segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Amazônia, jornalismo e a peleja de Lúcio Flávio Pinto


Amazônia, jornalismo e a peleja de Lúcio Flávio Pinto

Num dia qualquer de maio Lúcio Flávio Pinto foi indicado por unanimidade para receber a chancela mais importante relacionada com a defesa dos direitos humanos e a cidadania do país, o Prêmio Wladimir Herzog, versão 2012. Além da qualidade do trabalho, pesou a favor do autor de mais de 15 livros, o número de processos que o mesmo responde, por pautar em seu quinzenário, o Jornal Pessoal (JP), assuntos de interesse público. O artigo é de Rogério Almeida.

Num dia qualquer de maio Lúcio Flávio Pinto foi indicado por unanimidade para receber a chancela mais importante relacionada com a defesa dos direitos humanos e a cidadania do país, o Prêmio Wladimir Herzog, versão 2012. Lúcio, com quase 50 anos de profissão, desta feita foi apontado, ao contrário de outras ocasiões em que enviou produtos. 

Além da qualidade do trabalho, pesou a favor do autor de mais de 15 livros, o número de processos que o mesmo responde, por pautar em seu quinzenário, o Jornal Pessoal (JP), assuntos de interesse público, tais como: desvio de recurso público, grilagem de terras, condutas suspeitas de magistrados e políticos, e por aí vai. 

O jornalista mais importante em assuntos amazônicos foi ladeado pelo octogenário Alberto Dines, o coordenador do Observatório da Imprensa (OI). Dines é o responsável pela melhor fase do JB nos gloriosos anos do jornalismo brazuca. Trata-se de uma fase de incremento editorial e gráfico, que ocorreu nos fins dos anos 1950 e meados de 1960. Odylo Costa Filho levantou a bola, que foi chutada para frente por Dines, no caso do JB. No mesmo cenário, mas, em outros jornais, estavam figuras que colaboraram para a profissionalização da carreira, entre eles Samuel Weiner, Danton Jobim e Pompeu de Souza. 

Em entrevistas recentes Dines rememorou um fato inusitado, a demissão do hoje senador pelo PMDB do Amapá, o maranhense José Sarney. O então correspondente do JB no Maranhão e também deputado da província tinha por hábito emplacar matérias elogiosas a ele mesmo. 

É creditada a Dines a criação do caderno de cultura, bem como o caderno de estudos em comunicação. A iniciativa do caderno de cultura foi replicada de Norte a Sul do país. Ferreira Gullar, Clarice Lispector, Mário Faustino e Eneida de Moraes figuravam entre os colaboradores. Já o segundo buscava refletir de forma crítica sobre o cenário da imprensa nacional. Dines emerge no campo da comunicação como uma espécie baluarte do jornalismo nacional. Uma reserva moral. 

Hoje o experimentado jornalista responde pela coordenação do OI. A produção do programa veiculado nas noites de terça feira na TV Cultura amiúde tentou contar com a participação de Lúcio. No entanto, a rotina jurídica do jornalista o impediu de comparecer fisicamente. Contudo o editor do JP nunca deixou de ser citado, a exemplo de uma edição do OI dedicada a refletir sobre a cobertura jornalística sobre a Amazônia. A motivação da pauta foi a execução do casal de extrativistas no município de Nova Ipixuna, sudeste do estado. 

O programa analisou a precária e má qualidade da cobertura jornalística dos principais veículos de comunicação dos centros econômicos do Brasil sobre a região. Uma contradição foi erguida, como explicar a má publicação do jornalismo sobre a Amazônia, cumprindo a região um papel estratégico em diferentes campos? Assim como o Estado, a imprensa tem “descoberto” a região sempre após as tragédias sacramentadas. 

Alguns elementos foram consensuados na tentativa de explicar o fato. Um deles é a formação do profissional. O assunto é espinhoso e complexo, demanda tempo e disciplina para coletar dados, ler tratados, ouvir especialistas e as partes em geral envolvidas nas contendas diárias. Outra dimensão levantada é o custo para efetivar viagens em processo de apuração dos fatos na região que responde por mais de 60% do território nacional. 

