações Unidas (ONU) passasse a debater o estabelecimento de um tratado internacional vinculante, que crie mecanismos de prevenção, reparação e responsabilidade ao tema "empresas e direitos humanos”. O grupo de trabalho da ONU, que desenvolve atividades para o estabelecimento deste tratado, visitará o Brasil no mês de dezembro próximo. "Espera-se que os representantes da ONU possam utilizar o caso da condenação da Syngenta como referência para a prestação de contas das grandes empresas que cometem violações aos direitos humanos, por meio de empresas terceirizadas”, pontua a Via Campesina.
Sobre o caso
No dia 21 de outubro de 2007, cerca de 40 pistoleiros da empresa "NF Segurança”, atacaram o acampamento da Via Campesina, localizado no campo de experimento com transgênicos da transnacional Syngenta, em Santa Tereza do Oeste (Estado do Paraná). Naquela manhã, o local havia sido reocupado por aproximadamente 150 integrantes da Via Campesina e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Os ocupantes denunciavam a realização de experimentos ilegais com milho transgênico na zona do Parque Nacional de Iguaçu. Os integrantes da Via Campesina também buscavam denunciar as empresas de biotecnologia, que atuam de forma a impor um modelo de agricultura, que gera danos ambientai, com a utilização indiscriminada de transgênicos e agrotóxicos, invisibilizando a produção de alimentos saudáveis para os camponeses, povos indígenas e povos e comunidades tradicionais.
Uma milícia fortemente armada da empresa "NF Segurança” invadiu o local, disparando em direção às pessoas que ocupavam o espaço. Segundo informações da Via Campesina, a ação havia sido promovida pela Syngenta, que utilizava os serviços da "NF Segurança”, em conjunto com a Sociedade Rural da Região Oeste (SRO), e o Movimento dos Produtores Rurais (MPR), vinculado ao agronegócio. Indícios apontam que a empresa de segurança seria uma fachada e contratava policiais, de forma ilegal, para as operações de ataque. Além de Keno, os atiradores dispararam contra Isabel e feriram outros três agricultores.
Mercado de agroquímicos agrava a violência no campo, com a imposição de um modelo de monocultura e com a superexploração do trabalhador. |
Detentora de 19% do mercado de agroquímicos e terceira empresa com maior lucro na comercialização de sementes no mundo, próximo às estadunidenses Monsanto e Dupont, a Syngenta, juntamente com outras transnacionais, agrava o cenário de violência no campo, com a imposição de um modelo de agricultura baseado no monocultivo, na superexploração do trabalhador, na degradação ambiental, na utilização de agrotóxicos e na apropriação privada de recursos naturais e genéticos.
Na área em que ocorreram os fatos, atualmente funciona o Centro de Pesquisas em Agroecologia Valmir Mota de Oliveira, "Keno”.
Sobre o tema da responsabilidade de empresas por violações de direitos humanos, a Terra de Direitos desenvolveu um guia para auxiliar na avaliação sobre possibilidades de litigar contra empresas, no âmbito internacional.
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