Em solidariedade e respeito ao labor de Lúcio, Alberto Dines ousou fazer uma edição do OI aqui em Belém. Ela foi toda dedicada ao trabalho do paraoara, que mais tarde conseguiu participar de uma edição do OI no Rio de Janeiro. Quando a pauta é a Amazônia ele é referência indicada. Seja como fonte para pesquisadores ou correspondentes internacionais. 

É neste cenário que há 25 anos o JP segue uma caminhada pedregosa. A mim surpreende empreendedorismo do jornalista, que bem poderia comercializar a sua capacidade intelectual para consultorias de políticos. No entanto decidiu esgrimar com assuntos indigestos. No que pese os processos e a produção do JP, foi capaz de publicar ainda no primeiro semestre dois dossiês: um sobre a grilagem de terras e um sobre a Vale. Sem falar em pelo menos dois livros, sendo um autoral sobre a hidrelétrica de Tucuruí e outro em parceria com um professor. 

Uma matéria de Mário Sérgio Conti na excelente Revista Piauí, edição de julho, ilumina a trilha de bons profissionais que optaram pelos cifrões em consultorias de campanhas. Soma que sempre ultrapassa a casa do milhão. Com a capacidade e estrada que Lúcio Flávio é tributário poderia gozar de tal zona de conforto, ao mesmo no que tange ao numerário. 

Qualquer pessoa medianamente informada sabe do relevante papel que o outsider Lúcio exerce em visibilizar atos secretos ou ocultos das representações de poder no estado e na região. 

Assim tem conseguido se indispor com empresários, como no caso do Cecílio Rego de Almeida, que o processou por conta do JP denunciar a maior grilagem de terra já ocorrida no país. E magistrados, políticos e com donos de empresas de comunicação do estado, como o Grupo Maiorana, que controla a repetidora da TV Globo, canal por assinatura, rádios AM e FM e jornais. O grupo rivaliza com a família Barbalho o controle dos principais meios de comunicação no Pará. 

E foi uma contenda com o grupo Maiorana que gerou o mais novo revés jurídico contra Lúcio Flávio Pinto. Na edição de nº 518 do quinzenário JP o jornalista esclarece os meandros do processo que o condenou a indenizar a família em cerca de R$500 mil reais. 

O jornalista nascido em Santarém, no Baixo Amazonas, oeste paraense, sublinha sempre que a ele interessam os fatos e o interesse público, bem como o contraditório. No entanto, além dos processos já sofreu espancamento físico por parte de um dos Maiorana. Fato amplamente divulgado. 

Outro dia encontrei o editor do JP na Gráfica Smith, na caótica Av. Pedro Álvares Cabral a revisar uma edição do jornal. Estava num canto. Quieto. O cumprimentei. Trocamos umas impressões sobre assuntos variados. 
Aos olhos meus pareceu desprovido de soberba, coisa tão comum entre os pares de profissão ou acadêmicos. A ele pedi um texto para a orelha do livro Pororoca pequena: Marolinhas sobre a(s) Amazônia (s) de Cá, de minha autoria que pretendo lançar ainda este mês. Prontamente fui socorrido. E aqui agradeço novamente a gentileza. A obra foi selecionada para publicação em edital do Banco da Amazônia. 

Existem discordâncias sobre o viés de análise do jornalista. Mas, é fato. O nome do mocorongo Lúcio Flávio Pinto já consta nos anais da história sobre Amazônia e o jornalismo. E isso pode ser verificado com os prêmios nacionais e internacionais, os livros, a colaboração em veículos de comunicação da grande mídia e os considerados alternativos. E ainda a experiência como educador no Brasil e exterior. Para não falar em processos. 

(*) Rogério Almeida é autor do livro Pororoca pequena: Marolinhas sobre a(s) Amazônia (s) de Cá. Obra selecionada para publicação no edital de 2012 do Banco da Amazônia.

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